As preocupações que rondam a criação do Imposto Seletivo


As preocupações que rondam a criação do Imposto Seletivo


A reforma tributária, que vem sendo discutida por meio da PEC 45 já aprovada na Câmara dos Deputados e em trâmite perante o Senado Federal, é pautada por ideais de neutralidade e simplificação do sistema tributário nacional.

Na contramão da premissa de neutralidade inicialmente estabelecida pela reforma tributária, a PEC 45 prevê a criação de um novo tributo, que encontrará respaldo no art. 153, VIII, da CF/88: o Imposto Seletivo incidente sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

O objetivo desse Imposto, que competirá à União instituir e regulamentar é, em tese, desestimular o consumo de determinados bens, serviços ou direitos que forem considerados como nocivos à saúde ou ao meio ambiente, corrigindo, assim externalidades que para o Estado são negativas.

Ocorre que, como caberá ao legislador infraconstitucional elencar quais serão os bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente para fins de incidência do Imposto Seletivo e diante da amplitude do texto proposto pela PEC 45, e, ainda, tendo em vista a redação do §3º do art. 155 também proposta pela referida PEC, legitimando a incidência desse Imposto sobre “operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País” os contribuintes estão extremamente receosos e cheios de dúvidas sobre essa nova tributação. A realidade é que a PEC 45, na forma atualmente prevista, possibilita inúmeras interpretações que podem até mesmo desvirtuar a própria natureza desse Imposto.

O que tem se visto é que as críticas à ampla materialidade dada ao Imposto Seletivo pela PEC 45 são respondidas pela equipe responsável pela reforma tributária da seguinte maneira: a lei instituidora delimitará a sua incidência de maneira fiel ao propósito de sua criação.

Em outras palavras, a reforma tributária deixará nas mãos do legislador infraconstitucional a responsabilidade de observar as intenções da equipe econômica atual, ao invés de já restringir o Texto Constitucional, garantindo a criação do Imposto Seletivo ao objetivo a que ele se propõe.

Para além disso, no próprio texto proposto já há uma ambiguidade, na medida em que a intenção do Imposto Seletivo, divulgada pelo Governo, é aumentar a carga tributária dos produtos nocivos, mas por outro lado, a PEC 45 autoriza sua incidência sobre energia, telecomunicação, etc.

Não se pode perder de vista que uma vez que a competência for inserida na Constituição de maneira ampla, ainda que a lei que inicialmente institua do Imposto Seletivo observe estritamente o seu real intuito de desestimular o uso de produtos e serviços nocivos, não é possível prever quais serão suas alterações ao longo do tempo (e pior, com respaldo constitucional!).

É importante ressaltar, ainda, as seguintes atecnias constantes na PEC 45:

  • (i) apesar de ter sido denominado como “Imposto Seletivo”, a regra da seletividade, que nada mais é que um critério comparativo entre produtos para atribuir carga tributária mais elevada àqueles bens considerados menos essenciais (como atualmente ocorre com o IPI), não se encontra necessariamente presente neste novo tributo. Hipoteticamente, um produto listado pelo legislador como nocivo ao meio ambiente e, portanto, tributado pelo Imposto Seletivo, pode ser tido por alguns como essencial à produção agrícola de larga escala;
  • (ii) o Imposto Seletivo incidirá sobre serviço, no entanto, não há a palavra “prestação” no texto proposto para art. 153, VIII, da CF/88. Como serviço não é produzido, nem comercializado, sua incidência recairia apenas sobre a importação de “serviços considerados nocivos”? Parece-nos que haverá uma difícil aplicação, se for mantido o objetivo de tornar mais oneroso o que for nocivo.
  • (iii) o Imposto Seletivo estaria entre os impostos não sujeitos à regra da anterioridade anual (cobrança de tributo no mesmo exercício de publicação da lei que o instituiu ou majorou). De fato, esse regime pode ser aplicado às situações nas quais o imposto é utilizado com uma finalidade extrafiscal, ou seja, para o incentivo ou desestímulo de determinada conduta. Mas, infelizmente, essa máxima, como vimos, não está clara na norma aberta trazida pela PEC 45, e que permite, inclusive, a tributação de energia elétrica pelo Imposto Seletivo.

O Imposto Seletivo entra em vigor na data de publicação da PEC, mas ainda precisará ser regulamentado por meio de lei para que sua cobrança seja legitimada, e conviverá com o IPI até 2033, quando a cobrança deste será extinta. Durante o período de transição, o IPI não poderá incidir sobre os produtos sujeitos ao Imposto Seletivo.

O que se pode afirmar, é que o nascimento do Imposto Seletivo já vem gravado por inúmeras incertezas que, ao contrário do que a equipe responsável pela reforma tributária prevê, provavelmente não serão sanadas após a edição de sua lei instituidora.