Se você investe em ações e não quer ser indevidamente tributado pelo IRPF, leia este artigo!


Se você investe em ações e não quer ser indevidamente tributado pelo IRPF, leia este artigo!


Por Izabelle Lauar Schirmer, Pâmella Souto Pires e Paula Novaes Silva 

Não é novidade que a compra e venda de ações tem se tornado cada vez mais comum e uma opção de investimento financeiro para pessoas físicas. Essas ações são valores mobiliários emitidos por sociedades anônimas de capital aberto e negociadas na bolsa de valores. Trata-se de títulos de propriedade, conferindo aos seus detentores (investidores) a participação na sociedade de uma empresa1.  

É natural que as sociedades realizem negócios com outras sociedades, por meio, inclusive, da incorporação das ações de uma pela outra. Nessas situações, os acionistas minoritários, que não possuem poder de voto e sequer participam da tomada de decisões, podem ser diretamente impactados pelos efeitos fiscais da operação.  

E é exatamente com relação a essa operação que o presente artigo será importante para você! 

Se você possui ações de uma empresa que foi recentemente incorporada por outra sociedade, é necessário que promova a alteração em sua declaração de ajuste anual, substituindo as ações da empresa incorporada pelas ações da empresa incorporadora. Até aqui, não há nenhuma novidade! 

Considerando que esse ajuste na declaração configura mera substituição dos títulos entre as ações “velhas” e as ações “novas”, não haveria que se falar em tributação pelo Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), já que essa operação não representa ganho de capital.  

Contudo, na realidade, principalmente considerando o complexo sistema tributário do Brasil, “nem tudo são flores”. A Receita Federal tem exigido o recolhimento do IRPF de quem se encontra na situação acima, sob o fundamento de que a incorporação de ações implicaria em suposta alienação de bens e direitos, sujeita ao pagamento do imposto sobre ganho de capital, com base nos artigos 3°, § 3°, da Lei n° 7.713/88 e o artigo 23 da Lei n° 9.249/952.  

Você, acionista, poderá ser tributado pelo IRPF, se a Receita Federal verificar que houve suposto lucro na operação, ou seja, se as ações recebidas possuírem valor de mercado superior ao das ações substituídas.  

Mas qual o momento para a tributação pelo IRPF? Qual a problemática da operação? 

Primeiramente, é necessário observar que o mercado de ações possui uma alta volatilidade, de modo que uma eventual valorização de uma ação poderá ser temporária e completamente reversível. Isso significa que, no momento de eventual alienação (venda) de ações, o acionista poderá não ter, em moeda, um valor superior àquele que foi pago no momento da aquisição. Ou seja, o ganho de capital (popularmente entendido como sendo um lucro) pode, na realidade, não se concretizar na prática, podendo o acionista, inclusive, obter prejuízo. 

Para ilustrar, imaginemos o seguinte cenário: um acionista de uma empresa incorporada, logo após a operação de incorporação de ações, opta por permanecer com seus títulos e, por essa razão, realiza o recolhimento do IRPF incidente sobre suposto ganho de capital (lucro) no momento de sua declaração de ajuste anual. Contudo, após algum tempo, decide vender tais ações e se depara com uma surpreendente desvalorização, trazendo-lhe prejuízo, já que vendeu as ações por um valor inferior ao que tinha desembolsado ao adquiri-las. Nesse caso, ele terá pago o Imposto de Renda sobre um lucro que nunca existiu. Um absurdo, não é mesmo?  

Parece óbvio que a incidência do IRPF não poderia existir enquanto não houvesse a sua efetiva liquidação e a realização desse lucro (tecnicamente, ganho de capital). De forma mais clara: enquanto não houver ganho efetivo (no sentido de acréscimo patrimonial), nada de tributar! 

Ocorre que, muitas vezes, o óbvio ainda precisa ser dito, motivo pelo qual os contribuintes têm recorrido ao Poder Judiciário para reverter as autuações da Receita Federal e afastar a exigência do Imposto de Renda sobre a mera operação de incorporação de ações, diante da inexistência de alienação. 

A boa notícia é que há uma onda de decisões favoráveis no Poder Judiciário e no CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), resguardando o direito do acionista não ser tributado nessa situação.  

O racional adotado nessas decisões é muito assertivo, pois reconhece que o ganho de capital só é auferido no momento da liquidação das ações, sendo que qualquer etapa anterior a esse momento configura mera ficção ou expectativa de valorização das ações. 

E não poderia ser diferente, uma vez que a tributação do imposto sobre a renda para as pessoas físicas só se torna factível quando o acionista efetivamente recebe os valores, em quantia superior à de aquisição, pela venda das ações, o que não ocorre com a mera declaração, no ajuste anual, da “substituição” desses títulos diante da incorporação. 

Ora, a incorporação de ações é um negócio jurídico típico, que não pode, de forma alguma, se confundir com o ganho de capital. 

Diante desse entendimento, não se admite que a fiscalização alargue a hipótese de incidência do IRPF, visando, unicamente, aumentar sua arrecadação, pois, ainda que a tributação seja o principal e necessário meio para garantir a subsistência dos cofres públicos, não se tolera que tal fato ocorra sob o preço de ilegalidades tributárias.    

Afinal, o que se busca num Estado de Direito não é salvaguardar apenas o erário, mas, também, o direito dos contribuintes, para que não sejam submetidos ao pagamento de tributos que não se amoldam à hipótese de incidência prevista constitucionalmente.  

Referências:

1 Disponível em <https://www.b3.com.br/pt_br/produtos-e-servicos/negociacao/renda-variavel/acoes.htm

2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9249.htm