Receita Federal altera entendimento acerca da tributação nas transferências de cotas de FIs de Renda Fixa Fechados ou de FIAs em função de sucessão por herança, legado ou doação em antecipação da legítima


Receita Federal altera entendimento acerca da tributação nas transferências de cotas de FIs de Renda Fixa Fechados ou de FIAs em função de sucessão por herança, legado ou doação em antecipação da legítima


Foi publicada no dia 18 de março a Solução de Consulta - SC COSIT nº 21/2024, por meio da qual a Receita Federal do Brasil (RFB) esclareceu que, em casos de transferência resultante de sucessão por herança, legado ou doação antecipada da legítima de cotas de Fundos de Investimento em Renda Fixa – FIs Renda Fixa, fechados, ou de Fundos de Investimentos em Ações - FIAs, fechados ou abertos, pertencentes a residentes ou domiciliados no país, será necessário calcular o ganho de capital seguindo as regras aplicáveis à alienação de bens ou direitos de qualquer natureza.

O tema reexaminado pela COSIT já havia sido abordado em pelos menos três situações anteriores, com diferentes deslindes.

No primeiro deles, a SC COSIT nº 383/2014 externou entendimento de que a transferência de cotas de FIs Renda Fixa em razão da abertura do formal de partilha implicam resgate ou liquidação da aplicação financeira para fins da transferência de titularidades sujeitos à regra geral de tributação nestes eventos, e que deveria ser utilizado, para este fim, seu valor escritural, acrescido dos correspondentes ganhos auferidos. De forma indireta, acabou por rejeitar a aplicação do art. 23 da Leiº 9.532/1997. Embora a consulente tenha feito referência a FI de Renda Fixa sujeito a come-cotas, tributação semestral aplicável aos um FIs Abertos, a PFNG e COSIT entenderam que a SC não delimitou tratar de FI abertos ou fechados.

Em um segundo momento, a SC COSIT nº 98/2021 tratou da tributação pelo imposto de renda em um evento de doação em adiantamento de legítima de cotas de FIA Fechado. Externou entendimento a favor da aplicabilidade do artigo 23 da Lei nº 9.532/1997 nesses casos, de forma que seria possível adotar, a critério do contribuinte, o valor do custo de aquisição constante da Declaração de Imposto de Renda como valor de alienação/transferência das cotas do FIA Fechado. Esse precedente solucionou a celeuma da alíquota de 15% e do recolhimento pelo doador, ao se alinhar ao referido art. 23.

Em seguida, a SC COSIT nº 245/2023 externou o entendimento de que, na transferência de cotas de FIs de Renda Fixa Fechado por força de sucessão causa mortis, não caberia a aplicação do art. 23 da Lei nº 9.532/1997.

Para suportar o entendimento externado na recente SC COSIT º 21/2024, a RFB sustentou os seguintes argumentos:

Há disposição legal e normativa relativa à tributação das aplicações em títulos ou valores mobiliários de renda fixa ou variável, no sentido de que para fins de incidência do IRRF, a expressão “alienação” compreende qualquer forma de transmissão da propriedade, bem como a liquidação, resgate, cessão ou repactuação do título ou aplicação; abrangendo, portanto, as transmissões de propriedade em função de sucessão hereditária;

Por força do disposto no art. 16, inciso II da Instrução Normativa – IN nº 1.585/2015, os ganhos na alienação de cotas de FI Fechados são tributados de acordo com as regras aplicáveis aos ganhos de capital na alienação de bens ou direitos de qualquer natureza, quando auferidos por pessoa física residente em operações realizadas fora de bolsa. Ademais, em decorrência do § 15 do art. 18 da referida IN, conclui que regras aplicáveis aos ganhos de capitais se aplicam, inclusive aos FIAs Abertos quando alienados fora de bolsa por pessoa física residente;

Mesmo em se tratando de tributação de acordo com as regras aplicáveis aos ganhos de capital, considera cabível a retenção e recolhimento do imposto pelos administradores do FII ou outros, na forma do art. 17 da IN nº 1.585/2015;

Uma vez que admitiu tratar de cabimento das regras de tributação aplicáveis aos ganhos de capital, concluir também pela aplicação indistinta das alíquotas progressivas de 15% a 22,5%;

Por fim, quanto ao cerne da principal questão, mesmo admitindo tratar-se tributação de acordo com as regras aplicáveis aos ganhos de capital, afastou a aplicação do artigo 23 da Lei nº 9.532/97, que possibilita que, na transferência de direito de propriedade por sucessão, os bens e direitos sejam avaliados pelo valor de mercado ou pelo valor constante da declaração de bens do de cujus, hipótese em que não haveria apuração de ganho de capital. 

Para tanto, baseou-se, exclusivamente, na alegação de que a interpretação do racional do referido art. 23 estaria adstrita a situações em que os herdeiros ou donatários não disponham de bens adicionais para suportar o recolhimento do imposto, situação que não se aplicaria aos herdeiros ou donatário de cotas de fundos fechados de investimentos em renda fixa ou ações por serem tais cotas lastreadas em ativos de liquidez. Vale ressaltar que tal alegação se fez a partir da interpretação da intenção do legislador externada na exposição de motivos da Medida Provisória que veio a ser convertida na Lei nº 9.532/97, em que pese tal critério não tenha constado do dispositivo legal e nem dos normativos pertinentes.

Portanto, a legitmidade do entendimento exposto na Solução de Consulta nesse aspecto é passível de questionamento, já que o art. 23 da Lei nº 9.532/97 não estabelece a ressalva apontada pela COSIT, ao passo que a mera interpretação baseada em exposição de motivos de MP não pode prevalecer quando em manifesto conflito com a lei efetivamente promulgada.

Neste contexto, a PGFN e a COSIT concluíram que o entendimento da SC COSIT nº 383/2014 contrapunha-se àquele consolidado na SC COSIT nº 98/2021, que sustentava a aplicabilidade do artigo 23 e responsabilidade de retenção e recolhimento do doador, em linha com as regras de ganho de capital, bem como entenderam que ambas SC não se alinharam ao entendimento adotado na recente SC COSIT nº 21/2024.

Dessa forma, conclui pela necessidade de revisão da SC COSIT nº 98/2021 e a revisão parcial da SC COSIT nº 383/2014, tornando suas conclusões sem efeito no que diz respeito à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) nos casos de transferência decorrente de sucessão por herança ou legado de cotas de fundos fechados de investimento em renda fixa ou de fundos fechados de investimento em ações titularizadas por residente ou domiciliado no país e à consequente responsabilidade tributária.

A equipe Tributária do Azevedo Sette Advogados está à disposição para esclarecimentos adicionais sobre o tema.