Nova obrigação tributária: a Declaração País a País na ECF


Nova obrigação tributária: a Declaração País a País na ECF


*Por Leandra Guimarães e Luiza Vidal

A partir de 2017 e em relação ao ano de 2016, as pessoas jurídicas com domicílio fiscal no Brasil e integrantes de grupos multinacionais devem atentar-se à uma nova obrigação na seara tributária. Trata-se da Declaração País a País – DPP, instituída pela Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil – RFB nº 1.681/2016, a ser transmitida por meio da Escrituração Contábil Fiscal – ECF.

A instituição da DPP decorre diretamente da adesão pelo Brasil à algumas iniciativas internacionais derivadas do Projeto BEPS, capitaneado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE e pelo G20 (grupo das 20 maiores econômicas mundiais).

O Projeto BEPS surgiu quando, após a publicação pela OCDE do relatório “Adressing Base Erosion and Profit Shifting – BEPS” (Comentários sobre a Erosão das Bases Tributáveis e Transferência de Lucros, tradução livre), os países membros da instituição e do G20 uniram-se para a criação de um Plano de 15 Ações para enfrentamento dos temas relacionados à erosão das bases tributáveis e transferência de lucros de uma jurisdição para outras com tratamentos tributários menos onerosos.

Dentre as 15 Ações, destaca-se a Ação 13, com o seguinte enunciado: “Reexaminar as regras sobre documentos relativos a preços de transferência”. O pacote de medidas apresentado no seu relatório final abordou: (i) a adoção de padrões revisados para documentação de informações relacionadas a Preços de Transferência, e (ii) a criação do “Country by Country Report – CbC Report” (Declaração País a País – DPP), a ser implementado nas jurisdições locais, e que serviria como base para a troca automática, entre países signatários de acordos que abordassem essa possiblidade, de informações tributárias relacionadas à alocação global de rendimentos e tributos devidos e pagos, dentre outras informações de atividades econômicas de grupos multinacionais.

Em janeiro/2016, 31 países ratificaram o Acordo Multilateral entre Autoridades sobre o Intercâmbio de Relatórios País a País (“AMA”). O AMA tratou: (i) da implementação da DPP nas jurisdições locais, (ii) da natureza de suas informações, (ii) do prazo para sua transmissão e, (iv) da troca automática de informações tributárias nela contidas, dentre outros. Também estabeleceu expressamente como condição prévia ao início das trocas automáticas de DPP que o país signatário ratificasse também a Convenção sobre a Assistência Mútua Administrativa em Matéria Tributária (“Convenção”) e que esta estivesse em vigor e produzindo plenos efeitos.

Uma vez implementadas as obrigações contidas no AMA, a troca automática das DPP teria início entre países signatários, proporcionado assim, o significativo aumento da transparência tributária em termos internacionais, visando mitigar e/ou minimizar os efeitos diagnosticados do BEPS.

No âmbito nacional, em junho/2016, o Brasil ratificou a Convenção, dando início aos procedimentos necessários para implementação da DPP e da troca automática de suas informações.

Considerando que a Convenção entra vigor no 1º dia do 4º mês subsequente à sua ratificação esta passou a viger no Brasil em outubro/2016. Contudo, as disposições sobre assistência administrativa, que incluem a troca automática de informações em matéria tributária, somente produzem efeitos abrangendo exercícios fiscais com início em 1º de janeiro do ano seguinte àquele em que a Convenção entrou em vigor. De modo que as disposições concernentes à assistência administrativa produzirão efeitos no Brasil abrangendo exercícios fiscais a partir de 2017. Enfim, em 21/10/2016, após a ratificação da Convenção, o Brasil tornou-se Parte também do AMA.

Analisando-se de forma conjunta as disposições de ambos acordos internacionais, conclui-se que, em relação ao Brasil, a troca automática das DPP prevista no AMA se iniciará em 2017. Isso porque, a Convenção somente produzirá plenos efeitos no país a partir de 2017. Assim, a despeito de a DPP ser obrigatória para entidades residentes fiscais no Brasil em relação ao ano-calendário de 2016, conforme se tratará a seguir, seu preenchimento e transmissão em relação a esse ano limita-se ao conhecimento da RFB e outras autoridades competentes nacionais.

A ratificação do AMA pelo Brasil implicou na necessidade de implementação da DPP na legislação pátria. Nesse diapasão, foi publicada em 29/12/2016 a Instrução Normativa da RFB nº 1.681 (IN RFB nº 1.681/2016), que dispõe sobre a obrigatoriedade de prestação das informações da DPP.

A DPP, segundo a RFB¹, consiste em um relatório anual por meio do qual grupos multinacionais deverão fornecer informações relacionadas à localização de suas atividades, alocação global de renda e impostos pagos e devidos.

Em regra, segundo estabelece a IN RFB nº 1.681/2016, está obrigada à entrega da DPP toda entidade residente para fins tributários no Brasil, integrante de grupo multinacional, que seja a controladora final desse grupo ou que tenha sido designada por este como entidade substituta.

Excepcionalmente, uma entidade residente no Brasil, ainda que não seja a controladora final de grupo multinacional nem entidade designada substituta, estará obrigada a transmitir a DPP: (i) caso a controladora final do grupo não esteja obrigada por sua jurisdição; (ii) caso a jurisdição do país em que esta resida tenha acordo internacional com o Brasil, porém não o AMA ou, (iii) caso ocorra a falha sistêmica na troca automática de informações da DPP.

Estão dispensadas da entrega da DPP as entidades integrantes de grupos multinacionais residentes no Brasil cuja receita consolidada total do grupo no ano fiscal anterior ao de declaração seja menor que: R$ 2.260.000.000,0, se o controlador final for residente no Brasil ou, caso contrário, EUR 750.000.000,00.

Enfim, a DPP será transmitida anualmente, a começar pelo ano calendário de 2016, mediante preenchimento do Bloco W, criado especificamente para esse fim, na ECF. O prazo para sua transmissão será também o mesmo da ECF, portanto, 31/07/2017.

Conforme o caso, as informações requeridas pela DPP podem envolver certo grau de detalhamento e até complexidade, veja-se:

Se a entidade residente no Brasil integrante de grupo multinacional não for a controladora final nem designada como substituta do grupo, deverá informar o nome do grupo multinacional, o nome da controladora final, o país de sua jurisdição, o seu tax identification number e qual foi a entidade responsável por transmitir a DPP. Por outro lado, se a entidade residente no Brasil for a controladora final ou designada como substituta, informações detalhadas e numerosas deverão ser prestadas, tais como receitas recebidas de partes relacionadas e não relacionadas, lucro auferidos, lucros acumulados e impostos pagos. Tais informações deverão ser prestadas na moeda do controlador final do grupo e obedecendo-se seu período fiscal, que pode ser diferente do período fiscal brasileiro.

Neste novo contexto, vale ressaltar que o preenchimento do Bloco W da ECF demandará adicional atenção e novos controles a serem desenvolvidos pelo contribuinte, posto que, as informações a serem prestadas divergem do padrão de moeda e periodicidade, das demais informações da ECF.

*¹ Conforme consta do documento “Perguntas e Respostas da Declaração País a País”, publicado pela RFB em 15 de maio de 2017.

*Autoras são respectivamente, sócia e advogada associada da área Tributária da unidade Azevedo Sette Advogados Belo Horizonte.