Reforma Tributária I Saldos Credores de ICMS, PIS, COFINS e IPI – Aproveitamento ou Perda?


Reforma Tributária I Saldos Credores de ICMS, PIS, COFINS e IPI – Aproveitamento ou Perda?


A Reforma tributária aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 07/07/2023 (Proposta de Emenda Constitucional – PEC nº 45-A/2019), propõe a simplificação e modernização do sistema tributário brasileiro. Sua principal inovação em relação a atual legislação é a criação de um Imposto sobre valor agregado (IVA) de forma dual: a Contribuição sobre bens e serviços (CBS) – da União, e o Imposto sobre bens e serviços (IBS) – dos Estados e Municípios, que substituirá 5 (cinco) tributos: Programa de Integração Social (PIS) a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto Sobre Serviços (ISS).

A PEC propõe também a criação de um outro imposto, o Imposto Seletivo (IS), voltado à desestimular o consumo de bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

O PIS e a COFINS serão extintos em 2027, já o IPI, o ICMS e o ISS serão extintos em 2033, quando o novo sistema será totalmente implementado, após um período de transição que se iniciará em 2026.

Com a perspectiva de aprovação do novo sistema no parlamento, um ponto que está colocando grande parte das empresas em alerta é o tratamento que será dispensado aos saldos credores do PIS, COFINS, IPI e do ICMS a partir do momento da extinção destes tributos.

São diversas as situações que levam as empresas a gerarem saldos credores destes tributos que serão extintos, tais como a preponderância de exportações, diferimentos, isenções, reduções de alíquotas, operações interestaduais, dentre outras, conforme previsões específicas da legislação de cada tributo em questão.

Tem sido noticiado por várias fontes, a imensa relevância dos estoques de saldos credores destes tributos que serão extintos, a partir de dados setoriais – como no caso das empresas do segmento do agronegócio e das exportadoras – ou a partir das informações financeiras das empresas listadas nas bolsas ou mesmo daquelas que compõem o Ibovespa, sem considerar o saldo do estoque das empresas que não divulgam informações financeiras.

Em função do grande volume de saldos credores, os contribuintes temem que o período de transição não seja o suficiente para o total aproveitamento dos mesmos.

A proposta aprovada pela Câmara apresenta disposições para o aproveitamento dos saldos credores de ICMS existentes em 31 de dezembro de 2032, bem como dos créditos de ICMS que venham a ser reconhecidos após esta data.

Em suma, os saldos credores de ICMS existentes ao final de 2032 poderão ser aproveitados pelos contribuintes, observadas as seguintes condições:

(i) Que sejam relativos a créditos cujo aproveitamento ou ressarcimento seja admitido na legislação em vigor;

(ii) Tenham sido homologados pelos respectivos entes federativos.

O pedido de homologação deverá ser analisado pelo ente no prazo estabelecido na lei complementar, sendo que, na ausência de resposta no referido prazo, os respectivos saldos credores serão considerados tacitamente homologados.

Uma vez informados ao Conselho Federativo do IBS pelos estados e Distrito Federal, os saldos credores, previamente homologados, serão passíveis de realização como segue:

· Via compensação com o IBS devido mensalmente:

(a) Pelo prazo remanescente, no caso de créditos de ativo permanente; e

(b) Em 240 parcelas mensais, iguais e sucessivas, nos demais casos, nos termos da lei complementar.

· Via ressarcimento pelo Conselho Federativo do IBS:

No caso em que não seja possível compensar o valor da parcela compensável com débito mensal do IBS, nos termos a serem definidos em lei complementar.

· Via transferência a terceiros:

Nos termos a serem definidos em lei complementar.

A partir de 2033, os saldos credores de ICMS serão atualizados pelo IPCA-E ou por outro índice que venha a substituí-lo.

Um ponto relevante é o prazo de 240 meses (20 anos) previsto para a compensação dos saldos acumulados com o IBS,. Grandes empresas e associações setoriais já estão se manifestando quanto ao potencial impacto negativo do prazo de 240 meses para o aproveitamento do saldo credor de ICMS. Esse impacto negativo pode decorrer de diferentes situações: (i) postergação do momento da monetização dos saldos credores apenas para após decorridos os 240 meses, quando comparado as situações, ainda que restritas, nas quais atualmente o contribuinte possa realizar financeiramente estes saldos credores; (ii) diluição em 240 meses do aproveitamento de saldos credores para contribuintes que tenham capacidade de aproveitamento mensal superior a 1/240 avos.

O fato é que o ideal seria que o prazo de 20 anos fosse reduzido para não depreciar severamente o caixa das empresas.

Ademais, não se pode descartar outros riscos patrimoniais e ou financeiros em decorrência desse prazo tão alongado, tais como, o potencial impacto patrimonial em função da eventual necessidade de reconhecimento de ajuste a valor presente de tais saldo credores, e a exposição do direito de crédito à fatalidade de eventual expurgo inflacionário.

Por fim, ainda em relação aos critérios para o aproveitamento dos saldos credores de ICMS, vale destacar alguns aspectos que, ao serem deixados à cargo de lei complementar tem gerado insegurança: (i) a determinação do prazo regulamentar para homologação dos saldos credores pelos estados e Distrito Federal; (ii) a forma para a transferência dos saldos credores a terceiro; e (iii) o ressarcimento; fazendo surgir para os contribuintes o receio de que a lei complementar venha a criar burocracias ou restrições para a viabilização da realização dos saldos credores.

Ademais, existe preocupação adicional em relação aos saldos credores de PIS, COFINS e IPI, por não haver previsão na PEC nº 45-A/2019 a respeito do aproveitamento dos saldos credores desses tributos.

A esse respeito, há uma celeuma acerca da necessidade de existência de previsão legal específica que permita o aproveitamento desses créditos após a extinção do PIS, COFINS e IPI.

Há quem defenda que as regras atualmente em vigor não seriam prejudicadas em função da extinção dos referidos tributos, e, portando, continuariam a regular a forma de aproveitamento desses saldos credores. Por outro lado, há opiniões no sentido de que tais regras aproveitam apenas as situações pertinentes aos saldos credores que atualmente são passíveis de compensação com outros tributos federais ou ressarcimento, não viabilizando o aproveitamento da parte do saldo credor cuja utilização seja possível apenas na apuração corrente do PIS, COFINS e IPI. Desta forma, ainda que apenas em relação a esse último caso, será necessária a inclusão de tal previsão legal, sob pena de implicar em perdas irreparáveis para os contribuintes. Caso não haja posterior determinação de regras por parte do Senado, de Lei Complementar ou da Receita Federal, poderá haver aí um potencial de contencioso judicial, que a reforma tributária em curso ainda pode oportunamente evitar.

Por fim, fica em pauta a atenção do acompanhamento pelos contribuintes dos desdobramentos das atuais previsões ou omissões no projeto da reforma tributária sobre a efetiva realização do vultuoso saldo credor dos tributos a serem extintos.