Efetividade e aplicabilidade da Mediação Empresarial no conflito entre sócios


Efetividade e aplicabilidade da Mediação Empresarial no conflito entre sócios


Coautoria da estagiária Stela Marques dos Santos*

É sabido que as pessoas quando se unem em sociedade o fazem por afinidade ou interesse em comum. No entanto, mesmo em negócios em que os sócios são familiares ou amigos, os conflitos muitas vezes são inevitáveis...

Discordâncias corriqueiras ou não muito relevantes podem ser resolvidas sem maiores interferências entre os próprios sócios, mas existem situações em que os interesses se chocam de sobremaneira que se faz necessária e aconselhável a intervenção de um terceiro, imparcial, para mediar a melhor solução daquele conflito e, assim, atender aos interesses dos sócios e da empresa.

É nesse momento que a Mediação Extrajudicial se torna um instrumento para a solução do conflito entre as partes, ajudando a surgir, do diálogo e do equilíbrio entre as ponderações e versões expostas por cada um dos envolvidos, uma decisão final mais vantajosa para o interesse comum. Nesse sentido, a mediação oportuniza e contribui para a construção de novas visões sobre o mesmo problema, possibilitando um acordo que atenda às necessidades de todos os envolvidos. A palavra mediação deriva do latim mediatione, que significa “estar no meio”, “dividir em partes iguais”, distar. 

Do ponto de vista legal, como dispõe a Lei de Mediação (Lei nº 13.140/2015), “considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial, sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia”. O fato do legislador se preocupar em regulamentar esta atividade somente corrobora que ela é absolutamente efetiva e aplicável à maioria dos conflitos societários.

É importante, mais uma vez, destacar que esse método de solução de conflitos confere às partes autonomia em suas decisões e convida os sócios discordantes a refletir sobre o problema, criando um ambiente emocional que propicie o diálogo. Permite que os envolvidos conversem sobre os impasses, satisfazendo as demandas inexplícitas dos sócios, resultado nem sempre possível pela via judicial. 

As empresas com estruturas majoritariamente familiares, que compõem quase cerca de 90% das empresas no Brasil1, não podem ser tratadas apenas sob o ponto de vista da administração, mas como já recepcionado pela doutrina e jurisprudência brasileira, envolvem também as questões afetivas e emocionais decorrentes da própria estrutura familiar, com questões subjetivas que extrapolam as relações negociais. 

O mediador busca, diante desse cenário, resgatar os interesses convergentes entre as partes que muitas vezes se encontram ocultos, como por exemplo decisões acerca do crescimento da empresa, desenvolvimento da atividade empresarial ou rentabilidade. Nessa análise não se pretende minimizar a importância da atuação jurisdicional. De modo outro, busca-se reduzir a irrigada cultura do litígio que afoga o Poder Judiciário em demandas que não colocam os sócios como protagonistas da solução de conflitos em suas próprias empresas.

Verifica-se que a mediação é apenas uma das novas ferramentas jurídicas em que se prioriza a participação dos envolvidos na tomada de decisão com a aplicação de técnicas de abordagem e de comunicação. Assim, pode ser entendida como uma forma complementar que contribui com a função jurisdicional estatal na medida em que possibilita que o Judiciário concentre seus esforços em casos que exigem sua atuação. A mediação, então, contribui para a redução das demandas que chegam aos tribunais

Em relação à efetividade da mediação nos conflitos entre sócios é importante destacar que essa ferramenta possibilita que os indivíduos assumam a responsabilidade por suas escolhas, de forma que possam construir uma nova visão dos conflitos já existentes, além de mudar suas perspectivas futuras. São esses alguns dos benefícios dessa abordagem que se mostra mais consciente e reflexiva, priorizando a comunicação e a consecução de um consenso genuíno. Muitas outras são também as vantagens desse método, como, por exemplo, suspender demandas arbitrais e processos judiciais que já estejam em andamento e, até mesmo, a suspensão de prazos prescricionais, tudo isso num ambiente extremamente imparcial, caracterizado na figura do mediador, e de alta confidencialidade.

O ambiente societário contribui para o surgimento de conflitos. Essa contenda, em muitos casos, tem origem na instabilidade do vínculo societário, quebra da lealdade ou falha nos deveres de diligência por um dos sócios. Nessa perspectiva, a discordância se constrói como uma oportunidade de transformação com mudança de mentalidade, evitando transferir o poder de decisão sobre a empresa para terceiros, o que, estrategicamente, deve ser evitado. A empresa, que anteriormente sofreria os maiores prejuízos com o conflito, afetando sua imagem e os seus lucros, com a mediação passa a ser o centro dos interesses dos sócios.

Os (as) advogados (as) possuem, ainda, um importante papel para o sucesso dos métodos extrajudiciais de solução de conflitos. Na mediação, ainda que a Lei de Mediação não exija a presença de um advogado, esse profissional pode assessorar o cliente antes do conflito na elaboração do contrato social, por exemplo, e após o conflito sugerindo a adoção do método de solução de acordo com o caso concreto. No momento em que o cliente busca o escritório, com uma opinião formada sobre a divergência entre sócios e propondo uma medida judicial, cabe ao advogado buscar as verdadeiras motivações que sustentam o conflito indicando a abordagem que deverá ser utilizada2. A mediação deve ser aplicada, principalmente, para casos em que exista um vínculo anterior entre as partes ou conflitos de múltiplas partes em que se objetiva proteger a relação comercial existente. As características mencionadas estão presentes, majoritariamente, em dissensos entre sócios, dissolução de sociedade, operações de M&A, acordos de cooperação, entre vários outros.

Em resumo, vivemos um momento de ruptura com as formas convencionais de solução dos conflitos buscando superar a cultura do litígio marcada pela dependência do poder estatal. A mediação se mostra uma alternativa viável para solucionar os problemas, preservando a boa relação entre sócios, que vai se refletir na lucratividade da empresa, na relação com os colaboradores e fornecedores e, também, no consumidor do produto ou serviço daquela sociedade. E mais ainda por ser um método capaz de mudar os paradigmas das empresas por meio do protagonismo dos sócios, superando a lógica engendrada na estrutura do Judiciário de que existem, no conflito, ganhadores e perdedores.

A Mediação Extrajudicial demonstra, portanto, ser totalmente aplicável e efetiva em conflitos societários, abrangendo todas as suas peculiaridades e vantagens, conseguindo, por vezes, preservar a afinidade das relações familiares e de amizades, tão importantes quanto a preservação da empresa!

1 As empresas familiares representam 90% das empresas brasileiras. O estudo ainda demonstra que cerca de 70% das empresas encerram suas atividades após a morte do sócio fundador diante da mudança de liderança, falta de gestão adequada e de planejamento jurídico. SOUZA, César. Sucessão: o maior desafio das empresas familiares. Disponível em: https://www.istoedinheiro.com.br/sucessao-o-maior-desafio-das-empresas-familiares/

2 FUOCO, Patrícia Freitas. O papel estratégico do advogado na mediação no contexto empresarial. Revista de Arbitragem e Mediação, v. 47, p. 277-296, out./dez. 2015.