Por Camila Cerceau Vianna de Assis e Ana Paula Braga Franco
A proteção buscada pela Indústria da Moda é diretamente relacionada ao fator econômico, sob a ótica da tutela dos direitos e interesses do criador da obra. Logo, as criações são objeto de proteção pelas normas referentes ao direito autoral e à propriedade intelectual e industrial.
O artigo 2º da Lei de Propriedade Industrial – Lei 9.279/96 prescreve que a proteção da propriedade intelectual corresponde à defesa do comércio, do serviço e da indústria, e visa a resguardar os direitos de patentes de invenção de modelos de utilidade, de desenhos ou modelos industriais, das marcas de fábrica ou de comércio, das marcas de serviço, do nome comercial e das indicações de proveniência ou de denominações de origem, bem como a repressão à concorrência desleal e às falsas indicações geográficas.
Entende-se que a propriedade intelectual se caracteriza, então, como a junção de direitos de propriedade industrial e direitos autorais, estendendo-se, portanto, ao campo industrial, científico, literário e artístico.
A legislação pátria, no que tange ao direito autoral, visa a proteger três núcleos de interesse, quais sejam: o criador, a sociedade e os investidores intermediários. O criador tem a proteção patrimonial e moral de sua obra; a sociedade tem resguardados os direitos à educação, pesquisa, comunicação, cultura, dentre outros; e os intermediários atuam de forma a interligar e unir os interesses acima citados.
Ainda no que diz respeito aos direitos autorais, a doutrina reconhece que tais direitos possuem caráter híbrido, pois tutelam tanto direitos de personalidade (os direitos morais) quanto os direitos patrimoniais (direitos reais), ou seja, a possibilidade de aproveitamento econômico de sua criação.
Na história da moda, há de se considerar algumas patentes que foram extremamente relevantes para o desenvolvimento da sociedade, tanto em relação ao acesso a bens aperfeiçoados, quanto ao desenvolvimento de bens que tornaram a nossa vida mais prática, como por exemplo a inovação de tecidos, como LYCRA®, TACTEL®, NEOPRENE®, SUPLEX®, DRI FIT®.
Ademais, dentro da indústria da moda, a marca, além de ser um fator distintivo, reflete um valor social e cultural imenso. A Lei de Propriedade Industrial prescreve que os requisitos necessários para o registro da marca, enquanto sinal distintivo visualmente perceptível (art. 122), são (i) a distintividade, ou seja, o que diferencia o produto ou serviço dos demais; (ii) a veracidade, que busca a proteção do consumidor de possíveis erros em relação à procedência do produto desejado; (iii) a licitude; e (iv) a novidade relativa, de sorte que não poderá existir outra marca idêntica na mesma divisão comercial.
Observa-se, portanto, que o registro de marca no Brasil transforma um bem disponível de apropriação em um bem exclusivo do titular, garantido exclusividade de exploração e benefícios econômicos.
Aproximando esses conceitos da Indústria da Moda propriamente dita, observa-se que estamos diante de um campo de muitos conflitos entre empresas, e que não há uma definição legal, certa e específica sobre a aplicação dos direitos de propriedade intelectual voltada a essa modalidade industrial. A complexidade da tutela da propriedade intelectual no setor da moda reside no fato de que a proteção variará de acordo com o interesse almejado pelo tipo de indústria do setor (têxtil, vestuário, couro, calçados etc.).
Ademais, é característica da Indústria da Moda a polarização entre fast fashion e high fashion, de modo que a fast fashion se inspira ou até mesmo copia os designs de high fashion. No Brasil, a rigor, é limitada a proteção apenas da marca tradicional. Logo, marcas não tradicionais, a título de exemplo uma cor, um aroma ou movimento, estão fora do âmbito normativo da legislação pátria.
Observando a jurisprudência brasileira, a proteção dos direitos autorais é conferida nos casos em que se comprova a existência de indícios maiores do que uma simples tendência no ramo da moda, com a evidência de traços de criatividade e originalidade nos objetos dos litígios. Exemplo disso foi o julgamento do Recurso Especial nº 1943690/SP pela Ministra Nancy Andrigui, ocasião em que, na Ação de Abstenção de Uso de Marca, manteve-se o entendimento dos juízos de piso para se afirmar que a linha estilística revelava tão somente uma tendência do segmento da moda, para preservar a improcedência dos pedidos autorais.
É bem verdade que o design de moda precisa ser visto para além do caráter meramente utilitário a fim de que o direito autoral seja devidamente aplicável a disputas dessa natureza. Mesmo com o avanço da jurisprudência nesse sentido, para considerar os itens de moda como obras artísticas (criatividade e originalidade), ainda há um longo caminho a ser percorrido para ampliar o nível de tutela a ser conferido àquelas obras.
As criações de moda são resultado de um longo processo realizado pelo criador, desde sua idealização até o resultado final, que é a comercialização ou a exposição nas passarelas do mundo. Em virtude da rapidez dentro da indústria fashion, o tempo do processo de criação da moda passou a ser veloz e faz com que se perca a criatividade durante o percurso, quando as cópias surgem em razão da sede pelo consumo por toda a sociedade.
Portanto, a atribuição de direitos de propriedade intelectual às criações de moda é indispensável para impedir as violações que ocorrem recorrentemente nesse setor e para proteger, portanto, o esforço criativo dos criadores. Por mais que o aprofundamento sobre o direito da moda no Brasil seja recente, as relações jurídicas presentes neste nicho existem há anos.
A crescente expansão dessa indústria demonstra relevância do ramo para a economia do país, isto é, os reflexos desse setor industrial interessam e trazem consequências a todos: aos consumidores, às empresas e ao próprio Estado, em matéria de tributação.