O Brasil agora tem o marco legal dos jogos eletrônicos


O Brasil agora tem o marco legal dos jogos eletrônicos


Você ou sua empresa atuam no mercado de jogos eletrônicos? Então fique atento à nova lei que institui o marco legal dos jogos eletrônicos no Brasil, que já está em vigor com um conjunto robusto de regras de compliance e de proteção aos direitos de crianças e adolescentes, incluindo canal de denúncias, previsão de sanções, revisão de termos de uso, moderação parental, dentre outros. As pessoas e empresas atuantes no mercado de games precisarão se adequar à nova lei para estarem em conformidade. Acompanhe a seguir um resumo da Lei 14.852/2024.

Atento ao crescente mercado de games, o Governo brasileiro instituiu, por meio da Lei 14.852/2024, publicada em 6 de maio de 2024, o marco legal para a indústria dos jogos eletrônicos, aplicável à fabricação, importação, comercialização, desenvolvimento e uso comercial de jogos eletrônicos. A nova lei traz princípios e diretrizes para utilização dos jogos eletrônicos, dentre os quais se destacam a proteção integral da criança e do adolescente; a preservação da privacidade, proteção de dados pessoais e autodeterminação informativa; e a defesa do consumidor, dentre outros. Essa lei, inclusive, incluiu, no art. 2º, VI da Lei de Propriedade Industrial (Lei 9279/1996), a “concessão de registro para jogos eletrônicos.”

É importante considerar a definição da lei, segundo a qual se considera jogo eletrônico:

  • A obra audiovisual interativa desenvolvida como programa de computador, conforme definido na Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, em que as imagens são alteradas em tempo real a partir de ações e interações do jogador com a interface;
  • O dispositivo central e acessórios, para uso privado ou comercial, especialmente dedicados a executar jogos eletrônicos;
  • O software para uso como aplicativo de celular e/ou página de Internet, jogos de console de videogames e jogos em realidade virtual, realidade aumentada, realidade mista e realidade estendida, consumidos por download ou por streaming.

A Lei 14.852/2024 veda que dela se beneficiem as empresas e os profissionais envolvidos na produção ou distribuição de outros tipos de jogos aos quais tal lei não se aplica, que são: 

  • Promoções comerciais ou modalidades lotéricas disciplinadas pela Lei 13.756/2018 (loteria federal, loterias de prognóstico, Lotex) e pela Lei 14.790/2023 (apostas de quota fixa);
  • Jogos que ofereçam algum tipo de aposta, com prêmios em ativos reais ou virtuais;
  • Jogos que envolvam resultado aleatório ou de prognóstico.

Dos profissionais da área de jogos eletrônicos, a seguir definidos, não serão exigidos qualificação especial ou licença do Estado para exercício da profissão. Contudo, prevê-se apoio à formação de recursos humanos e espaços de formação, inclusive à criação de cursos tecnológicos e superiores direcionados a jogos eletrônicos. São estes os profissionais isentos de qualificação e licença:

  • Artista visual para jogos: profissional especializado em criar elementos visuais estáticos e/ou dinâmicos para jogos eletrônicos;
  • Artista de áudio para jogos: profissional especializado em conceber, projetar, desenvolver e implementar elementos sonoros para jogos eletrônicos;
  • Designer de narrativa de jogos: profissional especializado em conceber, projetar, desenvolver e implementar a narrativa, a história e a estrutura narrativa de jogos eletrônicos;
  • Designer de jogos: profissional especializado em conceber, projetar, corrigir, balancear, aprimorar e expandir a experiência interativa de jogos eletrônicos;
  • Programador de jogos: profissional especializado em desenvolver a lógica e o código que permitem o funcionamento dos jogos eletrônicos;
  • Testador de jogos: profissional especializado em testar e avaliar jogos eletrônicos em desenvolvimento, a fim de identificar falhas ou gargalos durante a sessão de jogo e outros defeitos possíveis;
  • Produtor de jogos: profissional especializado em liderar e supervisionar o desenvolvimento de jogos eletrônicos, desde a concepção até o lançamento.


Fomento

Tanto a Lei do Audiovisual (Lei 8685/1993) quanto a Lei Rouanet (Lei 8313/1991) aplicam-se ao desenvolvimento de jogos eletrônicos, agora considerado “segmento cultural”. O investimento em desenvolvimento de jogos eletrônicos passa a ser considerado investimento em pesquisa, desenvolvimento, inovação e cultura. O IBGE deverá disponibilizar um código CNAE específico para as empresas desenvolvedoras de jogos eletrônicos.

O tratamento especial ao fomento de jogos eletrônicos pode ser conferido tanto a empresários individuais, sociedades simples e MEIs, quanto a empresas e cooperativas com receita bruta anual de até R$ 16 milhões no ano-calendário anterior. Os critérios para esse tratamento são:
(i) uso de modelo inovador para gerar produtos ou serviços; ou
(ii) enquadramento no regime especial Inova Simples. 


Pontos principais da proteção a crianças e adolescentes:

Deve haver classificação etária prévia pelo Estado, considerando riscos relativos ao uso de mecanismos de microtransações (compras dentro do jogo).

Os jogos eletrônicos direcionados a crianças e adolescentes que permitam interação entre usuários (mensagens de texto, áudio, vídeo ou troca de conteúdo, seja síncrona ou assíncrona) estão sujeitos a requisitos mínimos para salvaguarda dos direitos desse público:

  • Canal de denúncias e reclamações sobre abusos e irregularidades por parte de usuários;
  • Retorno aos denunciantes, em prazo razoável, sobre o resultado das suas denúncias;
  • Meios para solicitar revisão de decisão e reversão de penalidades;
  • Transparência social sobre número de denúncias e categorias de violações; métodos usados para análise de denúncias, remoção de conteúdos e gerenciamento de comunidades; sanções a serem aplicadas a infratores, incluindo medidas para impedir que usuários banidos criem contas adicionais; ações educativas, de conscientização e promoção de direitos fundamentais;
  • Termos de uso que vedem práticas, trocas e interações que violem direitos de crianças e adolescentes;
  • Atualização e manutenção de ferramentas de supervisão e de moderação parental;
  • Transparência, atualização e melhorias contínuas de mecanismos de proteção contra risco de contato com outros usuários, com possibilidade de desativar mecanismos de interação;
  • Informações em português e em linguagem simples e de fácil compreensão para crianças adolescentes e responsáveis.

Alguns dos itens pendentes de regulamentação são: 

  • Desembaraço aduaneiro e taxas de importação alinhados com o fomento à inovação a empresas desenvolvedoras de jogos eletrônicos;
  • O uso de jogos eletrônicos para fins terapêuticos e para fins de comunicação e propaganda, devendo este último, em todo caso, observar a Lei 8069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

A equipe de TMT – Tecnologia, Mídia e Telecomunicações do Azevedo Sette Advogados acompanha o desenvolvimento do tema e fica à disposição para dúvidas e contribuições.