MPF contrário ao adiamento da vigência da LGPD


MPF contrário ao adiamento da vigência da LGPD


Em nota técnica enviada ao Congresso Nacional, o Ministério Público Federal (MPF), por intermédio da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e da Câmara Criminal, manifestou-se contrário ao adiamento da entrada em vigor da Lei nº 13.709/18 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD). 

O adiamento da vacatio legis da LGPD, que entraria em vigor em agosto deste ano, é resultado da aprovação, pelo Senado Federal, do Projeto de Lei (Substitutivo) – PLS nº 1.179/2020, que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas de Direito Privado. Como consequência da aprovação, ainda que parcial, das Emendas nº 20, 25, 30 e 43 feitas ao PLS nº 1.179/2020, o artigo 21 do respectivo projeto dispõe sobre a alteração da entrada em vigor da LGPD para 1º de janeiro de 2020, com a ressalva de que os dispositivos relativos às sanções administrativas somente entrarão em vigor em 1º de agosto de 2021.

No documento, o MPF manifesta seu entendimento de que a LGPD deve entrar em vigor no prazo já previsto em lei, ou seja, 20 de agosto de 2020, e as sanções administrativas previstas no artigo 52, da referida Lei, em 21 de agosto de 2021. Defende, também, a instalação, o mais breve possível, da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e do Conselho Nacional de Proteção de Dados e da Privacidade.

O Parquet salienta que a LGPD, fruto de amplo esforço legislativo, possui relevância no plano constitucional e infraconstitucional, na medida em que prevê a tutela de direitos com status constitucional, que demandam uma sistematização no texto da Constituição, nos termos da PEC 17/2019 sobre proteção de dados pessoais, e, ainda, normatiza os procedimentos de garantia desses direitos, estrutura o marco regulatório, cria o sistema administrativo e define o regime sancionatório, promovendo segurança jurídica aos agentes e aos setores por ela abrangidos.

Em continuação, o MPF reafirma a importância do arcabouço legal da LGPD no cenário atual de emergência de saúde pública, ocasionado pela COVID-19, constituindo-se em aliado ao desenvolvimento seguro e parametrizado de ações fundamentais para a proteção à saúde, para o isolamento social e para a colaboração com atores estrangeiros, na troca de dados essenciais ao enfrentamento da crise. 

Indo adiante, o MPF sinaliza para a dificuldade brasileira nas relações comerciais internacionais gerada pela ausência de uma legislação com um nível adequado de proteção de dados pessoais, cenário distinto do contexto europeu, o qual foi marcado pela entrada em vigor, em 2018, do Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia (GDPR). Afirma, ainda, que a existência de uma lei nacional, com parâmetros protetivos similares, abre portas às relações com os demais países, sendo de extrema relevância ao cenário atual de integração de iniciativas globais para o enfrentamento da pandemia, e ao contexto posterior, de retomada da economia, especialmente, com competidores em escala mundial, que demandam por accountability/prestação de contas, segurança jurídica e transparência nas relações comerciais, notadamente, quanto à economia digital e às regras de transferência internacional de dados pelos Estados.

Assevera o MPF que, se confirmada a prorrogação da vigência da LGPD, sua vacacio legis alcançará um marco temporal de 2 anos e 4 meses, prazo similar ao dobro do tempo para a entrada em vigor do Código Civil de 2002, norma que trata de assuntos extremamente complexos e abrangentes, com conteúdo muito mais extenso que aquele previsto na LGPD. Continua a afirmar a importância da Lei nº 13.709/18, também, do ponto de vista criminal, ao prever a possibilidade de transferência internacional de dados para fins de investigação criminal conduzida em outros países e a servir como facilitadora da cooperação internacional no tocante à transferência de dados para subsidiar procedimentos criminais.

Por fim, reitera que, além da necessidade de ser mantido o prazo da entrada em vigor da LGPD, devem ser instalados, imediatamente, a ANPD e o Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, órgãos que  poderão contribuir para a densificação da   regulação do uso de dados para fins de enfrentamento da pandemia, com observância dos princípios e das regras da LGPD, contribuindo para a segurança jurídica das medidas adotadas pelo país que tenham repercussão na proteção de dados dos cidadãos. O MPF ressalta, porém, que os dispositivos referentes às sanções administrativas devem permanecer prorrogados para entrar em vigor em 1º agosto de 2021, pois representaria tempo necessário para que as empresas e para que o próprio setor público se adequem e, ainda, para a consolidação dos respectivos órgãos de proteção de dados.

O texto do Projeto de Lei Substitutivo (PLS) 1.179/2020 aprovado pelo Senado Federal, em 03.04.2020, aguarda votação pelo Plenário da Câmara dos Deputados e sua tramitação pode ser consultada no link do site da Câmara.