Dolarização de patrimônio e offshore


Dolarização de patrimônio e offshore


Proteção patrimonial cambial com investimento em moeda estrangeira forte.  

Entenda primeiro como funciona um veículo offshore e as vantagens dessa estrutura.  

Por Liliane Grazielle Araujo Campos e Leandra Guimarães

Dado o cenário econômico desafiador atualmente vivenciado no Brasil, pessoas que antes nunca pensaram em investir o patrimônio no exterior estão considerando, como estratégia prioritária, a alocação de patrimônio em moeda estrangeira mais forte do que o Real, a diversificação de riscos, a organização patrimonial e o planejamento de sucessão, dando guarida às usuais recomendações de assessores financeiros atentos, que antes eram deixadas de lado à conta da suposta complexidade. 

A favor desta mudança de mentalidade tem-se, entre outros fatores, a globalização das economias e culturas, as facilidades tecnológicas, tornando as fronteiras geográficas facilmente transponíveis, senão, inexistentes, e a fluidez com que as pessoas se comunicam e interagem. Particularmente no Brasil, soma-se a esses fatores a recente desburocratização cambial brasileira proposta pelo Novo Marco Cambial. Esse novo ambiente, contribui para a fácil implementação de referida estratégia patrimonial financeira, simplificando a realização de investimentos no exterior em diferentes modalidades, sendo as mais comumente observadas a: compra e venda de imóveis; aquisição de títulos e ações no mercado financeiro e de capitais em geral; participação em incorporações imobiliárias e sociedades estrangeiras de diferentes ramos de negócios; entre outras.  

O Dólar, considerado uma das moedas mais fortes e estável do mundo é, sem dúvida, a moeda preferida desses novos investidores. 

Conforme for o perfil e os objetivos do investidor e de sua família, o primeiro passo é a definição se a internacionalização do patrimônio será feita diretamente pelas pessoas físicas ou jurídicas brasileira ou se é necessária ou recomendável a atuação através de um veículo conhecido como “offshore”. 

Um veículo offshore pode significar uma sociedade, um fundo de investimento ou outros tipos de entidades constituídas e até mesmo contratos celebrados fora do país de residência do investidor. Nesta oportunidade vamos focar num veículo do tipo sociedade ou fundo de investimento. Normalmente, a estruturação através de veículo offshore proporciona melhores soluções patrimoniais, financeira e sucessórias. Mas, como fazer isso? E como ocorre a administração e a tributação desse patrimônio localizado no exterior e a sucessão para os herdeiros que estão no Brasil? 

Primeiramente, é essencial destacar que não há qualquer ilicitude na internacionalização de patrimônio através de um veículo societário ou financeiro, desde que tais estruturas não sejam constituídas com objetivos fraudulentos e criminosos tais como, fraude contra credores; lavagem de dinheiro; evasão de divisas; ocultação de patrimônio, entre outros e que sejam observadas todos aspectos legais e regulatórios na jurisdição estrangeira e no Brasil. 

Antes de dar o primeiro passo nesse processo, considere que essa não é uma estratégia para amadores e deve ser cuidadosamente planejada com assessoria coordenada entre o seu consultor financeiro e seus advogados especializados em planejamento patrimonial (Tributário/Societário/Sucessório) no Brasil e no exterior. 

Quanto à administração do patrimônio, o investidor brasileiro detém a participação direta no veículo offshore e continua a ter toda gestão e poder de decisão em relação ao seu patrimônio, através da adequada estruturação de políticas de representação e governança, conforme legislação societária e aspectos regulatórios pertinentes ao tipo de veículo e à jurisdição de domicílio do mesmo. Adicionalmente, alguns veículos, como por exemplo alguns fundos de investimentos, podem proporcionar acesso a linhas de crédito internacionais com custo bastante reduzido. 

O planejamento sucessório envolvendo participação em uma offshore no exterior é um ponto que deverá ser muito bem estruturado pelo seu advogado no Brasil em conexão com o advogado do país no qual o investimento será realizado. Nem todo país possui institutos como usufruto e cláusulas restritivas para doações1 como existe no Brasil. Ademais, o interesse da legislação civil sucessória brasileira está limitada aos bens aqui situados, de maneira que, se houver outros bens situados fora do Brasil, o inventário relativo a esses bens foge à jurisdição brasileira e, por consequência, serão inventariados e partilhados em separado em outro país, conforme localização da sua Offshore. Segundo o STJ: “O inventário e a partilha devem ser processados no lugar da situação dos bens deixados pelo falecido, não podendo o juiz brasileiro determinar a liberação de quantia depositada em instituição financeira estrangeira” (STJ 3ª T REsp n. 510.048). Conforme for a jurisdição o inventário deverá, necessariamente, seguir um rito judicial. Da perspectiva tributária no Brasil, o adequado planejamento sucessório no exterior pode proporcionar vantagens tributarias para a família. 

Outras soluções jurídicas, sem correspondentes na legislação brasileiras, são usualmente utilizadas no exterior de forma a simplificar a sucessão e evitar a quebra de continuidade na gestão e operação dos negócios, tais como a propriedade simultânea2 e o Trust3 (semelhante ao Contrato de Fidúcia), fortemente utilizado como veículo jurídico de planejamento patrimonial e sucessório. O Trust permite que um indivíduo (settlor) transmita bens a um terceiro (trustee) para que este os administre em favor de determinados beneficiários (beneficiaries), conforme regras definidas em um contrato (trust agreement/trust deed). Questões como: administração de bens em favor de filhos incapazes, menores, administração profissional de bens, gestão do patrimônio em caso de incapacidade/interdição do transmissor (settlor), até a entrega dos bens em hipóteses de falecimento. 

Quanto aos aspectos tributários, as estruturas de investimentos no exterior, usualmente, visam aproveitar ao máximo diferentes vantagens tributárias tais como o diferimento de tributação no Brasil; não tributação de lucros e ganhos auferidos pelo veículo offshore em outras jurisdições; domicílio com reduzida carga tributária sobre ganhos, lucros e na repatriação; a existência de acordos com o Brasil contra dupla tributação, entre outras. Ademais deve-se atentar ao cumprimento das obrigações acessórias e principais no Brasil e no exterior. No Brasil, por exemplo: (i) as quotas da sociedade offshore devem ser incluídas na Declaração de Imposto de Renda da pessoa física refletindo os aporte e reduções a cada período. As reduções de capital e distribuição de lucros podem gerar imposto de renda à pagar no Brasil; (ii) os ativos no exterior, inclusive o investimento na sociedade offshore, devem ser incluídos na Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior-DCBE se totalizarem a: US$ 1.000.000,00 ou equivalente em outras moedas, em 31 de dezembro de cada ano-base – CBE Anual; US$ 100.000.000,00 ou equivalente em outras moedas, em 31 de março, 30 de junho e 30 de setembro de cada ano-base – CBE Trimestral. Para elaboração da DCBE é necessário elaboração de escrituração contábil. 

Os assessores e agentes do exterior devem ser consultados em relação às obrigações acessórias e principais a serem atendidas, conforme legislação do local da offshore. Vale comentar que, mesmo nas jurisdições conhecidas como “paraísos fiscais” tem sido estabelecidas obrigações acessórias com vista a comprovação da substância econômica das atividades lá desenvolvidas, que podem variar entre a apresentação da Declaração de Substância Econômica e do Efetivo Beneficio, além da manutenção de agente local e apresentação anual do balanço da sociedade ao agente, até a manutenção de escritório físico, com empregados e diretor local, entre outros requisitos. 

De fato, estamos vivendo um “boom” de procura por investimentos diversificados que inclui investimentos fora do País. A estruturação jurídica correta do investimento no exterior é essencial para o sucesso dos objetivos almejados. Estudar a viabilidade de se ter um veículo offshore no processo de dolarização de patrimônio é fundamental e seus assessores jurídicos e financeiros deverão, não apenas conhecer esse tipo de investimento, mas ter expertise prática e profissional para promover essa estruturação.  

Nossa equipe de Direito Societário, Sucessório e Tributário, com expertise em investimentos estrangeiros e planejamento patrimonial e sucessório, está à disposição para lhe auxiliar.

Referências:

1Incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade 

2 JTWRS – Joint Tenancy with rights of survivorship 

3 Diante da falta de regulamentação sobre o Trust no Brasil, verifica-se uma ampla utilização deste contrato em outras jurisdições por brasileiros que detêm patrimônio no exterior. ASA - 107815v1