O Diálogo Competitivo nas contratações de PPPs


O Diálogo Competitivo nas contratações de PPPs


Por Ivana Cota e Glaucia da Silva Souza

A publicação da Lei nº 14.133/2021, conhecida como a “Nova Lei de Licitações e Contratos”, marcou uma significativa mudança no cenário jurídico brasileiro em relação aos processos licitatórios de contratações públicas. Datada de 1º de abril de 2021, a lei entrou em vigor imediatamente, mas seu período de transição perdurou até 30 de dezembro de 2023, momento em que foram revogados todos os normativos anteriores relacionados ao tema.

O fim do período de transição marcou a implementação total da nova legislação, trazendo mudanças práticas que redefiniram a forma como as licitações eram tradicionalmente realizadas. Um dos aspectos relevantes trazidos pela normativa foi a introdução do “diálogo competitivo”, modalidade que busca enriquecer as opções disponíveis no processo licitatório, fomentando a interação entre a Administração Pública e os participantes privados.

Nesse sentido, o texto do art. 6º, inciso XLII, da Nova Lei de Licitações e Contratos define o diálogo competitivo como a “modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos”.

Visivelmente pautado em experiências internacionais consolidadas, tal qual a Diretiva de 2014/24/UE1, o estabelecimento do diálogo competitivo reflete a busca por maior flexibilidade nas licitações, já que essa abordagem se destaca por viabilizar a construção da solução mais satisfatória à problemática que deu causa à contratação, por meio do envolvimento da inciativa privada.

Isto significa, em termos práticos, que o diálogo competitivo propõe uma abertura para o envolvimento ativo dos participantes do setor privado no processo de definição do objeto desejado pela Administração Pública. Com isso, ao incorporar a experiência e o conhecimento especializado das empresas privadas, o processo de busca por soluções inovadoras e eficazes para demandas complexas da Administração Pública é abreviado na medida em que se supera as limitações que o Estado encontra ao agir isoladamente.

O dialogo competitivo ganha relevância nos projetos de Parceria Público-Privada e Concessões, tendo em vista que contratações dessa natureza tendem a envolver um alto grau de capacidade técnica e demandar um longo período de maturação, planejamento e estruturação, pois passam pelas fases de (i) planejamento de longo prazo e identificação do projeto; (ii) estruturação, que compreende a fase de realização de estudos para o início da licitação (viabilidade técnica, econômica, ambiental e jurídica) e a fase de licitação propriamente dita; e (iii) execução do projeto.

Neste aspecto, o estreitamento do diálogo com o setor privado permite uma análise holística capaz de conferir diferentes alternativas para viabilizar um mesmo projeto e, consequentemente, resulta em uma maior eficiência da contratação pública em atenção aos princípios que regem o processo licitatório.

Vale lembrar que a licitação é um procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia e voltada para o duplo objetivo de proporcionar à Administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso e o de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem em igualdade de condições à contratação pretendida pela Administração.

Para assegurar o cumprimento da dupla finalidade da licitação no âmbito do diálogo competitivo, a Nova Lei de Licitações e Contratos prevê que a Administração Pública apresentará, por ocasião da divulgação do edital em sítio eletrônico oficial, suas necessidades e as exigências já definidas e estabelecerá prazo mínimo de 25 (vinte e cinco) dias úteis para manifestação de interesse de participação na licitação, sendo que todos os interessados que preencherem os requisitos serão admitidos (art. 32, §1º, inciso I).

Posteriormente, inicia-se a fase de diálogo com os interessados, podendo haver sucessivas fases para restrição do escopo das soluções apresentadas e das propostas em discussão, com a eliminação daquelas que não se adequam ao modelo pretendido e escolha da solução mais viável.

Uma vez encerrada a fase do diálogo e definida a melhor solução, inicia-se a fase competitiva com a divulgação de edital contendo a especificação da solução que atenda às suas necessidades e os critérios objetivos a serem utilizados para seleção da proposta mais vantajosa e abrir prazo, não inferior a 60 (sessenta) dias úteis, para todos os licitantes pré-selecionados apresentarem suas propostas, que deverão conter os elementos necessários para a realização do projeto.

Por fim, o diálogo competitivo será conduzido por comissão de contratação composta de pelo menos 3 (três) servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes aos quadros permanentes da Administração, admitida a contratação de profissionais para assessoramento técnico da comissão.

Não obstante o rito previsto, a Nova Lei de Licitações e Contratos admite que a Administração Pública também se utilize de procedimentos auxiliares previstos em seu art. 78, quer sejam: o credenciamento, pré-qualificação, o procedimento de manifestação de interesse, o sistema de registro de preços e o registro cadastral (artigo 28, § 1º).

Dessa forma, diante dos instrumentos de interação com o mercado disponíveis no ordenamento jurídico, o diálogo competitivo se mostra uma importante ferramenta garantidora de flexibilidade, e eficiência na contratação pública, pois permite que o Estado aproveite a experiência e a expertise do setor privado para encontrar soluções mais eficazes e adaptadas às demandas específicas e desafiadoras.

No entanto, para que se torne atrativo e economicamente viável para a iniciativa privada, ainda é necessário que a Administração Pública se valha de todos os meios disponíveis para o aprimoramento de seus projetos, com vistas a evitar assimetrias informacionais e garantir um processo de seleção justo e transparente dos participantes, bem como uma avaliação imparcial das propostas com garantia de confidencialidade e tornar a nova modalidade de licitação aderente às melhores práticas e inovações tecnológicas, sem perder de vista, claro, o maior grau de satisfação ao interesse público.