O confinamento da população em razão do Coronavírus e seus reflexos na aceleração da transição para o mundo virtual e na desburocratização das relações jurídicas empresariais e interpessoais


O confinamento da população em razão do Coronavírus e seus reflexos na aceleração da transição para o mundo virtual e na desburocratização das relações jurídicas empresariais e interpessoais


A sociedade contemporânea, que já estava passando por um processo exponencial de informatização, viu este fenômeno ser fortemente acentuado com o advento da pandemia do Coronavírus e as recomendações de isolamento social e quarentena. 

A adoção abrupta de home office por companhias inteiras, realização de reuniões (e comunicação em geral) por meio de ferramentas de videoconferência, utilização de documentos exclusivamente virtuais ou digitalizados e disponibilização de arquivos em drives para compartilhamento na nuvem são apenas alguns exemplos de transformações disruptivas que ocorreram na rotina de muitos profissionais. 

Com isso, os três poderes da república, que também já vinham se atentando para a necessidade de se flexibilizar requisitos civis e de reaproximar as leis e decisões judiciais das demandas hodiernas da população, também foram impactados por esta revolução tecnológica e tiveram de ajustar, rapidamente, a legislação e a jurisprudência à realidade atual.

Sem influência das repercussões da quarentena, o STJ1 já norteava entendimento que enaltece as mudanças de paradigmas em detrimento dos pressupostos burocráticos da legislação civil, como ilustra a decisão que julgou válido um testamento que, apesar de não ter sido assinado de próprio punho pela testadora, contou com sua impressão digital. Merece destaque a fundamentação utilizada pela Ministra Relatora Nancy Andrighi:


“As pessoas do mundo moderno não mais se individualizam e se identificam apenas por sua assinatura de próprio punho, mas sim por seus tokens, chaves, logins, senhas, ids, certificações digitais, reconhecimentos faciais, digitais, oculares. (...) As decisões judiciais dispensam assinatura do próprio punho e negócios jurídicos de muita relevância são celebrados apenas por WhatsApp, Facebook, chats, Instagram.”


“Não é minimamente razoável supor ou impor que um millennial ou pós-millennial que pretenda dispor de modo testamentário de sua herança digital somente o possa fazê-lo se imprimir o documento e assiná-lo de próprio punho. E talvez sequer tenham a destreza necessária para reproduzir em série uma assinatura de próprio punho, habilidade de que não precisam para viver adequadamente.”


Antes mesmo do cenário de pandemia ser instaurando no Brasil, com aclamada percepção pública de harmonização entre a legislação e as particularidades atuais da sociedade, foram promulgadas a Lei de Liberdade Econômica, com o objetivo primordial de desburocratizar e simplificar a atividade empresarial, e a Lei Geral de Proteção de Dados, que visa proporcionar uma adequação a impasses surgidos no ambiente virtual, instituindo uma série de pressupostos a serem atendidos pelos controladores e operadores de dados pessoais.

Na mesma linha de encurtar o hiato entre normas ultrapassadas e a realidade cada vez mais delineada por soluções tecnológicas, é possível citar diversos exemplos de inovações impulsionadas pelo distanciamento físico da população, como as alterações no regimento interno do STF2, que ampliaram a possibilidade de julgamento virtual em sessão plenária do Supremo para qualquer processo, prevendo, inclusive, a realização de sustentação oral de procuradores por áudio ou vídeo encaminhado ao Tribunal.

Já em meio ao novo Coronavírus, por meio do Decreto n.º 10.278, editado em 18 de março de 2020, o poder Executivo regulamentou disposição da referida Lei da Liberdade Econômica, conferindo os mesmos efeitos legais e o mesmo valor dos documentos originais aos documentos digitalizados, sejam eles públicos ou privados.

Para operacionalizar a funcionalidade do Judiciário enquanto perdura a situação emergencial na Saúde, o CNJ disponibilizou3 uma ferramenta que tem sido adotada por diversos tribunais para a realização das primeiras audiências virtuais e para a prática de outros atos por videoconferência. No Maranhão, um divórcio foi realizado4 em plataforma online, e a Justiça do Trabalho do Mato Grosso do Sul homologou um acordo extrajudicial por meio de uma chamada de vídeo no aplicativo Whatsapp5.

Um outro passo adiante que foi antecipado pelo contexto em que estamos vivendo foi a autorização, por uma Juíza de Porto Alegre/RS, para que se realizasse, de maneira inteiramente virtual6, a Assembleia Geral de Credores em Recuperação Judicial, como recomendado pelo CNJ7.

Tratam-se de simples adequações de normas e decisões à realidade atual, processo acelerado pelos reflexos da pandemia, e que possivelmente vieram para ficar, representando uma transição definitiva para o mundo virtual e viabilizando a desburocratização nas relações jurídicas empresariais e interpessoais.

O Azevedo Sette Advogados, que já utilizava inúmeras ferramentas modernas, se mantém atento ao surgimento destas possibilidades inovadoras também na legislação e jurisprudência para garantir a produtividade na atuação frente ao Judiciário e se coloca à disposição para auxiliar qualquer necessidade de salvaguarda dos direitos de nossos clientes, ainda que de maneira remota em tempos de COVID-19.


1. STJ - REsp nº 1633254 / MG (2016/0276109-0), Relatora Ministra Nancy Andrighi, Data de Julgamento: 11/03/2020, S2 – Segunda Seção, Data de Publicação DJe 18/03/2020