Recentemente durante uma dinâmica de programa de televisão veio à tona fato curioso: numa pesquisa popular sobre qual o primeiro ato das pessoas ao despertar, a maioria respondeu: mexer no celular. Essa resposta venceu até aqueles que, pensando escapar de uma pegadinha, disseram ‘abrir os olhos’.
Isso é mundo contemporâneo. Estamos há todo momento trocando mensagens por aplicativos; lendo ou respondendo e-mails; vendo anúncios, filmes, séries ou documentários; ouvindo áudios, podcasts, etc. E tudo isso, não raras as vezes, fazemos com o celular.
Toda essa interação é parte de um processo maior, que se fez necessário lá atrás para que o homem convivesse em sociedade, é o processo de comunicação.
Há quem defenda que o sucesso da comunicação advém do ideal de perfeita sintonia entre os interlocutores que são reciprocamente compreendidos.
No século XXI, a comunicação é voltada para a linguagem digital, a qual envolve a oralidade e a escrita em novas formas e contextos, com caráter mais crítico e ao mesmo tempo criativo. Neste novo cenário se faz necessário expressar as ideias a partir de novas ferramentas de comunicação, sempre atento ao perfil dos interlocutores.
A “geração internet” conta com fontes de informação e formas de comunicação diversas, além da forma escrita e impressa predominante em gerações anteriores. A comunicação contemporânea rompeu as barreiras da formalidade e dos textos impressos, para se adaptar às mais variadas formas de produção de conteúdo, focadas na liberdade, facilidade e manipulação das informações. Toda essa inovação na forma de gerar e entregar o conteúdo resultou na maior participação e interação dos leitores, que geralmente prestigiam linguagem simples, criativa e intuitiva.
Segundo a professora Vani Moreira Kenski, em seu trabalho sobre o novo ritmo da informação nessa nova era, a tecnologia contribui com a nova forma de comunicação pois “rompe as formas narrativas circulares e repetidas da oralidade e com o encaminhamento contínuo e sequencial da escrita, e se apresenta como um novo fenômeno descontínuo, fragmentado e, ao mesmo tempo, dinâmico, aberto e veloz. Deixa de lado a estrutura serial e hierárquica da articulação dos conhecimentos e se abre para o estabelecimento de novas relações entre conteúdos, espaços, tempos e pessoas diferentes” (KENSKI, 2007, p.31)1.
Essa realidade dinâmica, que exige comunicação objetiva e eficaz não está à margem do Direito. Uma pesquisa Ibope2, realizada no ano de 2004, relacionou a dificuldade da população brasileira de compreender os termos jurídicos, utilizados por advogados e juízes, com o sentimento de afastamento da própria Justiça. Embora ainda esteja enraizado no dito mundo jurídico uma linguagem muito técnica, com expressões complexas que parecem distanciar os operadores do direito daqueles com quem eles se comunicam ou deveriam se comunicar, há um inegável movimento disruptivo.
A simplificação do “discurso jurídico” é uma realidade e há diversas ferramentas para facilitar a criação de documentos jurídicos, sejam eles processuais ou não. O “Design Thinking” é um exemplo destas ferramentas. Ele consiste “na capacidade de sermos intuitivos, reconhecer padrões, desenvolvermos ideias que tenham um significado emocional além do funcional, nos expressarmos em mídias além de palavras ou símbolos” (BROWN, 2010, p. 04)3. Essa metodologia aplicada ao Direito é conhecida como “Legal Design” ou “Visual Law”. A criação de documentos jurídicos a partir destes conceitos afasta a rigidez do texto escrito e cede espaço para uso de recursos visuais e tecnológicos que permitem maior interação com o interlocutor.
O Conselho Nacional de Justiça elencou essas novas ferramentas como essenciais para o plano estratégico de comunicação do Poder Judiciário4: “sempre que possível, dever-se-á utilizar recursos de visual law que tornem a linguagem de todos os documentos, dados estatísticos em ambiente digital, análise de dados e dos fluxos de trabalho mais claros, usuais e acessíveis.”
Assim como tudo que emerge sob holofotes de uma novidade, o conceito de comunicação intuitiva e visual para os documentos jurídicos conta com os resistentes à adesão e até os exagerados em seu uso. Nos parece, entretanto, que o equilíbrio é o ingrediente que determina a eficácia no uso dessas inovações.
A dosagem na aplicação dos recursos visuais e tecnológicos para comunicação no ambiente jurídico representa atualmente aquela desejável sintonia entre os interlocutores que se compreendem reciprocamente, conforme mencionamos no início deste texto. O conhecimento sobre tipografia, recursos visuais e tecnológicos, redação persuasiva, discurso objetivo e efetivo diferencia os profissionais que atuam no mercado jurídico. Essa realidade também é inegável.
Em resumo, a boa comunicação no ambiente jurídico, atualmente, não se limita à utilização de termos difíceis e rebuscados. Ao revés, a tendência é de simplificação, estímulo da interação dos interlocutores e efetividade na comunicação. Isso só nos faz refletir sobre o seguinte pensamento “o maior problema com a comunicação é a ilusão de que ela já foi alcançada” (William H. Whyte). Estamos, portanto, diariamente desafiados a criar conteúdo persuasivo, atrativo, intuitivo e eficaz.
1 KENSKI, V. M. Educação e tecnologias: o novo ritmo da informação. Campinas, São Paulo: Papirus, 2007.
2 População confunde funções do Judiciário e da Polícia, diz Ibope. Revista Consultor Jurídico, 13 de outubro de 2004. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2004-out-13/imagem_judiciario_detalhada_pesquisa_ibope.
3 BROWN, Tim. Design Thinking: Uma metodologia poderosa para decretar o fim das velhas ideias. São Paulo: Elsevier Editora, 2010.
4 Resolução Nº 347 de 13 de outubro de 2020, publicada pelo Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3518