Arbitragem: problema ou solução?


Arbitragem: problema ou solução?


A arbitragem como solução válida para os conflitos e alternativa à via judicial é defendida por muitos juristas, mas de uns tempos para cá está sendo posta em dúvida principalmente pelos empresários, depois de algumas questões relevantes que surgiram como os casos do Pão de Açúcar e da Odebrecht.

Desde 1996 vigora a Lei n° 9.307, que regulamentou a arbitragem e possibilitou a implantação no País desse sistema para solução de litígios entre partes. À época houve grande entusiasmo e Câmaras de Arbitragem surgiram no País, como alternativa ao processo judicial e todos seus inconvenientes. A arbitragem seria mais rápida, barata, sigilosa e segura.

Grandes bancas passaram a adotar a cláusula arbitral (opção pela arbitragem) em seus contratos e entidades como a Bovespa, Fiesp, Fiemg e Câmaras de Comércio apoiaram a criação de Câmaras ou Comitês de Arbitragem por onde tramitam os procedimentos arbitrais.

Havia um consenso na comunidade jurídica brasileira de que a arbitragem, que funcionava bem na maioria dos países estrangeiros, aqui teria vindo para ficar e seria realmente alternativa válida ao ingresso em juízo. Aliás foram muitas as pressões dos organismos internacionais par que se implantasse a arbitragem no Brasil.

O tempo foi passando e os conflitos e divergências “amparados” em cláusulas arbitrais foram surgindo e as Câmaras de Arbitragem passaram a trabalhar com mais intensidade. Hoje existe um porcentual relevante de procedimentos arbitrais em curso no Brasil testando a eficácia dessa opção.

Penso que temos para o meio jurídico um novo mecanismo com o qual não estávamos habituados e que, em que pese ter funcionado bem no exterior, aqui não fazia parte de nossa cultura jurídica. Adotamos o modelo internacional sem muitas variantes e passamos a colocá-la a prova no dia a dia.

O primeiro entrave encontrado foi o da correta formulação de “cláusula arbitral”. O segredo de uma boa arbitragem está na redação da cláusula arbitral e a maioria não sabia como fazer essa opção. Tivemos então um grande número de contratos optando pela arbitragem, mas com a cláusula arbitral deficiente. Isso trouxe problemas e tem motivado muitos dos casos que chegam à mídia.

Como não tínhamos advogados especializados em arbitragem, essa carência trouxe para o procedimento arbitral os profissionais do contencioso judicial e, com eles, sem crítica, vieram as práticas comuns em juízo e que normalmente não são encontradas em arbitragens internacionais. O resultado é que o processo arbitral no Brasil começou a ficar também burocrático.

Com relação aos árbitros o mesmo problema surgiu: falta de experiência da grande maioria. As Câmaras de Arbitragem nomearam seus árbitros, quase todos advogados, com pouca vivência de arbitragem. Foi um “learning process” que ainda está em andamento.

Tivemos grande dificuldade na implantação da arbitragem e sua aceitação pela comunidade jurídica nacional. O Poder Judiciário foi inicialmente resistente ao novo meio de solução de conflitos. A Justiça do Trabalho ainda hoje nega sua aplicação quando se trata de direitos trabalhistas.

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça assimilaram bem a nova lei e foram até decisivos ao afirmarem sua constitucionalidade, que vinha sendo contestada.

Mas afinal a arbitragem é solução ou problema? Em alguns casos específicos é solução e, em outros, pode se tornar um problema.

A arbitragem no Brasil não é tão rápida e nem tão barata como dito inicialmente. Há casos de arbitragem durando anos e com elevado custo.

Os árbitros tem se revelado especialistas em arbitragem apenas, nem sempre na matéria envolvida. O risco nesse caso aumenta, por se tratar de decisão única e irrecorrível. Se os árbitros decidem o conflito erroneamente não há conserto, o que não acontece em juízo porque sempre cabe um recurso para a instância superior que pode corrigir o erro.

A arbitragem não é uma solução mágica e tem problemas, como também os tem e muitos o procedimentos judicial, ela vale a pena em questões sigilosas e que precisam ser decididas com cautela e sem exposição pública, ou onde há necessidade de uma solução técnica se os árbitros designados forem especializados e as partes reconhecerem que só eles podem resolver as dúvidas existentes e estejam dispostas a acatar o que for decidido. Nesses casos a arbitragem funciona mas em outros sempre pode haver dúvidas, riscos e polêmicas que acabam desaguando na justiça mesmo, principalmente aqui no Brasil onde não temos a cultura da arbitragem e nem sempre aceitamos a irrecorribilidade do laudo arbitral.

Noticia Publicada no Jornal O Estado de São Paulo