Uma das grandes melhorias prometidas no âmbito da Reforma Tributária consiste na total desoneração das exportações, visando o aumento da competitividade da indústria nacional no mercado externo, em comparação com os players sediados em países que adotam o sistema do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), inclusive por nossos vizinhos integrantes do Mercosul. Para alcançar esses objetivos, além da simplificação, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45/2019 garante trazer transparência ao sistema tributário brasileiro e alcançar a aplicação plena da não-cumulatividade.
Isso porque, no nosso sistema atual, apesar da Constituição prever a não incidência do ICMS, IPI, PIS, COFINS e da CIDE sobre as exportações, a imunidade não é de fato alcançada de forma plena, porque se limitam apenas à etapa final de venda das mercadorias ao mercado externo. Assim sendo, a cadeia produtiva das mercadorias exportadas é originalmente onerada, o que faz com o que os preços praticados pelos brasileiros sejam menos competitivos. A situação é ainda agravada, tendo em vista que os preponderantemente exportadores são, usualmente, vistos em posição de verdadeiros acumuladores de créditos, os quais, por consequência dos procedimentos altamente burocráticos, são impedidos de recuperá-los. No final das contas, o preço é impactado diretamente.
Dentre os tributos de mais difícil restituição, destaca-se o ICMS que, além de depender da comprovação de sua origem e da demonstração da efetividade da exportação, com a remessa dos produtos para o exterior, conforme já mencionado, muitas vezes, o exportador não possui atividades internas para utilizar os créditos. Não obstante a Lei Kandir permitir a transferência de créditos para terceiros, na prática, além de burocrática, a transferência muitas das vezes é inviabilizada pelos Estados.
Com a tributação do consumo e a neutralização da cumulatividade, espera-se que a indústria voltada para a exportação experimente uma diminuição da carga tributária que se acumula ao longo da cadeia e é incorporada aos preços. A expectativa é, portanto, que a desoneração das exportações seja alcançada em sua plenitude, aumentando a competitividade dos produtos e serviços brasileiros no mercado externo, o que pode potencializar as exportações, gerar oportunidades de emprego e promover o crescimento econômico.
Ademais, está em pauta a sugestão de assegurar o ressarcimento de eventuais créditos acumulados por exportadores em curto prazo (máximo 60 dias).
Nesse contexto, a Reforma parece alcançar o cenário dos sonhos para os exportadores. Contudo, o conteúdo da reforma ainda inclui aspectos que requerem uma análise crítica que podem impactar diretamente a exportação.
Dentre esses pontos, aquele que tem suscitado maiores debates é a inclusão de última hora do artigo 20 da emenda aglutinativa, que autoriza os Estados a imporem uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados até 31 de dezembro de 2043. À medida que esses itens representam 40% das exportações brasileiras, esta contribuição poderia configurar uma tributação indireta das exportações, teoricamente exoneradas pela Reforma. Tal disposição pode ser vista como um verdadeiro “tiro no pé”, já que pode comprometer a competitividade tão almejada e ainda estabelecer uma nova espécie de “guerra fiscal” entre os Estados, já que as
indústrias obviamente buscarão aqueles que não realizam a tributação ou que a fazem em menor grau. A expectativa é de que o Senado rejeite esta disposição.
Outro ponto que deve ser observado de perto envolve o Imposto Seletivo, cujo propósito é induzir ou frear o consumo de certos produtos. A PEC 45/2019 prevê alíquotas diferenciadas dentro do sistema IBS e CBS para uma série de bens e serviços considerados essenciais e, por outro lado, prevê o tributo federal de Imposto Seletivo para itens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Entretanto, em momento algum observa-se disposição clara e expressa sobre o que será considerado prejudicial ou sobre critérios objetivos que possam esclarecer este conceito. Há, portanto, uma preocupação legítima, já que, a discricionariedade permitida pelo texto gera incertezas e especulações acerca do aumento da carga tributária também nas exportações.
Por fim, a Reforma também levanta dúvidas quanto à preservação dos regimes especiais aduaneiros, criados para tentar desonerar a cadeia produtiva das mercadorias exportadas. De fato, ao estabelecer que a Lei Complementar disporá sobre as hipóteses de diferimento do imposto aplicáveis aos regimes aduaneiros especiais e às zonas de processamento de exportação, a PEC reconheceu a singularidade das transações de comércio internacional, que muitas vezes exigem regimes específicos. A formulação utilizada, no entanto, não é capaz de esclarecer a extensão da exceção, o que gera incertezas quanto às implicações da Reforma para os regimes atualmente em vigor. Deste modo, até o momento não há uma resposta definitiva em relação à extinção e/ou restrição de benefícios e regimes diferenciados.
Como se vê, uma Reforma Tributária baseada na tributação do consumo tem o potencial de aprimorar a desoneração das exportações, o que, por conseguinte, pode resultar em um aumento significativo na competitividade dos bens e serviços brasileiros. Entretanto, é oportuno mencionar que ainda existem pontos que causam uma certa insegurança e que estão desalinhados com os objetivos de desburocratização, aumento da previsibilidade e da estabilidade fiscal e de aumento da competitividade e estímulo ao crescimento econômico.