SP altera regra de concessões para atrair novos investidores


SP altera regra de concessões para atrair novos investidores


Diante de um cenário de incertezas no setor de concessões de projetos de infraestrutura – com indefinição sobre o novo papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no financiamento de projetos, crédito escasso e empresas concessionárias tradicionais investigadas pela Operação Lava-Jato, o governo de São Paulo tenta inovar no campo das privatizações para atrair mais investidores.

Ainda neste semestre, o Estado vai lançar editais de concessão à iniciativa privada de dois lotes de rodovias com um elemento contratual inédito no país: o “direct agreement” ou acordo tripartite. Já consolidado em projetos de concessão de infraestrutura em países desenvolvidos, o mecanismo amplia os direitos do financiador nos contratos, o que significa “um atrativo a mais para investidores óbvios, como grandes bancos, e até novos players num momento difícil para as concessões no país”, afirmou ao Valor um especialista.

Uma das vantagens do “direct agreement” em relação à estrutura contratual já conhecida nos projetos de concessão brasileiros é o maior alinhamento de interesses da instituição que empresta dinheiro à empresa, ou consórcio, interessada em operar a concessão com o poder concedente (Estado). Além disso, o mecanismo torna mais fácil e mais claro o direito de “step in” – quando o financiador assume, via recomposição acionária, a operação da concessão após eventual impedimento legal da concessionária.

“Cria-se um link jurídico mais expressivo entre o financiador e o governo concedente. Como tentativa de atrair investidores, brasileiros ou estrangeiros, a ideia é positiva. É um item a mais que agrega conforto a quem vai colocar dinheiro num projeto”, avalia Frederico Bopp Dieterich, sócio para a área de infraestrutura do escritório Azevedo Sette Advogados.

Representando a Andrade Gutierrez Concessões, Dieterich participou de sete projetos de concessão de aeroportos no Equador, todos com a inclusão do “direct agreement” nos contratos. “Foi uma exigência dos banqueiros, que queriam maior legitimidade junto ao Estado em relação às garantias dos projetos”, conta o advogado.

“Melhorar um elemento contratual é uma boa sinalização para o mercado, mas não é a salvação da lavoura”, afirma Dieterich. “Antes de tudo é preciso ter um bom projeto para despertar o interesse macroeconômico do financiador. Ele vai tirar o dinheiro dele dos títulos do Tesouro para investir em infraestrutura?”

Para o professor Mario Engler, coordenador do mestrado profissional da FGV Direito São Paulo, a iniciativa do governo paulista é uma tentativa de resposta à atual tendência de menor participação do BNDES no financiamento das concessões no Brasil e substituição dos tradicionais ‘players’ nas privatizações de infraestrutura, quase todos com problemas financeiros criados por complicações relacionadas à Operação Lava-Jato. “Tem tudo a ver com a Lava-Jato e o BNDES. Com o crédito mais escasso e as empresas em crise, o financiador passa a olhar menos o balanço da concessionária e mais a consistência do contrato e do projeto. Essa mudança parece um passo para melhorar o ambiente de negócios”, diz Engler.

Karla Bertocco Trindade, subsecretaria de Parcerias e Inovação, uma das áreas responsáveis pelas concessões no governo paulista, reconhece que o momento de “fragilidade institucional e macroeconômica” vivido pelo país motivou a inclusão do “direct agreement” nos futuros contratos de concessão rodoviária do Estado. Além disso, afirma ela, o governo está investindo em outras frentes para atrair recursos.

O prazo entre o lançamento do edital e a realização do leilão será de 90 dias e a modelagem dos projetos dos lotes rodoviários tem apoio do BNDES e revisão e promoção internacional do International Finance Corporation (IFC), braço privado do Banco Mundial (Bird) para projetos em países em desenvolvimento. Segundo Karla, a área de estruturação de projetos de concessão do BNDES acompanha “muito de perto” as inovações do governo paulista, e ela acredita que o banco possa participar do projeto “como financiador de uma pequena parcela dos investimentos exigidos do concessionário e como garantidor de risco.”

Em nota, o BNDES informou que sua “equipe técnica está à disposição de todos os Estados que necessitem e desejem apoio no assunto, tendo participado da modelagem de 27 projetos de concessões e parcerias público-privadas em rodovias, aeroportos, saneamento, educação, saúde, entre outros.” O comunicado assinala que “o banco pode apoiar privatizações e concessões em todos os principais segmentos de infraestrutura econômica e social.”

Os dois lotes rodoviários a serem concedidos pelo governo do Estado de São Paulo nos próximos meses cortam o interior do Estado transversalmente. O trecho Florínea-Igarapava (SP-333) tem 574 quilômetros de extensão, com uma exigência de duplicação de 201 quilômetros. Devem ser investidos R$ 3,6 bilhões ao longo dos 30 anos de concessão. O segundo lote, Itaporanga-Franca (SP-255), compreende 747 quilômetros, com 274 quilômetros previstos em duplicação e aportes de R$ 4,5 bilhões em três décadas de contrato.

Trechos dentro dos dois lotes localizados na região de Ribeirão Preto já operam com concessão que vencem em 2018. Segundo a subsecretária de Parcerias, eles entrarão no novo pacote de concessão, sendo “um ótimo incentivo para os atuais concessionários participarem dos leilões.” Para os dois projetos de privatização o governo paulista projetou uma taxa de retorno referencial de 9,83% aos vencedores dos leilões. Outros dois lotes rodoviários estão previstos para o ano que vem no calendário das concessões.

São Paulo, 1 de agosto de 2016. Brasil, página A3 ou http://www.valor.com.br/brasil/4653863/sp-altera-regra-de-concessoes-para-atrair-novos-investidores