Nova Lei de Licitações: Preparativos para o início de vigência


Nova Lei de Licitações: Preparativos para o início de vigência


Por Ivana Cota 

A Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, conhecida como a “Nova Lei de Licitações”, entrará em vigor de forma efetiva no próximo dia 1º de abril de 2023, com a revogação da Lei nº 8.666/1993 (antiga Lei de Licitações), da Lei nº 10.520/2002, conhecida como a Lei do Pregão, e dos artigos 1º a 47-A da Lei nº 12.462/2011, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC. 

Não obstante o início de sua vigência, há muitos temas objeto da Nova Lei de Licitações que, para serem aplicados, dependem da edição de decretos, portarias e/ou instruções normativas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. 

Até o momento, temas relevantes já foram regulamentados em âmbito federal, a exemplo da Portaria nº 938, de 02.02.2022, da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do então Ministério da Economia (“SEGES/ME”), que instituiu o catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, podendo, inclusive, ser utilizado por todos os entes federativos. Por meio desse regulamento, houve a instituição de modelos de editais, termos de referência, contratos padronizados e outros documentos para contratação de serviços via pregão eletrônico e mediante contratação direta. 

Considerando que a Nova Lei de Licitações prevê que as licitações serão preferencialmente realizadas sob a forma eletrônica, sendo admitida a utilização de forma presencial, desde que comprovada a inviabilidade técnica ou a desvantagem para a Administração na realização de forma eletrônica, houve a edição da Instrução Normativa SEGES/ME nº 73, de 30.09.2022, que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por menor preço ou maior desconto, na forma eletrônica, para a contratação de bens, serviços e obras, no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional.  

De acordo com o referido normativo, a licitação será realizada à distância e em sessão pública, por meio do Sistema de Compras do Governo Federal disponível no endereço eletrônico www.gov.br/compras

Ainda no contexto do processo licitatório no formato eletrônico, temos a edição da Instrução Normativa SEGES/ME nº 96, de 23.12.2022, que dispõe sobre a licitação pelo critério de julgamento por maior retorno econômico, na forma eletrônica, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, a ser adotada exclusivamente para celebração de contratos de eficiência, assim entendidos aqueles contratos que têm por objeto a prestação de serviços, realização de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar economia ao contratante, na forma de redução de despesas correntes, remunerando o contratado com base em percentual da economia gerada. 

Outro aspecto já regulamentado é a estrutura do Comitê Gestor da Rede Nacional de Contratações Públicas, responsável pela gestão do Portal Nacional de Contratações Públicas (“PNCP”), que é o sítio eletrônico oficial destinado à divulgação centralizada e obrigatória dos atos exigidos pela Nova Lei de Licitações; bem como pela realização facultativa das contratações pelos órgãos e entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todos os entes federados (Decreto n° 10.764, de 09.08.2021). 

Recentemente houve a edição do Decreto nº 11.430, de 08.03.2023, com início de vigência em 30 de março deste ano, que dispõe sobre a exigência, em contratações públicas, de que, no mínimo, 8% das vagas de mão de obra deve ser constituída por mulheres vítimas de violência doméstica, além de estabelecer sobre o desenvolvimento, pelo licitante, de ações de equidade entre mulheres e homens no ambiente de trabalho como critério de desempate em licitações. 

As vagas para as mulheres vítimas de violência doméstica incluem mulheres trans, travestis e outras possibilidades de gênero feminino e serão destinadas prioritariamente às mulheres pretas e pardas, observada a proporção na unidade da federação onde ocorrer a prestação do serviço, de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, sendo que a indisponibilidade de mão de obra com a qualificação necessária, para atendimento do objeto contratual, não caracteriza descumprimento de tais condições. 

Quanto às ações de equidade entre mulheres e homens como critério de desempate em processos licitatórios, o mencionado Decreto estabelece que elas deverão respeitar a seguinte ordem: (i) medidas de inserção, de participação e de ascensão profissional igualitária entre mulheres e homens, incluída a proporção de mulheres em cargos de direção do licitante; (ii) ações de promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento entre mulheres e homens em matéria de emprego e ocupação; (iii) igualdade de remuneração e paridade salarial entre mulheres e homens; (iv) práticas de prevenção e de enfrentamento do assédio moral e sexual; (v) programas destinados à equidade de gênero e de raça; e (vi) ações em saúde e segurança do trabalho que considerem as diferenças entre os gêneros. 

Outros temas já foram também objeto de regulamento. No entanto, há muitos aspectos que ainda aguardam regulamentação em âmbito federal, como, por exemplo, quanto às medidas a serem adotadas pelo licitante vencedor em contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto (com valor estimado superior a R$ 200 milhões). Segundo a Nova Lei de Licitações, em contratações dessa categoria, o Edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 meses, contado da celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu descumprimento. 

Outro aspecto também pendente de regulamentação se refere ao pagamento de remuneração variável aplicável ao desempenho do contratado nas contratações de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de engenharia, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazos de entrega definidos no edital de licitação. De acordo com a Nova Lei de Licitações, tal pagamento poderá ser ajustado em base percentual sobre o valor economizado em determinada despesa, quando o objeto do contrato visar à implantação de processo de racionalização, hipótese em que as despesas correrão à conta dos mesmos créditos orçamentários, na forma de regulamentação específica, até o momento não editada. 

Mais um aspecto ainda pendente de regulamentação é quanto ao sistema de gestão compartilhada, com a sociedade, de informações referentes à execução do contrato, a ser oferecido pelo PNCP. Neste aspecto, aguarda-se a regulamentação de como será a comunicação entre a população e representantes da Administração e do contratado designados para prestar as informações e esclarecimentos pertinentes. 

Outro ponto pendente de regulamentação que merece destaque é quanto aos procedimentos para verificação de ocorrência de motivos para a extinção do contrato decorrentes de situações como: (i) não cumprimento ou cumprimento irregular de normas editalícias ou de cláusulas contratuais, de especificações, de projetos ou de prazos; (ii) desatendimento das determinações regulares emitidas pela autoridade designada para acompanhar e fiscalizar sua execução ou por autoridade superior; (iii) alteração social ou modificação da finalidade ou da estrutura da empresa que restrinja sua capacidade de concluir o contrato; (iv) decretação de falência ou de insolvência civil, dissolução da sociedade ou falecimento do contratado; (v) caso fortuito ou força maior, regularmente comprovados, impeditivos da execução do contrato; entre outros. 

Todos esses temas poderão ser objeto de regulamentos editados não só pela União, como também pelo Estados, Distrito Federal e Municípios. Entretanto, a Nova Lei de Licitações indica expressamente que esses entes poderão aplicar, de forma facultativa, os regulamentos editados ou que vierem a ser editados pela União para a execução da Nova Lei de Licitações. 

Enquanto esses e outros aspectos não são regulamentados, eles terão eficácia limitada, apesar no início de vigência da Nova Lei de Licitações em 1º de abril de 2023, o que traz uma certa insegurança jurídica aos processos licitatórios que estão por vir.