Competências da próxima década: as soft skills como nova ferramenta de performance


Competências da próxima década: as soft skills como nova ferramenta de performance


“Você não pode fazer o trabalho de hoje com métodos de ontem se pretende estar no mercado amanhã”

Jack Welch

Por Ana Carolina Veloso e Fernanda Santiago 

Enquanto muitos profissionais ainda focam apenas em desenvolver habilidades técnicas para obterem melhores posições e oportunidades no mercado de trabalho, as transformações e revoluções vividas nos últimos anos demonstram a tendência mercadológica em buscar profissionais com habilidades comportamentais, também conhecidas como “soft skills”, “people skills” ou “interpersonal skills”. Muito tem se falado em “soft skills”, mas pouco se sabe sobre seu significado, como surgiram e qual a sua aplicação no atual mercado de trabalho.

Nesse cenário, nos últimos anos, diversas organizações e institutos se mobilizaram e se preocuparam em analisar e estudar os principais fatores que estão transformando o ambiente profissional e que, provavelmente, devem impulsionar ainda mais mudanças nas profissões e nas habilidades que passarão a ser mais procuradas pelo mercado de trabalho nas próximas décadas.

O “The Future of Jobs Report”, relatório bianual publicado pelo Fórum Econômico Mundial (“FEM”), trouxe em sua edição de 2018 uma pesquisa realizada pela organização com base em entrevistas com mais de 13 milhões de profissionais, de 9 grandes áreas da economia, e em 15 países com mercados emergentes e desenvolvidos. O relatório apresentou como principais fatores que impulsionaram e influenciaram as recentes mudanças nas relações de trabalho (i) o advento das novas tecnologias e da revolução digital, uma vez que a automação e a inteligência artificial têm sido priorizadas em detrimento da mão de obra humana, por executarem diversos trabalhos e funções antes executadas por pessoas e muitas vezes de maneira mais rápida e assertiva, menos burocrática e com menores custos; e (ii) as mudanças políticas e sociais ao redor do mundo, impulsionadas pelas alterações nos paradigmas e ideais da sociedade.

Diante desses fatores, não há dúvidas de que o mercado de trabalho enfrenta uma fase de profunda transição e transformação, impulsionada pelo que muitos consideram como o que seria a Quarta Revolução Industrial. Esses fatores já impactaram significativamente o mercado e as previsões para a próxima década apontam para um cenário volátil, incerto, complexo e ambíguo (VUCA – Volatility, Uncertainty, Complexity, Ambiguity). 

Os avanços na inteligência artificial e na automação terão impactos disruptivos no mercado de trabalho e nos tipos de habilidades que as empresas exigirão e valorizarão, sendo que a tendência é a procura por funcionários com habilidades sociais e emocionais mais desenvolvidas e aprimoradas – habilidades estas que a inteligência artificial e a automação não conseguem desenvolver por não serem capazes de lidar com as ambiguidades e possíveis variáveis comportamentais do mundo externo1.

Nessa linha, os profissionais que se destacarão na era da automação e da inteligência artificial são justamente aqueles que possuem características essencialmente humanas, tais como a capacidade de pensar, perguntar, negociar, solidarizar, sentir e amar, também chamadas de “soft skills”.

As “soft skills”, comumente definidas como as habilidades não técnicas que permitem que alguém interaja de maneira eficaz, empática e harmoniosa com outras pessoas, serão vitais para as organizações. Em uma classificação macro sugerida pela consultoria global McKinsey2, tais habilidades se enquadram nas seguintes categorias:

  • Comunicação e negociação;
  • Habilidades interpessoais e empatia;
  • Liderança e gerenciamento;
  • Empreendedorismo e tomada de iniciativa;
  • Adaptabilidade e aprendizado contínuo;
  • Ensino e treinamento.

Em um comparativo realizado pelo “The Future of Jobs Report”, é possível verificar a relevância que as “soft skills” adquiriram nos últimos anos, bem como as 10 principais habilidades que serão mais valorizadas no mercado de trabalho na próxima década, dentre as quais se destacam o pensamento crítico e a criatividade:

Top 10 skills

In 2020In 2015
1. Complex Problem Solving
1. Complex Problem Solving
2. Critical Thinking
2. Coordinating with Others
3. Creativity
3. People Management
4. People Management
4. Critical Thinking
5. Coordinating with Others
5. Negotiation
6. Emotional Intelligence
6. Quality Control
7. Judgment and Decision Making
7. Service Orientation
8. Service Orientation
8. Judgment and Decision Making
9. Negotiation
9. Active Listening
10. Cognitive Flexibility
10. Creativity

Fonte: Future Jobs Report, World Economic Forum

Com base nas pesquisas e levantamentos recentes, a empatia, que nada mais é que a habilidade de entender e compartilhar do sentimento de outra pessoa, é uma das “soft skills” que mais se destacará no próximo decênio, na medida em que é atualmente considerada um fator crítico de desempenho no gerenciamento de equipes. Essa habilidade terá destaque notadamente no desenvolvimento dos líderes do futuro que, para assumirem esse papel, precisarão incorporar a empatia como forma de envolver e compreender o outro, inclusive para compreender os anseios de seus liderados. Jacqueline Yumi Asano, Product Manager do Nubank, destacou, além da liderança, comunicação e do “solving problems mindset”, a empatia como uma das principais “soft skills” que precisou desenvolver para alcançar o cargo3:

“Ser líder não é algo que você crie do nada. (...) Acho que a empatia é a softskill mais importante. Se colocar no lugar da pessoa, perguntar como ela se sente, entender as expectativas de cada um com o projeto (...).”

Apesar de não ser fácil dizer com precisão quais conjuntos de habilidades serão necessários no futuro, especialmente em cargos e empregos que ainda sequer foram criados, uma coisa é certa: a demanda por trabalhos que não poderão ser automatizados crescerá vertiginosamente e se destacarão no mercado os profissionais que conseguirem desenvolver os trabalhos que dependem de características e habilidades intrinsecamente humanas – como empatia, compaixão e colaboração – habilidades frequentemente atribuídas às mulheres. 

Nessa linha, as tarefas complexas que dependem de habilidades cognitivas de alto nível, “soft skills” e criatividade, ganharão mais destaque no mercado de trabalho. Atualmente, a maioria das profissões que exige essas habilidades é composta majoritariamente por mulheres, enquanto profissões que estão sendo altamente automatizadas, tais como a engenharia e a construção, ainda são dominadas pela força de trabalho masculina. Essas mudanças, portanto, no conjunto de habilidades exigidas pelo mercado, poderão afetar mulheres e homens de maneira diferente, e, assim, transformar a dinâmica da lacuna de gênero em determinados setores, possibilitando que as mulheres tenham ainda mais espaço e oportunidades para se destacarem no mercado de trabalho.

Em um artigo escrito para o FEM, Njideka Harry, CEO da Youth for Technology Foundation, exaltou como as mulheres possuem as ferramentas e habilidades necessárias para lidar com as recentes e futuras transformações do mercado de trabalho. Segundo ela, algumas das habilidades que eram normalmente trazidas ao mercado por mulheres estão sendo reconhecidas como lucrativas e importantes, tais como a capacidade de entender o que está acontecendo com base na linguagem corporal de alguém, inteligência emocional e a capacidade de orientar pessoas. 

Ainda nesse sentido, o relatório "The CS Gender 3000: Progress in the Boardroom", emitido pelo Credit Suisse Research Institute (“CSRI”), reafirmou pesquisas anteriores que relacionam a diversidade de gênero ao melhor desempenho de diversas empresas nos mais variados segmentos. A abordagem da pesquisa permitiu uma análise do impacto da diversidade de gênero de equipes executivas de mais de 3.000 empresas, em 56 países e compreendendo 30.000 cargos executivos. A conclusão do estudo realizado pelo CSRI é simples e busca reafirmar a importância de se considerar a diversidade na gestão executiva e nas salas de reuniões: ao examinar o desempenho do preço das ações e a lucratividade relativa das empresas objeto do estudo realizado, o CSRI constatou que empresas com mais mulheres em cargos de administração, normalmente, apresentam retornos financeiros superiores.

Considerando todo esse contexto de mudança e transformação de paradigmas e ideais nas relações de emprego e no mercado de trabalho, a tendência é de que as softs skills (ou habilidades comportamentais) sejam cada vez mais valorizadas que as hard skills (habilidades técnicas), o que poderá, naturalmente, impulsionar, ainda mais, a ascensão e o destaque das mulheres no mercado de trabalho.

Sem prejuízo, para o futuro, todos os profissionais, independentemente de gênero ou colocação, deverão ter em mente a importância de aprender a ter empatia, escutar ativamente e dar e receber feedbacks. Também deverão ter em mente a importância de saber como reagir ao mundo e às pessoas, e como isso afeta as suas decisões e relacionamentos. Enfim, deverão ter em mente que essas não são as habilidades do futuro, mas sim as habilidades do presente4, e que não é exatamente a inteligência artificial que substitui empregos, é a emocional5.

1 FURLAN, João Marcelo. Se você não entende de pessoas, você não entende de negócios.” - O que um líder precisa saber sobre empatia. Disponível em: https://www.linkedin.com/pulse/se-voc%C3%AA-n%C3%A3o-entende-de-pessoas-neg%C3%B3cios-o-que-um-l%C3%ADder-furlan- - Publicado em 29.01.2020.

2 How to develop soft skills - Julie Avrane-Chopard, Jaime Potter, David Muhlmann. Publicado em 11.11.2019 – Disponível em https://www.mckinsey.com/business-functions/organization/our-insights/the-organization-blog/how-to-develop-soft-skills

3 BELTRAME, Jéssica. Mulheres na Tecnologia #1: Softskills e liderança feminina. Disponível em https://blog.umbler.com/br/mulheres-na-tecnologia-1-softskills-e-lideranca-feminina/ - Publicado em 06.03.2018.

4 ANDRADE, Clarisse. Insider Poadcast. Artigos #310. Soft Skills com Clarisse Andrade.

5 BASAGLIA, Ricardo. Diretor executivo da plataforma especializada em recrutamento Page Personnel. Disponível em https://www.napratica.org.br/ricardo-basaglia-inteligencia-emocional/ por Suria Barbosa Publicado em 30.05.2018.

Bibliografia

AVRANE-CHOPARD, Julie. POTTER, Jaime. MUHLMANN, David. How to develop soft skills -– Disponível em https://www.mckinsey.com/business-functions/organization/our-insights/the-organization-blog/how-to-develop-soft-skills - Publicado em 11.11.2019.

BELTRAME, Jéssica. Mulheres na Tecnologia #1: Softskills e liderança feminina. Disponível em https://blog.umbler.com/br/mulheres-na-tecnologia-1-softskills-e-lideranca-feminina/ - Publicado em 06.03.2018.

FURLAN, João Marcelo. Se você não entende de pessoas, você não entende de negócios.” - O que um líder precisa saber sobre empatia. Disponível em: https://www.linkedin.com/pulse/se-voc%C3%AA-n%C3%A3o-entende-de-pessoas-neg%C3%B3cios-o-que-um-l%C3%ADder-furlan- - Publicado em 29.01.2020.

MISERCOLA, Mark. Higher Returns with Women in Decision-Making Positions -  Credit Suisse – Disponível em https://www.credit-suisse.com/about-us-news/en/articles/news-and-expertise/higher-returns-with-women-in-decision-making-positions-201610.html - Publicado em 03.10.2016.

HARRY, Njideka. Will the Fourth Industrial Revolution be a revolution for women? Disponível em: https://www.weforum.org/agenda/2018/01/gender-inequality-and-the-fourth-industrial-revolution/ - Publicado em 19.01.2018.

HQ ASIA STAFF. The Soft Skills of Leadership with Lito Camacho– Disponível em http://www.hcli.org/articles/soft-skills-leadership-lito-camacho - Publicado em 21.11.2016.

The CS Gender 3000: Progress in the Boardroom. The Credit Suisse Research Institute (CSRI).

The CS Gender 3000 in 2019: The changing face of companies. The Credit Suisse Research Institute (CSRI).