Travas bancárias e seus efeitos perante a Recuperação Judicial


Travas bancárias e seus efeitos perante a Recuperação Judicial


O aprofundamento do quadro recessivo da economia brasileira ao longo de 2015, consequência da diminuição da atividade econômica e da alta do dólar, atrelado aos altos juros de mercado, fez crescer os pedidos de recuperação judicial, que visam a manutenção da empresa, tendo como consequência inicial a suspensão das ações ou execuções contra o devedor pelo prazo de 180 dias, que deverá apresentar plano de recuperação a ser aprovado pelos credores.

A regra geral é que todos os créditos da empresa que ingressa com pedido de recuperação judicial submetem-se ao plano, à exceção daqueles créditos expressamente definidos por Lei como não passíveis de novação pela recuperação, sendo este o caso das operações que gozam de garantia fiduciária.

Dentro desse cenário, surgem dúvidas a respeito das denominadas “travas bancárias”, assim chamadas as operações em que instituições financeiras disponibilizam crédito e tomam como garantia a cessão fiduciária de valores em conta corrente controlada pelo próprio banco, de modo que em caso de inadimplemento a instituição bloqueia o crédito em conta do financiado até que haja a quitação do débito.

Em vista dessa operação bancária surgiram discussões, inclusive no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, se estas garantias se sujeitam ou não à recuperação judicial, especialmente em virtude da ressalva legal de que operações fiduciárias escapam dos limites da recuperação. Atualmente, a tese prevalente no STJ é de que os bancos credores dessas operações têm seu crédito salvaguardado, mantendo-se, portanto, as condições originais da contratação, sem a novação ocasionada pela ulterior aprovação do plano de recuperação.

Entretanto, previsão extremamente importante e que merece ser avaliada, refere-se ao disposto no final do §3º do art. 49 da Lei n. 11.101/05, onde se lê que não se permite durante o prazo de suspensão a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial, vejamos: “contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6o desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial”.

Assim, independentemente da compreensão que se tenha sobre o tema, isto é, se o crédito pode ou não ser incluído no plano de recuperação, de se notar que no prazo descrito no art. 6, §4º da Lei n. 11.101/05, que justamente suspende por 180 dias as ações e execuções em face do devedor, não se pode vender ou retirar do estabelecimento bens essenciais à continuidade da atividade empresarial. Dessa feita, como não enquadrar recebíveis nesse quesito?

Com efeito, o legislador ressalta o espírito da lei ao fixar esta exceção, isto é, preocupa-se com a manutenção da empresa, como ente gerador de empregos e contribuinte de tributos, de modo que a garantia fiduciária, se relacionada a bem essencial não pode ser executada.

Tal ressalva, a nosso ver, aplica-se com maestria às denominadas travas bancárias, conquanto bloqueia recebíveis que certamente irão auxiliar a empresa na superação da crise e retomada do crescimento, sendo imprescindível que o juízo da recuperação atente-se a este fato, sob pena de se perder de vista o foco da norma.

Portanto, a despeito da compreensão que se tenha acerca da natureza das “travas bancárias” e de sua subsunção ao rito da recuperação judicial, no mínimo, deve-se suspender os efeitos da garantia outorgada à empresa em recuperação pelo prazo de 180 dias, da mesma forma que se faz com as demais execuções em face do devedor, atentando, assim, para o princípio da preservação da empresa e para o próprio espírito da lei.