Da clutch à bolsa de valores: a realidade sobre presença feminina no mercado financeiro


Da clutch à bolsa de valores: a realidade sobre presença feminina no mercado financeiro


Quem nunca viu aquela cena carregada de estereótipos em filmes e novelas em que uma mulher retratada como estressada e triste, entra num shopping e gasta rios de dinheiro na chamada “terapia de compras”? 

Essa imagem da consumista alimenta a ideia de que o relacionamento entre mulher e dinheiro é abusivo e descontrolado, gasta-se mais do que se ganha, não há conhecimento sobre economia e finanças, quando a realidade é outra: segundo estudo realizado pela pesquisadora Ana Tereza Pires, da consultoria IDados, com base em números do IBGE, em 2020, 47,5% dos lares brasileiros foram sustentados por mulheres. 

Historicamente, é verdade que as mulheres foram introduzidas no mercado financeiro bem mais tarde que os homens. Apenas a partir da década de 1960, com a introdução da pílula anticoncepcional e a possibilidade de realizar um planejamento familiar, é que surgiu a perspectiva para as mulheres se dedicarem às suas carreiras profissionais, construírem seu patrimônio e gerar renda própria.  

Desde então, a mudança no perfil do chefe de família se tornou visível: em pesquisa realizada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), verificou-se que o número de lares brasileiros chefiados por mulheres saltou de 23% para 40% entre 1995 e 2015. 

Mas, de acordo com uma pesquisa realizada pelo banco estadunidense Merrill Lynch, apesar da crescente quantidade de mulheres chefes de família, a presença de mulheres investidoras ainda é tímida - e isso se dá pela falta de confiança em seus conhecimentos sobre finanças: apenas 52% das mulheres se dizem seguras em fazer a gestão de seus investimentos.

A boa notícia é que a procura de educação financeira por mulheres tem crescido proporcionalmente. Iniciativas como a Invista Como Uma Garota e a Fin4she surgiram para se dedicar ao empoderamento feminino nas finanças. 

E os resultados já são animadores: ainda no cenário da pandemia iniciada em 2020, as mulheres se destacaram por terem dobrado sua presença na Bolsa de Valores - e não pelos gastos impulsivos comumente atribuídos à nós. De acordo com o relatório da B3, em 2019, 388 mil mulheres investiram na Bolsa. Em 2020, esse número subiu para 825 mil mulheres - representando uma movimentação de cerca de R$79 bilhões. 

E, talvez por buscarem mais informações e educação financeira antes de fazerem investimentos, elas tendem a fazer investimentos com maior convicção. De acordo com um estudo feito pela Vanguard e publicado pelo jornal Financial Times em 2020, as mulheres são mais resilientes para lidar com o mercado e têm um melhor desempenho, inclusive em períodos turbulentos, por fazerem um número menor de movimentações e pensarem a longo prazo.

Além disso, ainda pelo perfil resiliente da mulher investidora, outro estudo, feito pela Universidade de Warwick, verificou que as mulheres conseguiram um resultado melhor que o principal índice da bolsa inglesa (o FTSE 100) entre os anos analisados (2015 a 2017), e tiveram um retorno financeiro maior que os homens - 1,94% acima do FTSE 100 contra 0,14%.

Ambos os casos reforçam a importância da diversidade e inclusão de perfis diferentes para a maximização de resultados, seja em gestoras de investimentos, seja no próprio mercado. 

Mas apesar de promissor, o caminho para as mulheres ainda é longo. A desigualdade salarial permanece ainda hoje, dificultando o acesso ao mercado financeiro - em 2019, as mulheres receberam o equivalente a apenas 77% do rendimento dos homens em cargos idênticos. Essa diferença é ainda maior nos cargos gerenciais (mais informações em Who run the world? Girls? Gender Gap e os conselhos de administração). E, com salários menores, resta menos dinheiro para investir, não é mesmo?

É urgente acabarmos com esse estereótipo da mulher consumista e ressaltarmos a realidade em que a mulher seja reconhecida como financeiramente independente, responsável, bem-sucedida e confiante para investir. Nunca é tarde para começar...

REFERÊNCIAS: 

DESOTI, Carolina. Idados na Globonews: Cresce número de mulheres chefes de domicílio. IDados, 2020. Disponível em: https://idados.id/mulheres-chefes-de-familia/

IPEA. Estudo mostra desigualdades de gênero e raça no Brasil em 20 anos. IPEA, 2017. Disponível em: https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_acymailing&ctrl=archive&task=view&listid=10-

SANDLER, Carol. Número de mulheres na B3 acelera, mas o caminho ainda é longo. Disponível em: https://einvestidor.estadao.com.br/colunas/carol-sandler/numero-de-mulheres-na-b3-acelera-mas-o-caminho-ainda-e-longo 

BBC. A revolução econômica gerada pela pílula anticoncepcional. BBC News, 2017. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-40166203 

BURNFORD, Joy. Missed Opportunities: Where are the women investors? Disponível em: https://www.forbes.com/sites/joyburnford/2019/09/30/missed-opportunities-where-are-the-women-investors/?sh=1d91e1d53988

Bank Merrill Lynch. Women & Financial Wellness: beyond the bottom line. Disponível em: https://www.ml.com/women-financial-wellness-age-wave.html

BERTÃO, Naiara. A bolsa cairia menos se as mulheres fossem a maioria no mercado financeiro? Disponível em: https://valorinveste.globo.com/blogs/naiara-bertao/post/2020/04/a-bolsa-cairia-menos-se-as-mulheres-fossem-a-maioria-no-mercado-financeiro.ghtml