Receita Federal admite validade de planejamentos entre empresas do mesmo grupo com autonomia real, mas restringe adoção de regimes de tributação distintos quando há confusão operacional


Receita Federal admite validade de planejamentos entre empresas do mesmo grupo com autonomia real, mas restringe adoção de regimes de tributação distintos quando há confusão operacional


Na Solução de Consulta COSIT nº 72/2025, publicada em 15 de abril, a Receita Federal reconheceu que grupos econômicos podem manter estruturas societárias distintas e regimes de apuração diversos, desde que haja efetiva autonomia patrimonial, administrativa e operacional entre as empresas.

Segundo o entendimento, a existência de sócios comuns e atividades semelhantes não impede, por si só, a aplicação de regimes distintos como Lucro Real e Lucro Presumido, desde que a separação entre as empresas seja substancial — e não apenas formal. Essa autonomia deve estar refletida na realidade fática operacional, com estruturas próprias e gestão independente, afastando indícios de confusão patrimonial e funcional.

Entretanto, o Fisco reforçou que, na ausência dessa autonomia, poderá desconsiderar as estruturas que envolvam a fragmentação de atividades entre múltiplas empresas para reduzir a carga fiscal, ainda que haja regularidade formal nas estruturas societárias. Indícios dessa fragmentação meramente formal são o mesmo quadro societário, mesmo grupo econômico, mesmo objeto social e mesma administração.

Esse posicionamento parte da premissa de que a mera segregação formal deve ser conjugada com autonomia patrimonial, administrativa e operacional entre as empresas. Na prática, a Receita busca coibir planejamentos tributários envolvendo a segregação de atividades com o único intuito de redução de carga tributária.

No entanto, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) tem proferido decisões em sentidos distintos sobre essa matéria. Recente precedente do CARF (Acórdão nº 1401-007.372, julgado em 28/01/2025) reconheceu a validade de uma reorganização empresarial justamente em caso semelhante. Na ocasião, o Conselho afastou a autuação fiscal, reconhecendo:

  • a existência de propósito negocial legítimo e ausência de ato dissimulado;
  • a substância econômica das empresas envolvidas, autonomia financeira e operacional; e
  • e a impropriedade da metodologia fiscal adotada na lavratura da autuação pela Receita.

Segundo o CARF, a jurisprudência administrativa admite a fragmentação de atividades empresariais, ainda que exista economia tributária, desde que a segregação seja real e acompanhada de substância — com separação patrimonial, estrutura e autonomia operacional, em linha com a recente Solução de Consulta nº 72/2025. Os argumentos constantes do voto da decisão levados em consideração foram: (i) busca de aumento de eficiência, onde cada empresa está focada em determinado segmento; (ii) as atividades das empresas são distintas, embora uma forneça serviços que úteis e necessários à outra; (iii) empresas constituídas a vários anos com ativos próprios típicos e usuais do negócio; (iv) prestação de serviços para outras empresas fora do grupo econômico. Importante ressaltar que foi considerado inclusive que, embora houvesse o compartilhamento de estrutura administrativa e logística das empresas do Grupo, este fato, por si só, não teria o condão de infirmar a existência material de cada empresa.

De outro lado, o Acórdão nº 3101-003.989, de 18/12/2024, confirmou a autuação da Receita Federal ao concluir que houve simulação na segregação das atividades empresariais, com desmembramento apenas formal entre empresas que compartilhavam estruturas e operações. Já neste caso, alguns dos argumentos que levaram à manutenção da autuação pelo CARF foram: (i) as estruturas de comando são personalizadas e concentradas em um único administrador que assume posição de destaque como negociador, operador e controlador de todas as demais empresas do grupo; (ii) mesmo local de funcionamento, utilização de um mesmo conjunto de imobilizado, mesma estrutura de pessoal, mesmos fornecedores; (iii) mesmo nome fantasia em todos os contratos sociais; (iv) objeto social é o mesmo para todas as empresas; (v) mútuos sem contrato; (vi) abertura de empresas  à medida em que havia o incremento do faturamento do Grupo, demonstrando a intenção de se manter no limite autorizativo do lucro presumido; (vii) compartilhamento de despesas para minimizar o custo das atividades, contudo, sem qualquer rateio das despesas entre as empresas.

Através da análise das recentes decisões do CARF e mesmo de outras mais antigas, temos que é possível a segregação de empresas que gere um benefício fiscal. Contudo, é necessário comprovar se a organização societária não foi feita de forma artificial, nem puramente formal e simulada, para que possa ser oponível ao fisco, o que só ocorre quando da análise da situação fática.