Indicativos do futuro do mercado imobiliário


Indicativos do futuro do mercado imobiliário


Em março, o Brasil completa um ano de enfrentamento da pandemia da COVID-19 e ainda não é possível estimar tempo para estabilização dos novos casos e reflexos da doença. Atividades comerciais ameaçadas por interrupções forçadas, trabalho em regime domiciliar (home office), tímido retorno às aulas presenciais e mudanças de hábitos de consumo marcam fortemente o período e devem ainda ser responsáveis por mais mudanças, inclusive remodelando o mercado imobiliário brasileiro.

Comércio de produtos e serviços foi, sem dúvida, o segmento mais afetado nesse período. O momento é influenciado não apenas por conta das paralisações e restrições de atividades, mas pela própria mudança de hábitos dos consumidores (que provavelmente seguirão cada vez mais cautelosos e reflexivos com os seus gastos, não apenas durante, mas também depois da pandemia). Pesquisa da Nielsen, veiculada pelo SEBRAE1, indica que o consumidor converge seus gastos com produtos para a manutenção geral da saúde e bem-estar, produtos essenciais e armazenamento de alimentos e produtos de saúde, com severo aumento das compras online e diminuição das visitas às lojas.

O formato de delivery (seja por aplicativos ou não) é algo que certamente as empresas deverão se adaptar. Além disso, é possível ver que o comércio (de rua) local (em lugar de grandes centros comerciais) passou a ter maior relevância2. Nesse sentido, levantamento da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping revelou que, em São Paulo, 32% dos lojistas relataram que o faturamento caiu 90% em relação ao período pré-pandemia. Para 41% dos lojistas, o faturamento ficou reduzido em até 80%, e 24% dos empresários registraram queda de até 70%3.

Os shopping centers já entenderam que precisam de atualização: grandes grupos aceleraram projetos de e-commerce, como BR Malls e a rede Iguatemi, assim como lançaram mão de estratégia de apresentar o shopping center como um hub social, local de convivência entre pessoas, alegadamente insubstituível pela ferramenta digital4. Até mesmo as consolidadas praças de alimentação começam a ser substituídas pelo novo conceito de food halls – espaço de estar e permanecer, voltado para o mercado gastronômico, ampliando a ideia de consumo.

No segmento de escritórios de alto padrão em São Paulo, sobretudo em virtude do aumento da prática de home office, forçada pela necessidade de isolamento social, segundo pesquisa da consultoria imobiliária comercial JLL5, a taxa de vacância dos imóveis passou de 17,3% no segundo trimestre para 19,4% no terceiro trimestre e fechou 2020 acima dos 20%. A perspectiva é que a vacância nesse segmento continue a subir. Vale dizer que há capitais, como no Rio de Janeiro, que a taxa de vacância chega a 40%.

A pesquisa também mostra que mais imóveis estão sendo devolvidos ou substituídos por áreas menores – grandes empresas correspondem a cerca de 30% das devoluções -, das quais 70% deixaram o prédio e 30% reduziram a área locada. Grandes grupos tradicionais, como a companhia aérea Latam e bancos como o Itaú Unibanco, BMG e o Banco do Brasil, bem como negócios de médio porte já aderiram ao movimento.

A região das avenidas Berrini e Chucri Zaidan, que abrange também a avenida Presidente Juscelino Kubistchek e o bairro Vila Olímpia, foi a mais atingida - edifícios chegam a registrar vacância de até 50%. Fora desses limites, a vacância fica abaixo de 10%. Na Faria Lima, gira ao redor de 5%. Esse cenário impacta, no curto prazo, os fundos imobiliários que investem no segmento de escritórios na cidade, já que a possibilidade de aumento de lucro diminuiu, conforme analisa Arthur Vieira de Moraes, professor da EXAME Academy6.

Um aspecto está claro: a vida profissional no pós-pandemia vai ter um componente forte de home office. Segundo Roberto Patiño, diretor da JLL7, proprietários de prédios corporativos com grandes metragens locados para empresas de renome devem mudar de tática: cada vez mais aumenta a demanda por espaços de trabalho flexíveis e adoção do modelo de compartilhamento.

Essa mudança também reflete diretamente, com otimismo, no segmento dos imóveis residenciais, aliado à baixa taxa básica da economia. Nesse, já é possível notar, na cidade de São Paulo, o aumento significativo de lançamentos de novos edifícios residenciais – o número de novos alvarás no período é o maior desde 2000: foram 973 empreendimentos verticais autorizados, 10,4% mais que nos 12 meses anteriores8. Esse aumento deve-se também à possiblidade de reabertura dos estandes e digitalização do setor.

E não só isso, a busca por maior conforto (agora que a família está mais tempo dentro de casa) indica também aumento das negociações de imóveis de alto e médio padrão. Houve uma mudança de perfil na busca do imóvel por causa da pandemia e, até mesmo, de um movimento de interiorização. Esse aspecto pode, inclusive, orientar a esperada revisão do Plano Diretor da cidade prevista para este ano de 2021 (ainda não iniciada) – até então, estimulou-se o lançamento de estúdios e apartamentos de um dormitório, muito atrativos a investidores -, mas as necessidades mudaram.

Por conta dessa mudança, novos lançamentos começam a trazer outras configurações: grandes condomínios-clubes, com oferta de mais opções na área comum; desenho de novos formatos, com espaço para escritórios (nas unidades ou nas áreas comuns); além de áreas adaptadas para limpeza e estocagem de itens que chegam pelo comércio eletrônico.

A Pesquisa do Mercado Imobiliário, realizada pelo Secovi-SP, apurou em dezembro de 2020 a comercialização de 8.799 unidades residenciais novas na cidade de São Paulo. O resultado foi 103,2% superior comparado às vendas de novembro (4.331 unidades) e ficou 26,1% acima das 6.980 unidades comercializadas em dezembro de 20199. Também foi possível verificar aumento das negociações de imóveis usados, comercializados entre particulares.

É fato que a pandemia da COVID-19 é um marco para a sociedade contemporânea, não só do ponto de vista de saúde pública, mas também como causa de ruptura de paradigmas – setores que possuíam inovações latentes e antes rejeitadas ou engavetadas, tiveram que implantá-las para sobreviver; o home office, questionado por adeptos do padrão comando-controle e crença de que somente a presença física é sinônimo de produtividade, está forçando gestores a reverem modelos; e serviços em que a presença física era exigida precisaram se reinventar. Tais mudanças já trouxeram alterações e impactarão a sociedade e, consequentemente, o mercado imobiliário brasileiro.

Fonte: https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/Anexos/Nielsen%20-%20Impactos%20da%20COVID-19%20nas%20vendas%20de%20produtos%20de%20consumo%20de%20giro%20rA%CC%83%C2%A1pido%20no%20Brasil%20e%20ao%20redor%20do%20mundo.pdf.pdf.pdf

2 Fonte: https://lab.fecomercio.com.br/wp-content/uploads/2020/09/ebook-transitorio_APROV_final.pdf

3 Fonte: https://exame.com/especiais/impacto-da-covid-19-shopping-do-futuro-nao-tem-area-de-alimentacao-lotada/

4 Fonte: https://exame.com/bussola/multiplan-o-shopping-e-um-hub-social-e-nada-substitui-essa-experiencia/

5 Fonte: https://www.jll.com.br/content/dam/jll-com/documents/pdf/research/FirstLook_Escritorios_SP_AA_A_2T2020.pdf

6 Fonte: https://economia.uol.com.br/noticias/estadao-conteudo/2021/02/15/apos-onda-de-devolucoes-total-de-escritorios-disponiveis-em-sp-sobe-50.htm

7 Idem anterior.

8 Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/10/numero-de-novos-predios-autorizados-na-capital-paulista-bate-recorde.shtml

Fonte: https://www.secovi.com.br/downloads/pesquisas-e-indices/pmi/2020/arquivos/202012-pmi.pdf