Risco de fraude frente às alterações introduzidas pela Lei nº 13.097/2015


Risco de fraude frente às alterações introduzidas pela Lei nº 13.097/2015


Resumo: Avaliando de relance, a Lei nº 13.097/2015 intenta simplificar as operações imobiliárias, atribuindo total presunção de boa fé ao adquirente no caso de ausência de anotações na matrícula do imóvel, não havendo a necessidade de outras buscas. Contudo, o assunto não se revela tão simples assim, pois a própria Lei dá azo a brechas, questões e dúvidas ainda a serem visitadas pelo Poder Judiciário.

Assim, pelo menos enquanto não consolidado entendimento a respeito da abrangência e aplicação da Lei, entendemos que devem ser mantidas as auditorias para operações imobiliárias, a fim de afastar os riscos de declaração de ineficácia, invalidade ou inexistência, por aqueles que pretendem adquirir ou receber imóveis em garantia.

Para aqueles que detêm potencial direito, certamente há se ser feita a (solicitação de) averbação de indicativo da existência de ação no registro de tantos bens quantos forem necessários, para evitar maiores prejuízos.

A Lei nº 13.097, de 20 de janeiro de 2015, trouxe alterações relevantes para o mercado imobiliário ao introduzir critérios e relação de documentos que servirão de baliza ao Poder Judiciário na avaliação de cada caso, bem como os critérios para configuração da boa-fé das partes envolvidas no negócio imobiliário. Contudo, como se verá adiante, dita norma possui alguns pontos suscetíveis de questionamentos que dificultam, ou até obstam, sua aplicação prática na integralidade.

Nessa linha, a Lei reforça a já consolidada Súmula STJ 375 e, nos termos de seu artigo 54, dispõe que: “os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel”, assim considerados quaisquer indicativos de ônus e restrições, medidas de constrições, indisponibilidade e ações judiciais (reais/pessoais reipersecutórias ou não).

Esse artigo da Lei resume a essência do princípio da concentração: a matrícula deve tornar pública a universalidade de assuntos relativos ao imóvel. Assim, todas as ações, inclusive aquelas de conhecimento, podem (e devem) ser averbadas.

Vale frisar que referido artigo da Lei não se aplica aos casos de falência e recuperação judicial (artigos 129 e 130 da Lei nº 11.101/2005), bem como aos débitos (fiscais) inscritos em dívida ativa. Da mesma maneira, situações como usucapião, acessão, desapropriação ou direito de preempção não estão abrangidas pela Lei. Contudo, para todas as demais medidas judiciais, ainda que não tratem, diretamente, da eficácia no negócio, deve ser aplicado o quanto disposto na Lei.

Há quem defenda existir contrariedade entre o Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e a Lei em comento, uma vez que o inciso IV do artigo 792 do novo livro de procedimentos, que trata de outros tipos de ações com capacidade de reduzir o devedor a insolvência, não prevê expressamente a necessidade de indicativo no registro do bem. A nosso ver, todavia, esses dois diplomas não podem ser avaliados separadamente, sendo clara a recepção do princípio da concentração pelo Novo Código de Processo Civil, a exemplo do disposto no inciso IX do artigo 799 e no artigo 844, bem como a referência na Lei ao inciso II do artigo 593, do antigo código de ritos (atual inciso IV do artigo 792).

De qualquer forma, pairam outras dúvidas quanto à efetividade do inciso IV do art. 54 da Lei, já que a averbação da ação que possa conduzir o proprietário à insolvência, não é (ou não será) automática, diversamente do que ocorre nos casos de execução contra devedor solvente (artigo 799 do Novo Código de Processo Civil). Além disso, a averbação dessas ações recairá, preferencialmente, sobre imóveis indicados pelo proprietário-devedor e restringir-se-á a quantos bens forem suficientes para garantir a satisfação do direito objeto da ação (art. 56, parágrafo 4º da Lei), suscitando eventual supressão (maliciosa) de bens de maior valor proprietário-devedor ou, ainda, desencaixe do valor dos imóveis “suficientes para garantir a satisfação do direito” em relação à provável evolução do débito.

Vale mencionar que referida averbação, ao depender da subjetividade e discricionariedade do Poder Judiciário, poderá negada ou autorizada tardiamente, casos em que o credor poderá experimentar os trágicos efeitos da fragilidade ao princípio da concentração, ficando à mercê das brechas e diante da ausência de outros meios para satisfação de seu crédito.

Também é importante dizer que ainda não é possível afirmar como a Lei será recepcionada pelos Tribunais especializados, como a Justiça do Trabalho. Nessa seara, há julgados a favor e contra o intuito da Lei, em que pese verificarmos uma ligeira tendência a se reconhecer como detentor da boa-fé o terceiro adquirente que teve a prudência de avaliar as certidões e verificar que não havia qualquer indicativo que desaconselhasse à operação, voltando-se ao conceito da diligência do homem-médio.

Dessa maneira, a Lei não alcança totalmente a efetividade esperada: de que a inexistência de anotação na matrícula do imóvel significa total presunção de boa fé do adquirente, não havendo a necessidade de outras buscas. Portanto, enquanto não consolidado entendimento a respeito da abrangência e aplicação da Lei nº 13.097/2015, aconselhamos a manutenção das auditorias para quaisquer operações imobiliárias, a fim de afastar os riscos de declaração de ineficácia, invalidade ou inexistência, por aqueles que pretendem adquirir ou receber imóveis em garantia, bem como recomendamos a (solicitação de) averbação de indicativo da existência de ação no registro de tantos bens quantos forem necessários, para aqueles que possuem medida judicial em curso.

A equipe especializada em Direito Imobiliário do Azevedo Sette encontra-se à disposição dos seus clientes para auxiliar na realização dessas auditorias, implementação jurídica das operações imobiliárias e assessoramento nas questões processuais relacionadas.