Restrições do Cade e mudanças no Fies geram oportunidades para o mercado de educação


Restrições do Cade e mudanças no Fies geram oportunidades para o mercado de educação


Instituições que ainda não expandiram suas atividades podem realizar aquisições estratégicas para obter cobertura nacional

Por Paula Dume

O endurecimento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em relação às fusões e aquisições que geram concentração de mercado e as novas regras do Fies (Fundo de Financiamento Estudantil) podem ter gerado instabilidades, mas não irão desaquecer o mercado de M&A no setor educacional. Para especialistas, o momento é de oportunidades na área.

Segundo Joamir Müller Romiti Alves, advogado do Pinheiro Neto Advogados que atua na área de educação, esse quadro turbulento aliado a importantes limitações de repasses no Fies geram incertezas para as instituições menores, porém cria oportunidades para as maiores realizarem aquisições estratégicas.

“O Cade deixou claro que não é favorável a concentrações excessivas em determinadas regiões, mas tem espaço para outras transações acontecerem sem que isso seja um problema do ponto de vista concorrencial. Existem muitas instituições que atuam em certas localidades e que ainda não expandiram suas atividades de uma forma nacional”, explica.

Após 390 dias de negociações, a fusão entre as gigantes Kroton e Estácio, que atingiu uma audiência quase televisiva, foi vetada pelo Cade no dia 28 de junho por 5 votos a 1. De acordo com os conselheiros da autarquia, a operação formaria uma companhia com valor de mercado de cerca de R$ 30 bilhões e com 1,5 milhão de alunos. Por conta disso, outros grandes grupos educacionais começaram a ir às compras para não serem engolidos. Com o impacto do corte nos financiamentos do Fies, donos de instituições de porte menor querem vender suas empresas.

Ana Paula Terra Caldeira, sócia da área de M&A do Azevedo Sette Advogados, atribui à outra transação o movimento de consolidações no segmento educacional. A advogada conta que, em 2014, o Cade impôs algumas restrições para a fusão da Kroton com a Anhanguera e isso provocou a venda de alguns ativos da empresa. Consequentemente, as instituições menores começaram a se concentrar para comprar esses ativos que estavam à venda naquele ano.

“Todo movimento de consolidação tende a diminuir o número de concorrentes. Não vejo como negativa a consolidação, desde que não provoque um efeito danoso para o mercado, seja ele político ou econômico. Uma consolidação pode trazer uma série de benefícios para o consumidor”, avalia a sócia.

Mercado irrestrito

Em agosto de 2016, a consultoria PwC divulgou uma lista com os dez principais grupos que investiram e se destacaram no mercado de educação de 2007 a 2013 no país. Dentre eles, estavam a Actis (empresa britânica de private equity), Kroton, Anhanguera, BR Investimentos, DeVry (empresa norte-americana que opera diversas faculdades sem fins lucrativos), GP Investimentos, Estácio, Kinea, Laureate e Pátria Investimentos (empresa nacional de private equity).

Joamir, do Pinheiro Neto, defende que o setor de educação sempre foi propício para operações de M&A, porque o comprador pode adquirir uma instituição que possua credenciamentos exigidos pelo Ministério da Educação (MEC) em determinada região e começar a operar imediatamente naquela localidade. “Em vez de esperar anos para conseguir o credenciamento, a empresa funciona rapidamente através de um M&A. É um dos fatores que estimulam as empresas a partirem para essas operações”, detalha o advogado.

Para a sócia de M&A do Azevedo Sette, educação é um “setor-chave de desenvolvimento”, porque o governo tem interesse em financiar e tem potencial para ser intensificado diante de dois fatores: tecnologia e aumento da procura de cursos, seja por financiamento ou por EAD.

No entanto, Rodrigo Zeidan, professor da New York University Shanghai e da Fundação Dom Cabral, ressalta que a baixa qualidade de ensino ainda persiste e as empresas continuam oferecendo produtos ruins para os alunos. “A regulação do MEC é diferente da do Fies, e a baixa qualidade de ensino para o aluno persiste”, analisa.

Condições negociáveis

Quando as instituições vão às compras, consideram alguns fatores enquanto sondam a target, como finalidade e localidade da empresa, cursos autorizados ou reconhecidos pelo MEC, número de alunos matriculados e seu ticket médio, porcentagem de alunos financiados pelo Fies/Prouni, corpo docente e técnico-administrativo, entre outros.

Ana Paula, do Azevedo Sette, destaca que a forma de financiamento é uma questão muito analisada na due diligence e na valuation da empresa, porque é dali que virá a receita. Por outro lado, Joamir lembra que a questão da complementação geográfica também deve ser considerada, porque possibilita a criação de novos cursos e o oferecimento de outros em lugares nos quais a instituição ainda não opera. Há casos em que o objetivo é ampliar o portfólio de marcas, de acordo com o advogado do Pinheiro Neto.

O ponto comercial também é um fator importante. Ter o direito de continuar operando naquele local gera muito valor e sempre é negociado. Joamir explica que é extremamente comum que um dos documentos acessórios ao contrato de compra e venda seja um de locação de longo prazo, de 10 a 40 anos, para garantir a utilização dos pontos de negócios.

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