Lei Anticorrupção gera dúvidas nas empresas


Lei Anticorrupção gera dúvidas nas empresas


Novas regras, baseadas na legislação dos EUA, representam mudanças significativas no sistema jurídico brasileiro

Em vigor há exatamente um ano, a Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção Brasileira, embora seja considerada uma boa e moderna lei pela maioria dos especialistas, ainda aguarda por regulamentação e traz uma série de dúvidas para as empresas. Na prática, dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas por atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. A Lei Anticorrupção representa uma mudança significativa no sistema jurídico brasileiro. Inspirada principalmente nas leis norteamericana e inglesa, segue uma tendência mundial de combate à corrupção.

Aprovada no calor das manifestações de junho de 2013, a lei também visa atender normas internacionais pactuadas pelo Brasil, tais como as convenções de combate à corrupção no âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Em evento do Comitê de Legislação da Amcham Regional Minas Gerais, os especialistas Ordélio Azevedo Sette, sóciofundador da Azevedo Sette Advogados; e Leonardo Estrela Borges, professor de direito e membro da Câmara Jurídica do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) destacaram a complexidade da lei que, como ainda não foi regulamentada, apresenta brechas e incoerências que podem inviabilizar a sua completa e melhor aplicação.

“A Lei Anticorrupção é mal escrita e foi aprovada a toque de caixa, embora tenha passado por um longo processo de criação. inegável, porém, a sua importância. Ela vem responder demandas internas e externas e tem como grande mérito colocar em discussão a responsabilidade das empresas nos processos de corrupção no Brasil. Não sei se somente a regulamentação será capaz de sanar os problemas e acabar com as dúvidas, porém estamos melhor com a lei do que sem ela”, explica Borges.

“Devemos entender que essa lei penaliza a pessoa jurídica e que, apesar das incoerências, é uma lei importante para o país. A partir dela temos um novo marco para refletir a respeito e deixarmos de ser o país da corrupção para sermos o do combate à corrupção. A responsabilidade solidária, em que cada empresa tem responsabilidade sobre os atos de corrupção realizados pelos seus prepostos faz com que cada empresário tome conta da cadeia produtiva que integra”, destaca Sette.

Necessidade

A mesma avaliação faz o presidente do Comitê de Legislação da Amcham em Minas Gerais, Antonio Chaves Abdalla, que vê no combate à corrupção uma necessidade mundial. “Onde existe corrupção, não existe livre iniciativa. Esse trabalho precisa ser forte e fortalecido em todas as instâncias. Este é um momento especial no Brasil, em que toda essa insatisfação popular externada desde 2013, a comoção em torno da Operação Lava jato, entre outros fatores, nos impõem a necessidade de uma nova ordem. A lei vem abrir um espaço para a reflexão. Não podemos admitir que ser honesto seja um diferencial. Precisa ser uma obrigação”, afirma Abdalla.

Falta de regulamentação dá margem a interpretação

A Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção Brasileira, responsabiliza administrativa e civilmente pessoas jurídicas por atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Ela coloca sobre as empresas responsabilidade solidária sobre ações de corrupção praticadas por prepostos, como empresas coligadas e prestadoras de serviço.

A carência de regulamentação, mesmo após um ano da entrada em vigor e um ano e meio da aprovação, tem gerado uma série de dúvidas e dado margem à diferentes interpretações. De acordo com o sóciofundador da Azevedo Sette Advogados, Ordélio Azevedo Sette, esse é um problema grave que atinge especialmente as médias e pequenas empresas. “A lei é para todas as empresas, porém as grandes têm departamentos jurídicos bem montados e política de compliance estabelecida. As menores devem procurar suas entidades e associações. Palestras e cursos são formas de disseminar a informação e abrir espaço para a reflexão”, indica Sette.

Boas práticas

A implantação de uma política de compliance pelas empresas é um passo decisivo para o combate a corrupção. Porém, esse é um processo longo e de alto custo. Pequenas e médias empresas via de regra têm dificuldades na implantação dessa política. “Além dos custos, para as empresas menores o próprio tempo é um fator limitador. Elas são muito absorvidas pela atividade produtiva. Nesses casos a postura da alta gestão ganha ainda mais peso. Uma empresa é a cara do dono”. Se ele coloca, desde o início, um código de postura evidenciado pelo exemplo, é muito provável que a empresa se desenvolva com uma postura ética e responsável”, avalia o sóciofundador da Azevedo Sette Advogados.

Mesmo incompleta, a nova obrigação tende a abrir um novo tempo para a imagem do Brasil no exterior. Segundo o professor de direito e membro da Câmara Jurídica do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), Leonardo Estrela Borges, o combate à corrupção é uma necessidade mundial e o Brasil pode alcançar um protagonismo principalmente junto aos nossos vizinhos, que são grandes parceiros comerciais. “Já que a lei também alcança os atos cometidos fora do país, e as empresas brasileiras têm negócios em todos os lugares, ela terá um alcance ampliado”, afirma Borges.

Daniela Maciel
Diário do Comércio