Usucapião Extrajudicial | A consolidação da desburocratização


Usucapião Extrajudicial | A consolidação da desburocratização


Por Aline Augusto Franco e Alessandra Ganz

Após quase cinco anos da inovação em admitir pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião de bens imóveis e pouco mais de três anos da alteração que revolucionou o novo modelo, a usucapião extrajudicial hoje pode ser considerada a consolidação de mais uma medida que veio a tentar desafogar o Poder Judiciário e reduzir o tempo de expectativa e espera para regularização imobiliária.

A usucapião é modo originário de aquisição da propriedade, que se dá pela posse prolongada da coisa, de acordo com os requisitos legais, podendo servir para adquirir bens móveis ou imóveis. Ela pode ser classificada como extraordinária, ordinária ou especial. Cada uma dessas espécies possui requisitos próprios, elencados nos artigos 1.238 a 1.244 do Código Civil. 

Até antes do advento do (novo) Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), o processamento da usucapião dava-se exclusivamente pela via judicial. Apenas com a sentença declaratória, o possuidor passava a ser considerado proprietário do imóvel, sendo este o único título passível de registro no Cartório de Registro de Imóveis para regularização da titularidade do imóvel nesse âmbito.

O (novo) Código de Processo Civil inaugurou, contudo, outra alterativa, possibilitando ao interessado buscar o reconhecimento da propriedade pelos Oficiais dos Cartórios de Registros de Imóveis, sem precisar recorrer ao Judiciário – porém, sempre necessariamente assistido por advogado. Este procedimento é denominado usucapião extrajudicial.

Contudo, a redação original do parágrafo 2º do artigo 216-A da Lei de Registros Públicos, trazida pelo (novo) Código de Processo Civil, previa que, se a planta do imóvel não tivesse a assinatura de qualquer um dos titulares tabulares (constantes da matrícula) de direitos reais, estes seriam notificados pelo Oficial do Cartório para manifestar seu consentimento em 15 (quinze) dias, sendo interpretado o silêncio como discordância. Por razões óbvias, esse procedimento emperrava a celeridade e a eficiência do novo procedimento, visto que o paradeiro do proprietário tabular muitas vezes sequer era conhecido.

Assim, houve a edição da Lei nº 13.465/17. Dentre vários temas, o dispositivo legal alterou o parágrafo 2º do artigo 216-A da Lei de Registros Públicos, passando a admitir o silêncio do proprietário tabular como concordância expressa aos termos da usucapião requerida. Entre tantas discussões e críticas à nova lei, esta alteração foi, sem dúvida, muito assertivo.

À luz desse novo procedimento, para regulamentação do tema em âmbito nacional, a Corregedoria Nacional de Justiça editou Provimento nº 65/2017. Para regulamentação no Estado de São Paulo, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo também editou provimentos (CGJ 58/2015, CGJ 19/2017 e CG 51/2017) em linha com a legislação atual.

Quanto ao procedimento em si, o primeiro passo, como no procedimento judicial, é reunir informações e documentos suficientes para demonstrar o tempo da posse ininterrupta que se que o interessado exerce no imóvel. Com isso, é possível definir se há e qual é a modalidade de usucapião a ser requerida.

Após, deverá realizar, em Cartório de Notas do município da localidade do imóvel usucapiendo, Ata Notarial que deverá atestar o tempo de posse do requerente e seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias. A ata notarial é apenas um instrumento público, formalizado por um Tabelião, com base na narrativa e naquilo que verificou por seus próprios sentidos, sem emissão de opinião, juízo de valor ou conclusão – a ata notarial não pode ser entendida como a certificação pelo Tabelionato de Notas da veracidade do fato descrito pelo interessado (potencial proprietário).

Dotado da Ata Notarial e representado por advogado, o interessado deverá apresentar, no Registro de Imóveis competente, requerimento demonstrando seus argumentos, acompanhado dos demais documentos necessários a comprovar a veracidade de suas alegações (planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de Anotação de Responsabilidade Técnica no respectivo Conselho de fiscalização profissional, e pelos titulares de direitos reais e outros direitos anotados na matrícula do imóvel usucapiendo e matrícula dos imóveis confinantes; certidões dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente; justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre o imóvel, etc).

O Cartório de Registro de Imóveis, então, avaliará a documentação, pedindo, caso necessário, complementação ou esclarecimentos. Se forem suficientes os documentos apresentados e Oficial do Registo de Imóveis entender que o pedido tem condições de ser processado (análise , os titulares tabulares do imóvel usucapiendo e dos confrontantes que não tiverem expressamente consentido com o pedido do interessado (o que pode se dar pela assinatura na planta/memorial ou por documento autônomo), serão então notificados do pedido para apresentarem eventual oposição. 

Os notificados têm prazo de 15 (quinze) dias para impugnar o pedido de usucapião, que deverá ser feito expressamente perante o Cartório de Registro de Imóveis. Em caso de impugnação, o Oficial do Registro de Imóveis fará avaliação, tentará conciliar eventuais conflitos (conforme Provimento CNJ nº 65/2017), devendo, se infrutífera a conciliação, remeter a questão para análise e decisão pelo Poder Judiciário. Nesse momento, há a transformação da usucapião extrajudicial em judicial. Como exposto acima, ressalta-se que a falta de resposta do proprietário tabular passou a ser considerada presunção de anuência, seguindo o procedimento favoravelmente ao requerente.

Além dos envolvidos, os entes políticos (União, Estado e Município) também deverão se manifestar, no mesmo prazo, acerca de eventual interesse ou oposição à usucapião pretendida (pois bens públicos não são passíveis de usucapião). Nesse caso, a falta de manifestação não gera presunção de concordância, exatamente pela imprescritibilidade dos interesses que defendem. Ao final do processo, sanadas todas as pendências, o Oficial registrará a titularidade do imóvel em nome do requerente.

Assim, quando comparada ao rito judicial, a usucapião extrajudicial é mais vantajosa pelo fato de ser mais célere. E nesse sentido, as leis em comento demonstraram eficácia na execução da tendência de desjudicialização do Direito Brasileiro. 

A equipe especializada em Direito Imobiliário do Azevedo Sette Advogados encontra-se plenamente capacitada a assessorar os seus clientes no pedido de usucapião extrajudicial, desde a avaliação da documentação para verificação do possível pedido de usucapião, até o registro da aquisição no competente cartório de registro de imóveis.