STF inicia análise das liminares que suspenderam o compartilhamento de dados das Teles com o IBGE


STF inicia análise das liminares que suspenderam o compartilhamento de dados das Teles com o IBGE


Prossegue hoje no plenário do Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento, na tarde de ontem (06.05.2020), dos referendos de liminares concedidas em um conjunto de cinco ADIns - Ações Diretas de Inconstitucionalidade, propostas em face da Medida Provisória nº 954, de 17 de abril 2020, que estabeleceram a disponibilização das bases de dados de Operadoras de Telefonia Fixa (ou Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC) e de Comunicações Móveis (ou Serviço Móvel Pessoal – SMP), com relação a nomes, números de telefone e endereços de seus usuários, à Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para que, no período da pandemia do coronavírus (Covid-19), as estatísticas oficiais produzidas pela instituição possam ser formuladas a partir de entrevistas não presenciais, preservando a integridade física de seus pesquisadores. A discussão sobre o referendo das liminares caracteriza importante capítulo na história da formação do arcabouço legal e jurisprudencial da privacidade e proteção de dados pessoais no Brasil, mormente em um cenário de tentativas de postergação da vigência da LGPD

A ministra relatora Rosa Weber reafirmou a concessão de liminar para suspender a MP, nos termos da decisão monocrática proferida em 24.04, uma vez que a MP não teria delimitado o objeto da estatística a ser produzida com a disponibilização dos dados, nem sua finalidade específica e amplitude. Reiterou que as condições em que se daria o tratamento de dados pessoais digitalizados por agentes públicos e privados consistem em um dos maiores desafios contemporâneos e que o os dados dos usuários de Telecomunicações são, em seu cerne, dados pessoais, porquanto estejam relacionadas à identificação efetiva ou potencial de pessoa natural, e integram, nessa medida, o âmbito de proteção das cláusulas constitucionais assecuratórias da liberdade individual, da privacidade e do livre desenvolvimento da personalidade, nos termos do artigo 5º, caput, inciso X e XII, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Em complemento, enunciou, como fundamentos específicos da disciplina de proteção de dados pessoais, o respeito à privacidade e a autodeterminação informativa positivados no artigo 2º da LGPD. 

Destacou também a relatora que a ausência de garantias de tratamento adequado e seguro dos dados compartilhados com o IBGE agravar-se-ia pela circunstância de que, embora aprovada, ainda não está em vigor a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, definidora dos critérios para responsabilização de agentes por eventuais danos ocorridos em virtude do tratamento de dados pessoais. Indo adiante, a ministra realizou acréscimos à decisão proferida em 24.04 para constar que a coleta de dados seria excessiva ao estritamente necessário para o atendimento da finalidade declarada, ao permitir que, no prazo de 30 dias após a decretação do fim de situação de emergência de saúde pública, os dados coletados ainda sejam utilizados para produção de estatística oficial. A ministra, em seguida, fez referência à notícia divulgada no site do IBGE, referente à pesquisa da “PNAD Covid” com uma amostragem de pouco mais de 190 mil domicílios, como fato que evidenciaria, por si só, a desnecessidade e o excesso do compartilhamento de dados tal como disciplinado na MP nº 954/2020. Destacou, ainda, que a desproporcionalidade no tocante ao universo dos dados a serem disponibilizados, com base na MP nº 954, seria agravado pela ausência de previsão, no respectivo ato normativo, de cuidados mínimos para a anonimização ou para a pseudoanonimização dos dados disponibilizados, e tampouco contemplaria as garantias de tratamento de forma segura.

As ações foram ajuizadas pelo Conselho Federal da OAB (ADI 6387), pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB (ADI 6388), pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB (ADI 6389), pelo Partido Socialismo e Liberdade – PSOL (ADI 6390) e pelo Partido Comunista do Brasil – PCB (ADI 6393) e representam um marco na normativa de proteção de dados no Brasil, uma vez que possibilitam levar à discussão, à mais alta Corte de Justiça do país, parâmetros constitucionais de proteção de dados em consonância a dispositivos enunciados na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - LGPD. O plenário do STF retoma o julgamento nesta quinta-feira, 07.05.2020.

Os argumentos narrados acima decorrem de oitiva da sessão de julgamento e o teor do voto da ministra Relatora pode ser acessado no site do Supremo Tribunal Federal.