Por que o setor de infraestrutura precisa de mulheres?


Por que o setor de infraestrutura precisa de mulheres?


Por Bruna Bouissou, Ana Beatriz Franzero e Victoria Almeida

Atualmente, não mais se questionam os benefícios gerados pela formação de equipes diversificadas e ambientes de trabalho inclusivos, já que é grande o número de estudos que demonstram que tais fatores estão diretamente relacionados com o aumento da produtividade e com o sucesso de empreendimentos, projetos, programas ou planos.

O estudo Economic Gains from Gender Inclusion: New Mechanisms, New Evidence1, divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), concluiu que a “adoção, pelas empresas, de uma estratégia baseada em inovação e inclusão de gênero impacta positivamente no valor do empreendimento".

A participação feminina no setor, portanto, deve ser vista como agregadora, vez que, além do potencial de ganho econômico propiciado ao empreendimento, introduz a pluralidade de perspectivas e uma nova gama de habilidades, justamente em face da diferente abordagem que homens e mulheres apresentam em relação ao risco e à colaboração interpessoal. Neste sentido, o estudo aponta que “diferenças de gênero no trabalho podem influenciar um número de fatores. Mulheres tendem a ser mais adversas ao risco, o que evidencia uma maior preocupação com resultados negativos (Croson and Gneezy 2009)2“ e, por consequência, podem contribuir para projetos mais equilibrados e mitigar riscos de resultados negativos em projetos. 

Contudo, e em que pese o contexto benéfico da diversidade de gênero, há, no mercado de trabalho, uma silenciosa segregação ocupacional com base no gênero, de modo que os estereótipos fazem com que algumas profissões sejam associadas tradicionalmente ao homem ou à mulher. Os homens, via de regra, são relacionados às ocupações técnicas e de alto grau de complexidade, enquanto as mulheres acabam por serem direcionadas aos setores relacionados às relações e aos cuidados humanos. Tanto é assim que, no âmbito da Administração Pública brasileira, o percentual de mulheres ocupando cargos em ministérios sociais, como educação e saúde, é mais elevado em relação à porcentagem das que atuam em órgãos referentes à economia e infraestrutura3

Em estudo conduzido em 2018 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), verificou-se que dentro da população estudantil feminina mundial na educação superior, apenas 30% optam por cursos de graduação relacionados à ciência, tecnologia, engenharia e matemática4

O setor de infraestrutura não escapa do padrão, sendo automaticamente associado aos homens. A falta de representatividade em reuniões, na liderança de projetos e de reconhecimento em seminários e palestras são apenas algumas das inúmeras formas de segregação que as mulheres – igualmente competentes e preparadas – enfrentam na área, o que evidencia ainda haver falhas na valorização do trabalho feminino nesse setor. 

Mesmo diante de condições adversas, o número de mulheres atuantes no setor de infraestrutura vem aumentando gradativamente. Tanto em âmbito nacional quanto no internacional são crescentes as iniciativas de fomento e de inserção do gênero feminino na área, e acreditamos que o setor só tem a ganhar. 

A Organização das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres (ONU Mulheres) firmou, em 2019, acordo com o Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos (UNOPS), cujo objetivo é fortalecer a colaboração entre as partes no que tange à atuação no fomento à paridade de gênero no campo da infraestrutura. Desde março de 2019, por exemplo, perdura a campanha digital “Mulheres na Infra, Infra para Mulheres”, que tem como intenção destacar a atuação das profissionais no setor.

Tradicionais associações também estão abrindo espaço para o debate sobre a igualdade de gênero na área em comento. Em dezembro de 2019, a Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias Base (ABDIB) promoveu a palestra “Mulheres na Infraestrutura: porque a presença delas importa”, na qual renomadas advogadas discorreram sobre (i) a presença feminina como fator competitivo, (ii) a inserção da mulher no mercado de infraestrutura e (iii) o impacto da liderança feminina na agenda setorial. 

Há que se mencionar, igualmente, a forte atuação do Infra Women Brazil, grupo composto exclusivamente por mulheres e que se destina ao debate e à promoção do protagonismo feminino na infraestrutura. Destaca-se que, em dezembro de 2019, as integrantes chegaram a participar do podcast Infracast, oportunidade na qual trouxeram visibilidade à notória desigualdade existente no setor.  

A seu passo, o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), iniciativa do Governo Federal para alavancar o setor de infraestrutura brasileiro, conta, desde o ano passado, com uma mulher à frente da Secretaria Especial. Isso representou um passo significativo a favor da paridade de gênero e encoraja a diminuição da hegemonia masculina nos cargos de chefia dos projetos e programas do setor. 

Também não são escassas as iniciativas no âmbito internacional: 

Em 2019, Londres e Auckland sediaram, respetivamente, o Women In Infrastructure Forum e o 3rd Women in Construction, Infrastructure & Engineering Leadership Summit, que se pautaram na discussão sobre os meios de aumento da atuação feminina na área, bem como no incentivo à ocupação de postos de liderança, preponderantemente ocupados por homens.

Em 2017, houve a fundação do Women in Infrastructure, Development and Energy (WINDE), grupo africano integrado por mulheres que trabalham no campo da infraestrutura e que se destina a incentivar a inserção feminina, oferecendo, por exemplo, cursos de capacitação para o atendimento das demandas e das especificidades mercadológicas.

As mulheres estão se unindo, tanto para serem efetivamente inseridas no setor de infraestrutura quanto para alavancá-lo, dado o indubitável potencial agregador da força de trabalho feminina. A pluralidade e o equilíbrio de gêneros no ambiente de trabalho contribuem para o desenvolvimento de projetos mais balanceados e para mitigar resultados negativos, o que, consequentemente, aumenta a perspectiva de obtenção de ganhos econômicos e contribui para crescimento – tão esperado – da área e dos investimentos no setor. 

Nós, mulheres da Infraestrutura, uma equipe com grandes profissionais em posições estratégicas de atuação, continuaremos a trabalhar e contribuir para um cenário cada vez mais livre de preconceitos e segregação, mantendo nossos valores como o respeito e plena integração feminina no setor. Que isso se multiplique!


1 Ostry, Jonathan David; Alvarez, Jorge; Espinoza, Raphael A.; Papageorgiou, Chris. Economic Gains from Gender Inclusion: New Mechanisms, New Evidence. Staff Discussion Notes. International Monetary Fund. 2018. Disponível em: <https://www.imf.org/en/Publications/Staff-Discussion-Notes/Issues/2018/10/09/Economic-Gains-From-Gender-Inclusion-New-Mechanisms-New-Evidence-45543>. Acesso em 27 de fevereiro de 2020.

2 Id. Tradução livre de “Gender differences in work may reflect a number of factors. Women have been found to be more risk averse, reflecting greater fear of negative outcomes (Croson and Gneezy 2009)” .  

3 Rezende, Daniela Leandro. Mulher no poder e na tomada de decisões. Ipea. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/190215_tema_g_mulher_no_poder_e_na_tomada_de_decisoes.pdf>. Acesso em 27 de fevereiro de 2020.

4 Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000264691. Acesso em 27 de fevereiro de 2020.