Ofício Circular SEI nº 1.088/2020/ME: Orientações gerais, teletrabalho e proteção de dados


Ofício Circular SEI nº 1.088/2020/ME: Orientações gerais, teletrabalho e proteção de dados


Em resposta aos efeitos provocados nas relações trabalhistas, em decorrência da pandemia da COVID-19, a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), da Secretaria de Trabalho, publicou, na última sexta-feira, dia 27.03.2020, o Ofício Circular SEI nº 1.088/2020/ME1, que estabelece orientações gerais aos trabalhadores e empregadores, com intuito de prevenir/diminuir o contágio da COVID-19 e promover a adoção de medidas protetivas aos trabalhadores.

Observa-se que, no tocante às exigências de Segurança e Saúde no Trabalho, as orientações gerais são aplicáveis na inexistência de orientações setoriais específicas e as medidas adotadas não representam qualquer supressão ou autorização para o descumprimento das Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho2. Salienta-se que as orientações gerais devem ser analisadas em conjunto com as determinações urgentes necessárias à prevenção, controle e mitigação dos riscos, de modo a promover o achatamento da curva de contágio da pandemia. 

A partir de uma interlocução indispensável entre direitos e deveres nas searas trabalhista, e de proteção de dados e privacidade, merecem destaque as seguintes medidas presentes no respectivo ofício:

1. Criar e divulgar protocolos para identificação e encaminhamento de trabalhadores com suspeita de contaminação pelo novo Coronavírus antes de ingressar no ambiente de trabalho. O protocolo deve incluir o acompanhamento da sintomatologia dos trabalhadores no acesso e durante as atividades nas dependências das empresas;

2. Instituir mecanismo e procedimentos para que os trabalhadores possam reportar aos empregadores se estiverem doentes ou experimentando sintomas;

3. Promover teletrabalho ou trabalho remoto. Evitar deslocamentos de viagens e reuniões presenciais, utilizando recurso de áudio e/ou videoconferência;

Tais medidas decorrem, notadamente, da obrigação, por parte do empregador, de promover um ambiente de trabalho saudável e seguro a seus empregados, conforme disposições da Consolidação das Leis Trabalhistas3, em conjunto com Normas Regulamentadoras relativas à Segurança e Medicina do Trabalho4. Ainda, enquadram-se ao contexto da pandemia da COVID-19 os protocolos para identificação e encaminhamento de trabalhadores com suspeita de contaminação pelo novo Coronavírus antes de ingressar no ambiente de trabalho, em conformidade com o art. 5º, da Lei nº 13.979/20205, que assim dispõe:

Art. 5º Toda pessoa colaborará com as autoridades sanitárias na comunicação imediata de:

I - Possíveis contatos com agentes infecciosos do coronavírus;

II - Circulação em áreas consideradas como regiões de contaminação pelo coronavírus.

Importante destacar que os mecanismos e procedimentos para identificação, encaminhamento dos casos suspeitos de contaminação e comunicação dos empregadores com os trabalhadores referente ao quadro sintomático da COVID-19 devem guardar proporcionalidade e razoabilidade com as atividades da empresa e com direitos e garantias dos trabalhadores. 

Medidas discriminatórias, segregacionistas e invasivas devem ser evitadas, de modo a resguardar garantias constitucionais e a privacidade do trabalhador, em consonância ao artigo 5º, da Constituição Federal6. Ademais, recomenda-se que os dados de saúde sejam tratados com a finalidade de contenção do vírus responsável pela Pandemia COVID-19, em respeito às diretrizes que fundaram o próprio documento emitido pela SIT, o qual objetiva a prevenção e a diminuição do contágio do Coronavírus.

Diante disso, as chances de procedimentos como verificações de temperatura de empregados e de visitantes serem considerados medidas invasivas diminuem em proporção ao aumento de providências tomadas juntamente à checagem, tais como:

(I) o fornecimento de informações aos empregados acerca das finalidades para as quais se coleta sua temperatura; 

(II) a adoção de qualquer medida feita apenas por  médico do trabalho, e de modo reservado, evitando qualquer tipo de exposição do empregado;

(III) a possibilidade de o empregado não consentir com o procedimento adotado, restando a ele medidas alternativas como trabalho remoto, período de licença remunerada para que consiga uma declaração de saúde, por profissional habilitado, que ateste a ausência de risco de seu estado de saúde à propagação da COVID-19; 

(IV) acompanhamento da sintomatologia dos trabalhadores restrito a determinadas pessoas, que deverão zelar pela privacidade dos dados de saúde daqueles que apresentarem temperaturas altas, de modo a evitar o constrangimento e a violação a direitos fundamentais, dentre outras medidas.

Com o escopo de evitar deslocamentos de viagens e reuniões presenciais, o Ofício destaca a promoção do teletrabalho ou do trabalho remoto, definidos pela Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020, como a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação. Recomenda-se atenção especial aos recursos de áudio e/ou videoconferência utilizados, mediante adoção de medidas técnicas e administrativas aptas a proteger dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda e alteração das informações no fluxo estabelecido em regime de teletrabalho. Para tanto, algumas providências são sugeridas, quais sejam:

(I) estabelecer processos de acesso remoto, como Rede Virtual Privada (VPN);

(II) Autenticação Multifatorial (MFA), sistema que requer confirmação da identidade do usuário em mais de uma etapa; 

(III) certificar-se que a infraestrutura, que suporta o acesso remoto, possui capacidade e licenças suficientes para cobrir o aumento do número de usuários que precisam ter acesso simultâneo; 

(IV) atualização automática dos computadores utilizados pelos trabalhadores. 

Neste ponto, aliás, importante consignar que a política para trabalho remoto ou home office deve indicar os instrumentos de trabalho disponibilizados pelo empregador ao empregado e a necessidade de observância aos procedimentos necessários para manutenção da segurança da informação e proteção dos dados tratados. 

Em razão do avanço no conhecimento e controle da epidemia, as orientações poderão ser revistas ou atualizadas. Nessa perspectiva, quanto à incerteza de até quando perdurará o quadro emergencial de saúde pública, recomenda-se que as medidas implementadas pelas empresas guardem conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados, cuja vigência prevista para agosto deste ano está sob discussão, como forma de tais práticas possuírem maior probabilidade de serem consideradas proporcionais às circunstâncias.

Salienta-se que a verificação deve se dar caso a caso, adequada à finalidade para a qual se coletam as informações referentes à saúde dos empregados, limitando os indivíduos que possuirão acesso a elas, tratando-as de forma segura, com retenção mínima e preservando sua identidade, sempre que possível, através de técnicas de anonimização, consoante parâmetros de relevância de determinada informação à saúde pública e de necessidade de identificação do indivíduo condutor de tal informação. Nesse sentido caminha a Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, em seu artigo 6º, §2º, o qual dispõe que “O Ministério da Saúde manterá dados públicos e atualizados sobre os casos confirmados, suspeitos e em investigação, relativos à situação de emergência pública sanitária, resguardando o direito ao sigilo das informações pessoais”.

Por fim, as Normas Regulamentadoras de segurança e saúde do trabalho apresentam uma série de medidas de prevenção aos trabalhadores e podem ser consultadas no site enit.trabalho.gov.br


BRASIL. Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) da Secretaria de Trabalho. Ofício Circular SEI nº 1.088/2020/ME. Disponível em: https://www.sesipr.org.br/informacoes-sst/uploadAddress/oficio-covid[91820].pdf. Acesso em: 30 de março de 2020. Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho. Disponível em: https://enit.trabalho.gov.br/portal/index.php/seguranca-e-saude-no-trabalho/sst-menu?view=default. Acesso em: 30 de março de 2020.
2 BRASIL. Escola Nacional da Inspeção do Trabalho (ENIT). Normas Regulamentadoras de Segurança e Saúde no Trabalho. Disponível em: https://enit.trabalho.gov.br/portal/index.php/seguranca-e-saude-no-trabalho/sst-menu?view=default. Acesso em: 30 de março de 2020.
3 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 30 de maço de 2020.
4 É importante destacar que, nos termos da MP 927, artigo 29, no caso de comprovação de nexo causal entre o surgimento da doença e as condições de trabalho, existe risco de reconhecimento da COVID-19 como doença profissional.
5 BRASIL. Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L13979compilado.htm. Acesso em: 30 de março de 2020.
6 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30 de março de 2020.