Mineradoras de menor porte tiram projetos da gaveta


Mineradoras de menor porte tiram projetos da gaveta


Empresários afirmam que elevação do preço do minério de ferro torna investimentos viáveis; Bamin aposta em projeto integrado

Fernanda Guimarães

Sustentada pelo ciclo de alta de preços do minério de ferro no mercado internacional, uma série de projetos começa a sair da gaveta em Minas Gerais, tradicional região produtora da commodity no País. O que aproxima esses investimentos é o fato de que todos são liderados por pequenos e médios produtores.

"Nossa intenção é acelerar tudo para aproveitar o preço", afirma o sócio-fundador da Atlântica Minas Mineração, Maurício Índio do Brasil. Fundada em 1996, a companhia tem hoje o direito de explorar um total de 60 áreas, mas só quatro delas estão em operação. Pelos novos planos, mais duas áreas vão começar a ser exploradas nos próximos meses e outras 18 já entraram em fase de análise pelos órgãos responsáveis para obtenção de licenciamento.

Previstos para cidades como Morro do Ferro, Barão de Cocais, Bom Jesus do Amparo e Santa Luzia, cada projeto desses da Atlântica, que serão ainda expandidos, tem capacidade para gerar cerca de 30 mil toneladas anuais - praticamente, um grão de minério perto das cifras superlativas das gigantes do ramo. Só a Vale prevê produzir 310 milhões de toneladas neste ano. Como a logística costuma ser o grande entrave para os pequenos exportarem, a venda é feita localmente para as grandes mineradoras e siderúrgicas ou, então, para os guseiros - que são aqueles que transformam o minério em ferro-gusa, matéria-prima para a produção de aço.

Índio do Brasil conta que no ano passado vendeu no mercado interno a tonelada do minério, em média, a R$ 180; hoje, o valor já chegou a R$ 600. Localmente, os mineradores não conseguem capturar o prêmio de qualidade que as grandes mineradoras conseguem vendendo diretamente na China.

Como a ideia é pisar no acelerador, no fim de 2020 a mineradora negociou o aporte financeiro de um fundo para bancar os investimentos. A Atlântica não divulga o nome do fundo nem o valor investido. Neste momento, segundo Índio do Brasil, duas outras negociações do mesmo gênero estão em curso.

"Estamos vendo projetos menores que começaram a sair do papel, projetos que se viabilizaram com a atual taxa de câmbio e preço do minério", comenta Fernando Sette, sócio que comanda a área de mineração do escritório Azevedo Sette. Segundo ele, esses projetos, em média, têm uma capacidade de um milhão de toneladas a cinco milhões de toneladas.

Outro exemplo vem da Herculano Mineração, que deverá sair de uma produção de 4,2 milhões de toneladas, no ano passado, para um total de 5 milhões neste ano. "Esse atual aumento de preço (do minério no mercado internacional) compensa toda a dificuldade que já passamos. Teve ano que a conta não fechava", afirma o presidente da mineradora, Marco Aurélio Herculano, que fundou a empresa em 1992 ao lado dos dois irmãos.

De olho no salto dos negócios, a companhia já apresentou pedido de licenciamento para uma nova lavra e prepara um segundo. A expectativa é que a produção seja iniciada em até dois anos, o que no setor representa um tempo de maturação relativamente curto. Até lá, a expectativa ainda é ter um mercado com preços atrativos. Diretor executivo da consultoria J.Mendo, Adriano Espeschit afirma que o investimento até pode ser feito com base nos preços correntes, mas o olhar precisa ser de longo prazo. "É preciso pensar na sustentabilidade do projeto", afirma ele. Ele frisa que essa busca por tirar projetos da gaveta ou expandir os já existentes acaba embarcando também menores de menor concentração de ferro, que precisam de maior beneficiamento, que é a mistura com um minério de melhor qualidade, para que possam ser vendidos. Como esse processo de beneficiamento é custoso ele acaba se tornando economicamente viável com um preço elevado do minério de ferro. O especialista destaca que, como o ciclo do minério é longo e os projetos demoram para serem executados, é necessário ter na prancheta valores conservadores na hora da tomada de decisão.

 O presidente do Conselho do Instituto Brasileiro de Mineração (IBram), Wilson Brumer, que já comandou a Vale e Usiminas, frisa que os grandes projetos de mineração levam de sete a dez anos para ficarem prontos e, por isso, investimentos não podem ser baseados no preço atual do minério. No entanto, as médias empresas tem a possibilidade de acelerar aumento de produção e conseguirem surfar ao menos uma parte desse atual patamar de preço. Um dos trabalhos que o tem feito para fomentar os investimentos, comenta, é de buscar uma aproximação do setor com a Bolsa brasileira, com a intenção de abrir caminho para que essas empresas aprimorem sua governança e possam abrir capital. "O setor de mineração é um setor de longo prazo, com investimentos muito robustos e retornos cíclicos", frisa.

Bamin

Ao arrematar no mês passado o primeiro trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), a Bahia Mineração (Bamin) deu o passo que precisava para anular uma barreira importante na produção de minério de ferro destinada à exportação: logística. A empresa deve investir R$ 14 bilhões em um projeto que integra mina-ferrovia-porto no Estado da Bahia. Além do trecho da Fiol, de 537 km, o pacote engloba uma mina de ferro, em Caetité, e um terminal portuário, em Ilhéus. Hoje, a produção de minério é de 1 milhão de tonelada - e vendida à Vale. Livre do problema de logística, a companhia fala em chegar a 18 milhões de toneladas até 2025.

Para o presidente da Bamin, Eduardo Ledsham, um ex- executivo da Vale, o momento agora é de produção dos depósitos menores de minério. "O Brasil não está mais nos grandes projetos, mas nos menores", comenta o executivo ao Estadão.

O atual preço do minério, comenta o presidente da Banim, faz diferença e a empresa está, inclusive, avaliando ampliar sua produção. O executivo destaca, contudo, que a companhia precisa se estruturar para ser sustentável mesmo no ciclo de baixa do minério - momento que sempre chega, comenta.

A Bamin, controlada pela Eurasian Resources Group (ERG), do Cazaquistão, é hoje a única mineradora em atividade no Brasil que terá toda sua estrutura localizada apenas no Estado na Bahia: mina, ferrovia e porto. Ledsham destaca que com a infraestrutura pronta, o que está previsto para ocorrer em 2026, a ideia é ajudar a alavancar a produção de minério da região, de produtores menores travados por falta de logística.

Com o atual preço e logística disponível, frisa, diversas minas devem se viabilizar. A Fiol terá capacidade de transporte de 60 milhões de toneladas e como a Bamin utilizará apenas um terço dessa capacidade, o restante será ocupado por produção de terceiros e, ainda, pelo agronegócio da região. "A infraestrutura será um indutor para a produção da região", diz.

Para a mineradora conseguir exportar é a via necessária em busca de mais rentabilidade. Ao vender no Brasil a Banim não consegue capturar o valor sobre a qualidade do seu minério de sua mina Pedra de Ferro.

Para o minério de concentração mais alta de ferro e com presença menor de outros componentes, como a sílica, existe um prêmio ao valor pago. Esse minério de mais alta concentração de ferro e mais limpo é utilizado para se misturar com minério de qualidade menor, cujo produto será utilizado para a produção de aço. Ao se vender no Brasil, no entanto, a mineradora não consegue esse preço mais alto, por isso a necessidade de buscar a exportação.

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