Por Bruna Bouissou e Mariana Laia*
A burocracia nos processos de contratações públicas é constantemente objeto de discussões no âmbito jurídico. De um lado, muitas vezes, os gestores públicos optam pela adoção de procedimentos rígidos e morosos, temendo serem responsabilizados por inobservância das normas. De outro, o interesse da iniciativa privada demanda celeridade e o atendimento constante do princípio constitucional da eficiência.
A excessiva burocratização de processos licitatórios impacta, significativamente, a atuação das empresas públicas e sociedades de economia mista, que participam do mercado juntamente com as empresas privadas. Afinal, o sucesso das primeiras depende de celeridade e eficiência nas contratações, o que, muitas vezes, esbarra nos entraves decorrentes de excessivas formalidades.
Diante de tal cenário, em 2016, foi sancionada a Lei Federal nº 13.303 (“Lei das Estatais”), que, dentre outros, elencou hipóteses de dispensa da instauração de procedimento licitatório a empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias.
De maneira geral, as hipóteses previstas pela Lei das Estatais em muito se assemelham aos dispositivos da Lei Federal nº 8.666/93 (Lei de Licitações), contudo o inciso II do art. 28 positivou, de forma expressa, a possibilidade de dispensa em “casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada a oportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo”, tratando como hipótese de dispensa o que a Lei de Licitações tratava como inexigibilidade, sem, contudo, qualquer efeito prático.
Adicionalmente, e visando a conferir ainda mais segurança à nova hipótese de dispensa, o legislador fez constar expressamente da lei, no §4º do art. 28, a definição de “oportunidade de negócio” determinado que a expressão deve compreender a “formação e a extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação de participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais, respeitada a regulação pelo respectivo órgão competente”.
Ocorre que, não obstante a tentativa do legislador em especificar a aplicabilidade do texto legal, ainda restou significativa margem para subjetividades na atuação dos gestores públicos, o que pode culminar em um desvirtuamento do propósito de desburocratização e além. Isto é, a margem de interpretação existente sobre o que pode ou não ser considerado “oportunidade de negócios” pode ocasionar o uso indevido da dispensa de licitação e contratações que não sejam as mais vantajosas à Administração.
Vale dizer que não se pretende aqui questionar a existência de margens interpretativas de um texto normativo, eis que da própria essência do texto legal. Ocorre que, muito embora a Lei das Estatais tenha tentado conferir maior segurança jurídica à aplicabilidade das faculdades legais, a sua aplicação no caso das oportunidades de negócios para as empresas estatais não é isenta de interpretações que distorçam a sua finalidade.
Dúvidas e incertezas quanto à aplicabilidade do dispositivo são constantes, mas podem ser reduzidas substancialmente se precedidas de um estudo analítico de cada caso. A avaliação dependerá de uma análise sistêmica dos regramentos legais e peculiaridades envolvidos, devendo incluir, por exemplo e se for o caso, aspectos ambientais, econômicos, sociais e mercadológicos.
Nota-se, pois, que a verificação da configuração de uma “oportunidade de negócio” deve ser respaldada pela justificativa fático-jurídica, de forma a restarem cabalmente demonstradas as vantagens da utilização da faculdade conferida no art. 28, §4º da Lei das Estatais, sendo desejável inclusive a demonstração das vantagens da escolha em face de outras alternativas.
Por fim, destaca-se que toda e qualquer contratação pública, seja ou não precedida de licitação, está sujeita a questionamentos dos órgãos de controle. Contudo, se baseada em um processo transparente e devidamente motivado e fundamentado, além de haver significativa redução dos riscos, as chances de satisfação do interesse público são certamente maiores.