Beneficiário de endosso-caução não perde direito ao crédito por quitação ao endossante sem resgate do título


Beneficiário de endosso-caução não perde direito ao crédito por quitação ao endossante sem resgate do título


Ao julgar o Agravo em Recurso Especial nº 1.635.968, a Quarta do Turma Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que, nas operações de endosso-caução, nas quais o endossante transmite um título ao endossatário como forma de garantia da dívida, mas sem a transferência da titularidade da cártula, o endossatário de boa-fé não tem seu direito de crédito prejudicado no caso de eventual quitação realizada ao endossante (credor originário), sem resgate do título.

Nesse sentido, a Quarta Turma do STJ reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) e julgou improcedente a pretensão da parte executada, que – nos embargos à execução – alegou ter pago diretamente ao endossante o valor executado pelo endossatário, mas sem que houvesse o resgate da duplicata que embasou a execução.

Em primeira instância, o juízo acolheu os embargos e reconheceu a ilegitimidade ativa da parte exequente. Já o TJPR, apesar de entender que o exequente teria legitimidade para propor a ação, concluiu que, como houve pagamento direto ao endossante, o título de crédito teria perdido o requisito da exigibilidade.

Segundo o relator do Recurso interposto pelo endossatário, Min. Luis Felipe Salomão, o Art. 19 da Lei Uniforme de Genebra estabelece que, quando o endosso contém qualquer menção que implique uma caução, o portador pode exercer todos os direitos emergentes do título.

O mesmo dispositivo prevê que os coobrigados não podem invocar contra o portador as exceções fundadas nas relações pessoais com o endossante, a menos que o portador, ao receber a letra cambiária, tenha praticado ato consciente em detrimento do devedor.

Invocando a doutrina, o relator também ressaltou que o interesse social busca proporcionar ampla circulação dos títulos de crédito, permitindo aos terceiros de boa-fé a plena garantia e a segurança na sua aquisição, "constituindo a inoponibilidade das exceções fundadas em direito pessoal do devedor a mais importante afirmação do direito moderno em favor da segurança da circulação e da negociabilidade dos títulos de crédito".

E arrematou: o título de crédito nasce para circular, não para ficar restrito à relação entre o devedor principal e o credor originário.

Em seu voto, o Min. Salomão lembrou que o Art. 15, I, da Lei das Duplicatas, estabelece que a cobrança judicial de duplicata será efetuada conforme processo aplicável aos títulos executivos extrajudiciais, não havendo necessidade de qualquer outro documento além do título. 

Por outro lado, o relator destacou que, apesar de a duplicata possuir natureza causal – ou seja, depende da prestação de um serviço para ser constituída –, essa característica não lhe retira o caráter de abstração, uma vez que contra ela não podem ser opostas exceções quando em circulação.

O Min. Salomão explicou que "Perquirir acerca do negócio subjacente para admitir oposição de exceções pessoais em face do endossatário terceiro de boa-fé de duplicata aceita representaria patente e significativa mudança na jurisprudência desde sempre pacífica acerca do tema, ferindo de morte a circulabilidade dos títulos de crédito, o princípio da abstração e o relevantíssimo instituto cambiário do aceite".

Ademais, o relator salientou que o caso não discute o instituto de direito civil da cessão do crédito, mas as obrigações cambiárias autônomas do endosso e, de forma específica, o aceite dado no título.

Para o relator, uma vez aceito o título, o sacado vincula-se a ele como devedor principal, e a falta de entrega da mercadoria ou da prestação do serviço, ou mesmo a quitação referente à relação fundamental ao credor originário, só são oponíveis ao sacador, como exceção pessoal, mas não ao endossatário de boa-fé.

Ao dar provimento ao recurso, o relatou concluiu advertindo ser "temerário" para a circulação dos títulos de crédito que se admita a quitação de crédito cambial sem a exigência do regaste da cártula, especialmente se essa situação gerar prejuízo a terceiro de boa-fé. 

A equipe de Direito Bancário e Financeiro do Azevedo Sette Advogados se coloca à disposição para esclarecimentos adicionais sobre o tema.

Fonte: STJ