Atualizações legislativas de Telecomunicações na época da COVID-19


Atualizações legislativas de Telecomunicações na época da COVID-19


A pandemia da COVID-19 trouxe os mais diversos efeitos ao setor de telecomunicações no cenário brasileiro e mundial, perpassando essencialmente pela questão da sobrecarga da infraestrutura de telecomunicações, diante da crescente demanda para o acesso à internet e outros serviços e, ainda, do consequente aumento de consumo de dados e tráfego de internet móvel mundial – o que pôde se verificar através de aumento da velocidade de banda larga e de planos menores, a liberação do acesso de redes Wi-Fi em locais públicos, a abertura do sinal de canais pagos para usuários e ações de redução de qualidade de transmissão de vídeos para diminuir o uso de dados nas redes, por exemplo. 

Além da atuação da Anatel, através de comunicados às operadoras de telecomunicações e publicação de conteúdo sobre o desenvolvimento dos serviços desses entes diante da COVID-19, o panorama legislativo também vem se  atualizando para lidar com os novos desafios trazidos pelo coronavírus sobre o setor de telecomunicações. 

Neste sentido, o Projeto de Lei nº 2.066/2020 (“PL 2066/20”), apresentado pelo Deputado Tiago Dimas no dia 22 de abril, pretende diferir os tributos devidos pelas empresas prestadoras de serviços de internet – ICMS, FECP, PIS/PASEP, COFINS, FUST, FUNTTEL, IRPJ e CSLL – durante os meses de março a julho de 2020, com vencimento de abril a agosto de 2020, e estabelece condições excepcionais para o diferimento de despesas em relação ao fornecimento de dados para prestadoras de pequeno porte, em razão da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus e do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

O pagamento dos referidos tributos poderá ser efetuado em parcela única, com vencimento em 31 de agosto de 2020, ou em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas (corrigidas apenas pela taxa referencial do Selic, sem incidência de multa ou juros adicionais), com vencimento no último dia útil de cada mês, hipótese em que a primeira parcela vencerá em 31 de agosto de 2020, a critério do contribuinte. 

Ademais, de acordo com o PL 2066/20, as empresas Prestadoras de Pequeno Porte (PPPs) não terão o tráfego de dados suspenso, até agosto de 2020, na hipótese de inadimplemento em relação às empresas Prestadoras que forneçam os dados, desde que utilizem Ponto de Troca de Tráfego (PTT), Interconexão para Trânsito de Dados e Interconexão para Troca de Tráfego de Dados (peering) para viabilizar o provimento de conectividade à internet. Deverão, ainda, comprovar, em demonstrativo contábil, a manutenção do número de empregados constantes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) à data-base do 30º (trigésimo) dia que anteceder à data do pedido (ressalvadas as demissões por justa causa) e a não extrapolação das possibilidades do PL 2066/20.

O conjunto das parcelas vencidas das PPPs poderão ser pagas, a critério da empresa devedora: em parcela única, com vencimento em 31 de agosto de 2020, sobre a qual incidirá correção pela taxa referencial do Selic; ou em até 5 (cinco) parcelas mensais e sucessivas, com vencimento no último dia útil de cada mês, hipótese em que a primeira parcela vencerá em 31 de agosto de 2020, e sobre as quais incidirão correção pela taxa referencial do Selic e juros adicionais de 3,5% ao ano, a partir de 31 de agosto de 2020.

A justificativa do PL 2066/20 é de que há uma crise econômica evidente em decorrência da pandemia, que tende a afetar diretamente as PPPs, já que a perda de suas receitas diante da inadimplência de clientes por escassez de recursos e perda do poder de compra faria com que as PPPs fossem incapazes de pagar tempestivamente as prestações devidas às prestadoras de médio e grande porte que fornecem o tráfego de dados. Tal fato geraria a suspensão do tráfego às PPPs e, consequentemente, uma restrição ao direito constitucional e fundamental de acesso à informação da sociedade devido à suspensão do acesso à internet, assim como a iminente falência das PPPs, fortalecendo ainda mais a recessão vivida.

Outra interessante proposta legislativa a se mencionar é o Projeto de Lei nº 2.088/20 (“PL 2088/20”), apresentado pelo Deputado Orlando Silva no dia 22 de abril, que dispõe sobre a garantia de manutenção do acesso aos serviços relativos ao Serviço Móvel Pessoal - SMP e ao Serviço de Comunicação Multimídia - SCM, enquanto perdurar a emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, nos termos da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

A medida propõe que as empresas prestadoras de SCM e SMP fiquem proibidas, em decorrência de inadimplência do consumidor, independente do plano de serviço contratado e somente enquanto perdurar a emergência de saúde pública, de:

a) suspender o acesso do assinante aos serviços por ele contratado;

b) reduzir a velocidade contratada de conexão de acesso à internet;

c) limitar ou reduzir a franquia de dados de navegação na internet;

d) alterar o plano contratado sem a clara e manifesta autorização do consumidor;

e) limitar ou excluir aplicativos de conteúdo inclusos no plano contratado;

f) registrar nos sistemas de proteção ao crédito os assinantes inadimplentes; e

g) cobrar qualquer outro valor referente ao serviço.

Outrossim, é dever das prestadoras de serviços garantir o acesso do assinante a central de atendimento da empresa prestadora, independentemente da adimplência, e notificar o assinante da existência de débito vencido, da data de vencimento e o correspondente valor, o qual deverá ser imediatamente excluído dos registros após o pagamento do débito. 

Decorridos 30 (trinta) dias do fim da pandemia da COVID-19, as empresas prestadoras de serviços serão autorizadas a contatar o consumidor para promover a negociação dos eventuais débitos acumulados no período da crise do coronavírus, em documento de cobrança separado dos demais contratos, e os débitos poderão ser parcelados em até 12 (doze) meses, a critério do consumidor, sem incidência de multa, juros e correção monetária.

Finalmente, o PL 2088/2020 dispõe que as PPPs ficam isentas de recolhimento dos tributos FUST, FUNTTEL e TFF no período compreendido entre a publicação da proposta legislativa como Lei até 31 de dezembro de 2020. Os valores eventualmente recolhidos neste período constituirão créditos a serem amortizados no exercício de 2021, conforme futura regulamentação da Anatel. Ainda, a proposta pretende alterar a redação do caput do artigo 1º  e inserir um § 4º no artigo 5º  da Lei nº 9.998/2000, que institui o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações, visando que os recursos do FUST possam ser utilizados pela União para recompor as perdas de arrecadação das prestadoras de serviço em caso de inadimplência.

O argumento para a proposição do PL 2088/2020 é de tentar atender a condição básica para o exercício de cidadania que é o uso e acesso à internet, nos termos da definição do Marco Civil da Internet, principalmente nos tempos atuais de calamidade e emergência de saúde públicas, em que são impostos o isolamento social, ensino à distância e o teletrabalho, por exemplo. A garantia de manutenção do acesso aos serviços relativos ao SMP (telefonia móvel) e ao SCM (banda larga) implica na não suspensão do acesso aos cidadãos à rede mundial de computadores, fortalecendo a ideia de que a rede é condição essencial para manutenção e continuidade dos serviços, comunicação e educação.

Assim, a manutenção de serviços de telecomunicações e a necessidade de tratamento especial às operadoras desses serviços, em especial àquelas de pequeno porte, previstas em ambos os projetos, demonstra uma preocupação dos legisladores com relação à universalização das telecomunicações, através da proteção dos direitos fundamentais da sociedade e apoio às prestadoras numa fase tão sensível para a economia nacional e global.

Para receber as principais novidades legislativas referentes a telecomunicações e tecnologia, acompanhe a equipe de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações – TMT do Azevedo Sette Advogados.