A nova Lei de Franquias e a Lei de Locações


A nova Lei de Franquias e a Lei de Locações


Por Alessandra Ganz

A Lei Federal nº 13.9661, publicada em 27/12/2019, revogou a Lei Federal nº 8.955/1994 e passou a dar nova disciplina para o sistema de franquia empresarial. A Nova Lei de Franquias, como ficou conhecida, passou a gerar efeitos em 26/03/2020.

Além de alterações específicas relativas ao modelo de franquia, a nova lei trouxe mudanças e novos contornos à Lei de Locações (Lei Federal nº 8.245/1991) que podem provocar discussões sobre a compatibilização das duas leis de idêntica hierarquia. Nesse aspecto, a Lei de Locações, a meu ver, deve prevalecer, considerado o critério da especialidade.

Legitimidade do franqueador para ação renovatória na sublocação

Antes da Nova Lei de Franquias, a legitimidade para propositura de ação renovatória, nos casos de sublocação total, via de regra, era exclusiva do sublocatário (artigo 51, parágrafo 1º, Lei de Locações2). Porém, com agora, essa legitimidade passa a ser compartilhada com o sublocador (franqueador).

Essa alteração visa proteger tanto franqueados como franqueadores contra eventual desídia ou inadimplência de uma ou outra parte que possa, em grau mais severo, acarretar a perda do ponto comercial.

Assim, uma vez proposta a ação, por ocasião da renovação ou prorrogação do contrato, sublocador ou sublocatário não poderão ser excluídos da relação contratual, salvo nos casos de inadimplência do contrato locatício ou do contrato de franquia, conforme dispõe a Nova Lei de Franquias:

Art. 3º. nos casos em que o franqueador subloque ao franqueado o ponto comercial onde se acha instalada a franquia, qualquer uma das partes terá legitimidade para propor a renovação do contrato de locação do imóvel, vedada a exclusão de qualquer uma delas do contrato de locação e de sublocação por ocasião da sua renovação ou prorrogação, salvo nos casos de inadimplência dos respectivos contratos ou do contrato de franquia.

Nesse sentido, se antes as avenças locatícias poderiam não ser renovadas se o sublocatário (franqueado) propusesse ação renovatória, mas o locatário (franqueador) estivesse inadimplente em relação ao locador, agora será possível ao sublocatário sub-rogar-se no contrato original, tornando-se locatário direto (com exclusão do franqueador da relação locatícia), aplicando-se o disposto no artigo 15 da Lei de Locações em sentido oposto.

Vale dizer que essas inovações da ‘Nova Lei de Franquias’ possivelmente implicarão em aumento do número de sublocações, especialmente em shopping centers, como medida de segurança do próprio franqueador, e, consequentemente, serão necessárias regras contratuais mais detalhadas sobre mecanismos de sublocação e providências em caso de inadimplência, à luz da subsidiariedade entre sublocador/sublocatário perante o locador (art. 16, Lei de Locações3), como forma de trazer celeridade e assertividade para a relação contratual.

Ausência da limitação do valor do aluguel na sublocação

O artigo 214 da Lei de Locações veda, de forma absoluta, que o valor do aluguel da sublocação exceda o aluguel praticado na locação. Contudo, a Nova Lei de Franquias inova ao trazer exceção ao consagrado conceito para as relações locatícias entre franqueador e franqueado:

Art. 3º. (...)

Parágrafo único. O valor do aluguel a ser pago pelo franqueado ao franqueador, nas sublocações de que trata o caput, poderá ser superior ao valor que o franqueador paga ao proprietário do imóvel na locação originária do ponto comercial, desde que:

I - essa possibilidade esteja expressa e clara na Circular de Oferta de Franquia e no contrato; e

II - o valor pago a maior ao franqueador na sublocação não implique excessiva onerosidade ao franqueado, garantida a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da sublocação na vigência do contrato de franquia.

Desta maneira, o valor do aluguel a ser pago pelo franqueado (sublocatário) ao franqueador (sublocador) poderá ser superior ao valor que o franqueador (locatário) paga ao locador originário. A exceção, porém, está vinculada a duas condições: (a) deve constar expressamente na Circular de Oferta de Franquia e no contrato de franquia; e (b) o valor pago a maior pelo franqueado não deve implicar em excessiva onerosidade ao franqueado.

Nesse sentido, fica claro que caberá a jurisprudência e doutrina definir o que se entende por onerosidade excessiva nesse novo cenário, frisando que a lei não trata de eventual imprevisibilidade superveniente, o que nos parece possível de ser aplicado.

Esse é um mecanismo para os franqueadores recuperarem, possivelmente com mais eficiência, eventuais investimentos feitos no imóvel locado. Contudo, como se trata de vantagem obtida pelo franqueador em função de um ativo de terceiro, o locador pode estabelecer contraprestação proporcional, mediante prestação de correspondentes informações pelo franqueador.

Até a confrontação e uniformização jurisprudencial sobre tais temas, a nova situação envolvendo as partes (locadores, franqueados e franqueados) podem enfrentar momentos de grande embate, por conta da necessária adaptação contratual e o exercício de novas situações jurídicas, por isso é tão importante avaliar os riscos e possibilidades envolvendo o tema e adequar ao máximo os contratos à nova realidade.

1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13966.htm

2 Art. 51. Nas locações de imóveis destinados ao comércio, o locatário terá direito a renovação do contrato, por igual prazo, desde que, cumulativamente: [...] § 1º O direito assegurado neste artigo poderá ser exercido pelos cessionários ou sucessores da locação; no caso de sublocação total do imóvel, o direito a renovação somente poderá ser exercido pelo sublocatário.

3 Art. 16. O sublocatário responde subsidiariamente ao locador pela importância que dever ao sublocador, quando este for demandado e, ainda, pelos aluguéis que se vencerem durante a lide.

4 Art. 21. O aluguel da sublocação não poderá exceder o da locação; nas habitações coletivas multifamiliares, a soma dos aluguéis não poderá ser superior ao dobro do valor da locação. Parágrafo único. O descumprimento deste artigo autoriza o sublocatário a reduzir o aluguel até os limites nele estabelecidos.