Saiba por que um programa de compliance é importante nas empresas


Saiba por que um programa de compliance é importante nas empresas


Pode ser que você nunca tenha ouvido falar, mas existe uma área destinada a garantir o cumprimento da legislação e das normas internas em empresas

AL Ana Luísa Santos*

postado em 01/03/2020 18:18

Nos últimos anos, o tema compliance vem ganhando mais espaço nas companhias brasileiras. Devido aos escândalos de corrupção protagonizados por grandes empresas e pela Lei Anticorrupção, aprovada em 2013, os executivos brasileiros começaram a investir mais nesse setor. Segundo a quarta edição de pesquisa feita pela prestadora de serviços profissionais KPMG, no Brasil, o nível de maturidade em compliance, entre 2018 e 2019, evoluiu de 2,6 para 2,75, em uma escala que varia de 0 a 5.

Salim Saud, 40 anos, advogado e professor de curso na área oferecido pela Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-Rio), explica que há várias áreas relacionadas ao tema, não somente ligadas a mecanismos anticorrupção. “Compliance é conformidade ou adequação às leis. Então, existe compliance trabalhista, tributário, bancário. Há uma série de compliances possíveis, mas, normalmente, quando a gente fala em compliance, é relacionado à anticorrupção”, afirma Saud.

Anticorrupção

O professor da FGV-Rio e advogado afirma que a operação Lava-Jato impulsionou ainda mais a procura de empresas por esses serviços. Com o crescente investimento corporativo no tema, aumenta também a procura por profissionais nessa área. O compliance officer, como é chamado o profissional do setor, tem como função garantir que regulamentações internas e externas da área de atuação da empresa sejam cumpridas.

Saud comenta que esse trabalhador pode ser analista, diretor ou gerente, dependendo da organização. “Ele vai ter a responsabilidade de assegurar que a empresa atenda à legislação, sobretudo, a de anticorrupção”, esclarece. A luta pelo cumprimento às regras vem ganhando força em todo o país, incluindo Brasília que, por concentrar a sede dos Três Poderes e por ser um centro político, necessita ainda mais se atentar para a questão.

Caso de sucesso brasiliense 

Exemplo de como a área de compliance tem se destacado na capital federal é a empresa brasiliense Infosolo Informática. Investindo no tema, a firma criou um canal de denúncias anônimas independente a fim de que colaboradores, clientes e parceiros possam relatar qualquer situação ou fato que fuja das regras. Cada registro de descumprimento é investigado pelo comitê de ética da empresa, que criou a Logo Aceleradora, a qual fomenta startups em 2019.

Além disso, o time de executivos e juristas da companhia passou por treinamento de compliance com chancela da KPMG. Compliance officer e advogada da Infosolo Informática, Brunella Santos, 37 anos, conta que o programa da corporação onde trabalha começou a ser implantado no fim de 2018. A iniciativa, explica ela, vai além da transparência e do combate à corrupção empresarial, refletindo também o conjunto de valores da empresa.

O tema perpetuou a cultura da firma a partir da legislação. “O Governo do Distrito Federal publicou a Lei nº 6.112/2018, que prevê que todas as empresas que têm contrato com o poder público devem ter um programa de integridade e compliance. Então, começamos, no fim de 2018, a implantar o programa de compliance na Infosolo”, esclarece. O sistema de denúncias, que podem ser anônimas ou não, é um dos carros-chefes da iniciativa ali.

“O canal é supervisionado pela KPMG”, informa Brunella. Armindo da Mata Filho, 59, gestor administrativo e financeiro da Infosolo Informática, conta que, com o crescimento da empresa, surgiu a necessidade da implantação de um programa de integridade. “A princípio, fizemos algo mais simples e fomos elaborando com o tempo”, afirma. Além disso, ele avalia a importância do investimento no setor e a preocupação com a capacitação de diretores da empresa. 

Pelas regras

Trata-se do conjunto de mecanismos aplicados a fim de cumprir e se fazer cumprir normas legais e regulamentares, políticas e diretrizes estabelecidas para o negócio, bem como evitar, detectar e tratar quaisquer desvios ou inconformidades. O termo tem origem no verbo em inglês “to comply”, que significa agir de acordo com uma regra, uma instrução interna, um comando ou um pedido. 

Obrigatoriedade no DF 

Mais de 11 executivos da Infosolo foram capacitados pela KPMG em relação à temática. “Durante o curso , estudamos todas as vertentes do compliance, desde proteção contra lavagem de dinheiro até técnicas de investigação”, conta Gustavo Sales, 42 anos, gerente de TI. Com a avogada Brunella Santos, ele integra o comitê de ética da empresa de informática. Também foram ministrados treinamentos para todos os colaboradores com relação às regras de conduta da empresa e da área de atuação de cada um.

 “Nós elaboramos cartilhas com as normas e orientamos os funcionários sobre todas as formas de atuação da empresa”, explica Armindo da Mata Filho, diretor de Infosolo. O consenso entre os colaboradores é de que essas iniciativas acabam sendo um atestado de comprometimento com a transparência, de modo que nenhum malfeito passe despercebido. A empresa é conhecida pelo registro de financiamento de veículos junto ao Departamento Nacional de Trânsito (Detran) em 11 unidades da Federação.

Trata-se de uma companhia  que se adiantou à obrigatoriedade: a lei que prevê que prestadoras de serviço para o GDF tenham um programa de integridade passou a valer somente em janeiro deste ano. De acordo com Rodrigo Badaró, 43, advogado e sócio do escritório Azevedo Sette Advogados, foi necessário dar um prazo para que as firmas com contrato com o poder público pudessem implementar um sistema de compliance.

Isso foi importante, segundo o conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para que elas instituíssem canais de denúncias eficientes. No entanto, é preciso que esses programas sejam fiscalizados. “É preciso ter fiscalização por parte do Estado para ver se os canais de denúncia são mesmo eficientes para o programa de integridade”, enfatiza. Badaró conta que o escritório do qual é sócio tem uma área  voltada somente para o programa de integridade.

 Segundo o jurista, é necessário que todas as empresas, não só as que prestam serviços para o governo, tenham esse tipo de sistema. “Nós não conseguimos mais fechar contratos sem um programa de integridade. Hoje, os clientes querem saber se o julgamento e as punições serão efetivos caso haja um caso de corrupção na empresa. O compliance dá essa segurança”, garante. 

Área em ascensão 

De acordo com Rodrigo Badaró, o setor de compliance vem crescendo muito nos últimos anos e, consequentemente, a profissionalização na área, também. Esse crescimento, diz o advogado, veio após grandes escândalos de corrupção, como o Mensalão e a Operação Lava-Jato. “A instituição de um programa de compliance está sendo também uma questão de mercado, empresas que não possuem esse sistema podem até perder contratos. Está virando uma exigência”, afirma.

Esse crescimento da procura pelos serviços de compliance se reflete na busca por cursos de profissionalização em compliance officer. A advogada e coordenadora do curso de compliance do Insper, Marina Coelho Araújo, 43 anos, confirma o aumento de matrículas na formação. “Temos uma demanda muito alta para o curso em compliance, que é interdisciplinar”, diz. Segundo ela, não só profissionais do direito procuram as aulas: há também alunos graduados em administração, economia, comunicação, entre outros.

Ainda não há um curso de graduação para se tornar um profissional em compliance. No entanto, existem pós-graduações e cursos livres. Entre as instituições que oferecem curso na área, estão FGV Insper, Fundação Instituto de Administração (FIA), e Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). 

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