Licença Parental: Um novo patamar para igualdade no mercado de trabalho


Licença Parental: Um novo patamar para igualdade no mercado de trabalho


Trabalho da mulher, direito da mulher ao voto, proteção à maternidade, igualdade de direitos, são algumas das conquistas feitas pelas mulheres ao longo de muitos anos. No ano passado, neste mesmo projeto de artigos para celebrar o mês das mulheres, escrevemos sobre o trabalho da mulher e a evolução durante os anos. Se tiver interesse em reler/ler, veja aqui.

Novas necessidades se apresentam e, como desdobramento do tema do ano passado, a proposta neste ano é refletir sobre Licença Parental e seus reflexos no caminho para a igualdade de tratamento entre sexos e gêneros. Isso tem um nome: Evolução!

Em um momento em que ainda vivemos as incertezas e desafios da pandemia causada pela COVID-19, quer nos parecer que a discussão sobre licença parental ganhou mais força. 

Evidente que a licença maternidade é um marco histórico e que representa a conquista de um direito social que visa assegurar a saúde da mulher em conjunto com os interesses da criança. Todavia, parece-nos que a licença parental se revela como um novo patamar para a igualdade no mercado de trabalho. Sobre esta perspectiva, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico tem um trabalho específico para tratar da licença parental e traz reflexões de como esta política tem sido adotada em vários países (https://www.oecd.org/policy-briefs/parental-leave-where-are-the-fathers.pdf

Pensar em licença parental passa pela compreensão de que a necessidade de dedicação atenta ao(s) filho(s), sobretudo em seus primeiros anos de vida, compete aos pais e não apenas à mulher. Nesta linha de pensamento, a ministra do C. TST, Maria Cristina Peduzzi, em webinar promovido pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos em agosto de 2020, afirmou que “Esse tipo de política favorece o redesenho da divisão sexual do trabalho, retirando a responsabilidade exclusiva da mãe pelo afastamento em razão da maternidade e distribui o dever do cuidado, como uma forma de estímulo ao pai, uma vez que ambos estarão compartilhando esse afastamento do mercado de trabalho em igualdade de condições”1.

A síntese do racional da licença parental é justamente minimizar os impactos do afastamento do mercado de trabalho em igualdade de condições. Neste espírito, a Convenção 156 da Organização Internacional do Trabalho dispõe acerca da necessidade de uma efetiva igualdade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres quanto ao exercício da parentalidade e livre escolha de emprego2.  Esta convenção não está assinada no Brasil.

Vale dizer que outros países, como  a Finlândia3, Alemanha, Islândia, Noruega e Suécia4, já adotam a licença parental, com regras específicas e alternando períodos entre mãe e pai. 

No Brasil, as licenças são concedidas nos limites de 5 a 20 dias para licença paternidade e de 120 a 180 dias para licença maternidade, sendo estes limites máximos (20 e 180) somente são concedidos àqueles que trabalham em empresas que aderiram ao programa empresa cidadã. 

Há um projeto de emenda à Constituição Federal (PEC 229/2019) em trâmite no Senado Federal para alternar a redação do artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal, para determinar, ao invés da licença à gestante com a duração de 120 dias, a “licença parental compartilhada pelos genitores ou pelos que adotarem ou obtiverem guarda judicial para fins de adoção de criança, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 180 dias”.  

De outra banda, vale dizer que apenas no ano de 2016 foram incluídas duas disposições no artigo 473 da CLT garantindo o direito à ausência justificada ao trabalho (isto é, sem desconto salarial) por até 2 dias, para acompanhar consultas médicas e exames complementares durante o período de gravidez de sua esposa ou companheira, e por 1 dia por ano para acompanhar filho de até 6 anos em consulta médica. Assim, a construção de um novo olhar sobre a responsabilidade compartilhada entre homens e mulheres no cuidado com os filhos, é muito recente no nosso pais; todavia, há muito ainda que se caminhar para estabelecer, sobretudo do ponto de vista de políticas públicas, medidas que assegurem uma efetiva igualdade de tratamento e  de oportunidades entre homens e mulheres, especialmente em relação à parentalidade. 

Para termos um pouco mais de estatísticas, uma publicação da Você RH5, citando estudo feito em parceria entre a Talenses e a Filhos no Currículo e envolvendo 721 empresas, releva que apenas 2% oferecem licença-paternidade estendida, sendo que, deste percentual, 79% adotam a de 20 dias e apenas 7% dão mais de dois meses aos pais. Estes dados confirmam a necessidade de revisitarmos as políticas da empresa e buscar, efetivamente, medidas que assegurem um tratamento e oportunidades iguais a homens e mulheres. 

A pandemia é um elemento a mais nesta reflexão sobre a licença parental, pois, para alguns, o trabalho remoto, infelizmente, não é uma realidade viável e, neste momento de restrições de escolas, ter a possibilidade de compartilhar o tempo de cuidado do filho, especialmente os recém-nascidos, entre os pais, é uma necessidade quase que primordial. Dito isso e com a experiência do teletrabalho durante este período de pandemia, nasce uma oportunidade de refletir como a licença parental poderá ser conduzida dentro das empresas e seus efeitos positivos, inclusive na produtividade dos empregados.

Com efeito, é muito importante destacar como a licença parental é um instrumento para reter talentos e aprimorar o clima organizacional, permitindo que a vida profissional e a vida familiar caminhem de uma forma mais harmoniosa. Não há dúvidas de que este impacto atinge positivamente  profissionais atuais e as crianças que serão os profissionais no futuro. 

A licença parental também está em linha com outros temas relevantes para a sociedade atual, que são a inclusão e a diversidade, vez que as novas composições familiares são uma realidade e as políticas dentro das empresas deve ter um olhar atento a isso, agindo de forma a criar uma agenda de efetiva inclusão e equidade. 

Tratamos aqui da licença parental, considerando esta como, de fato, o afastamento do empregado de suas atividades, mas pode comportar outras alternativas intermediárias, como: (i) as “daddy quotas”, que são pequenas licenças concedidas aos pais para que possam usufruir quando necessário, durante determinado período de tempo. Este racional nos parece muito razoável, pois seria uma forma de aumentar o período em que a criança ficaria assistida com a presença do pai/mãe, enquanto o outro parceiro retorna ao trabalho; (ii) preferência ao teletrabalho para o cônjuge durante algum período, licença adicional para o/a parceiro quando do retorno; (iii) ampliar, para além da previsão legal, as faltas justificadas para permitir o efetivo acompanhamento em pré-natal. Não se descarta, ainda, a eventual participação do Sindicato ou de uma comissão de empregados, que permita uma discussão construtiva do modelo adequado de licença parental para a realidade da empresa e de seus empregados. 

Por isso, entendemos que a existência de um programa de licença parental representa um grande avanço em termos de benefícios aos empregados, sendo imprescindível uma política desenhada de acordo com os valores e propósitos da empresa, visando  uma maior equidade de tratamento.

1 https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-08/presidente-do-tst-defende-licenca-parental - Acesso em 22 de Fevereiro de 2021.

2 C156 - Sobre a Igualdade de Oportunidades e de Tratamento para Homens e Mulheres Trabalhadores: Trabalhadores com Encargos de Família (ilo.org) Acesso em 23 de Fevereiro de 2021.

3 https://oglobo.globo.com/mundo/celina/finlandia-vai-equiparar-licenca-paternidade-licenca-maternidade-24230979 - Acesso em 22 de Fevereiro de 2021. 

4 https://www.thefools.com.br/blog/post/os-5-paises-com-melhores-politicas-compartilhadas-de-licenca-parental - Acesso em 22 de Fevereiro de 2021.

5 https://vocerh.abril.com.br/voce-rh/licenca-paternidade-mais-longa/ - Acesso em 22 de Fevereiro de 2021.