Incorporação por mandato


Incorporação por mandato


Por Alessandra Lima Ganz e Aline Augusto Franco*

A incorporação imobiliária, disciplinada pela Lei Federal nº 4.591/64, é a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas. Em suma, é negócio jurídico pelo qual a incorporadora obriga-se a realizar a construção coletiva, podendo, durante a construção, alienar frações do terreno vinculadas às suas futuras unidades autônomas.

O artigo 29 da mencionada lei prevê que o incorporador pode ser pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que embora não efetuando a construção diretamente, compromissa ou efetiva a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações à unidades autônomas. Ou seja, o incorporador, enquanto empreendedor é verdadeiro articulador de uma série de medidas no sentido de levar a cabo a construção até sua conclusão.

Dentre as situações mais comuns, temos o incorporador enquanto proprietário do terreno ou como o construtor, mediante autorização, consubstanciada em procuração, do proprietário do terreno. A segunda hipótese é conhecida como ‘incorporação por mandato’ e vem sendo recentemente mais utilizada, em que pese poder implicar, eventualmente, em assunção de maiores riscos pelo proprietário.

Especialmente no cenário de crise ou pós-crise como vivemos, essa alternativa da ‘incorporação por mandato’ vem sendo reiteradamente usada em virtude da ausência de desembolso imediato para aquisição do terreno e na desnecessidade de outorga de garantia pelo incorporador para tranquilizar o proprietário do imóvel.

Do mais, a depender do ajuste entre as partes, a remuneração pelas frações ideais correspondentes às futuras unidades autônomas podem ser pagas diretamente pela instituição financeira financiadora do empreendimento, reduzindo risco e carga tributária. O proprietário do terreno, vulgo ‘terrenista’, passa a ser visto como verdadeiro parceiro no negócio imobiliário.

Esse ajuste entre terrenista e (futuro) incorporador pode dar-se de diversas formas jurídicas, com maior ou menor grau de complexidade, mas sempre tendo em vista a manutenção do imóvel em nome do terrenista por todo o período de vigência da incorporação imobiliária. A escolha da estrutura leva em consideração o ajuste comercial, as responsabilidades assumidas e, com certeza, a melhor estratégia tributária.

Oportuno mencionar que o mandato outorgado para incorporação imobiliária é irrevogável, conforme as regras gerais consignadas no Código Civil, especialmente no parágrafo único do artigo 686, que dispõe: é irrevogável o mandato que contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados, aos quais se ache vinculado. E, em se tratando de mandato irrevogável, não se extingue nem mesmo com a morte/dissolução do mandante.

Nesse sentido, somente em caso de eventual desistência da incorporação (observado o prazo de carência previsto em lei), terrenista e incorporador podem, antes do término da incorporação, liberarem-se de seu vínculo, ainda que esse ‘distrato’ possa trazer certos dissabores e frustrações para as partes – com reduzidas implicações ou prejuízos (tais como devolução de valores, disposições a respeito de direitos sobre projetos, etc), passíveis de tratamento e ajuste contratual.

Vale salientar que mesmo na ‘incorporação por mandato’, o incorporador responde civil e criminalmente pela consecução do empreendimento, como forma de garantir aos adquirentes maior segurança jurídica e proteção patrimonial em face dos riscos inerentes a esse negócio.

Assim, na esfera criminal, respondem pessoalmente: o incorporador, o sócio, o diretor, o administrador, o construtor e/ou o corretor, respectivamente, pelo crime ou pelas contravenções penais relativas à economia popular, tendo em vista que a incorporação contempla a captação de recursos do público. Incluem-se como materialidades deste tipo penal o atraso injustificado na execução das obras e a má utilização dos recursos decorrentes da venda de unidades.

Enquanto que na esfera civil, o incorporador é o responsável, por excelência, pela conclusão e entrega do empreendimento perante os adquirentes das unidades autônomas, ainda que não tenha concorrido para o evento danoso. Caberá ao incorporador, neste caso, o direito de regresso contra o causador do dano. E, no caso de existir mais de um incorporador relacionado ao mesmo empreendimento, responderão estes, solidariamente, pelo respectivo empreendimento imobiliário.

Contudo, na ‘incorporação por mandato’ o terrenista também se obriga a outorgar os contratos de venda de fração ideal de terreno, de construção e da convenção do condomínio, nos prazos fixados, que conferirão direito real oponível a terceiros, com o consequente direito à obtenção compulsória do contrato correspondente.

Diante desse cenário, resta muito claro que os ajustes contratuais dessa cooperação entre terrenista e incorporador precisam de bases sólidas e equilibradas.

Ademais, não se pode deixar ao lado a necessária estruturação dos aspectos societários que projetos de incorporação normalmente demandam, com a constituição de sociedades com propósito específico, a previsão do embarque de investidores, financiadores e as formas contratuais adequadas para a utilização nestas finalidades.

A equipe especializada em Direito Imobiliário do Azevedo Sette encontra-se plenamente capacitada a assessorar os seus clientes na implementação de incorporações imobiliárias em amplo espectro, desde a aquisição do terreno e/ou estabelecimento de parceria até a estruturação dos documentos da incorporações, da modelagem contratual e societária.


*Texto redigido pela interna Aline Augusto Franco com revisão da advogada sênior Alessandra Lima Ganz, da unidade São Paulo Azevedo Sette Advogados