Concorrência na pandemia: Atualização


Concorrência na pandemia: Atualização


Aumentos abusivos de preço, disrupção de cadeias de valor, paradas de produção, choques de demanda, impactos nos canais de distribuição e falências. Esses são apenas alguns dos impactos sentidos pelas empresas no Brasil e no mundo durante a pandemia da COVID-19.

Destacamos a seguir pontos relevantes para a defesa da concorrência no Brasil, identificando oportunidades e preocupações para as empresas afetadas.

Cooperação entre concorrentes durante a pandemia

A cooperação entre empresas concorrentes levanta preocupações concorrenciais. No contexto da pandemia, a Divisão de Concorrência da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (“OCDE”) divulgou um guia no qual identifica hipóteses em que a cooperação entre concorrentes pode ocorrer de forma legal e pró-competitiva.

A OCDE apresenta duas formas em que essa cooperação seria possível: (i) cooperação como resposta, com o objetivo de restabelecer ou manter o funcionamento da cadeia produtiva; e, (ii) cooperação inovadora, que busca desenvolver um novo produto ou criar uma resposta inovadora para a crise. A OCDE recomenda que os acordos sejam avaliados pelas autoridades concorrenciais, para garantir que abusos não ocorram. A cooperação deve ser excepcional, apresentar um escopo muito bem delimitado e possuir um prazo determinado.

O CADE autorizou em 28 de maio de 2020 o primeiro projeto de cooperação entre concorrentes no âmbito da pandemia. O “Movimento Nós”, capitaneado por empresas dos setores de alimentos e bebidas, visa à recuperação da atividade dos pequenos varejistas do setor. As empresas submeteram o acordo voluntariamente ao CADE. Argumentaram que, com o cenário de crise prolongada, ações individuais não conseguiriam produzir resultados em escala que permitisse auxiliar os comerciantes e prestadores de serviço a retomarem suas atividades. O CADE considerou que as partes adotaram protocolos de prevenção de riscos antitruste, aprovando o acordo para vigorar até 31 de outubro. A prorrogação é possível, mas deve ser previamente comunicada.

Em 6 de julho de 2020, o CADE publicou Nota Informativa Temporária sobre Colaboração entre Empresas para Enfrentamento da Crise de COVID-19. A Nota fornece diretrizes sobre a colaboração entre empresas e menciona os procedimentos que devem ser seguidos para que situações anticompetitivas sejam evitadas.

Alterações legislativas

No âmbito legislativo, foi publicada a Lei 14.010, de 10 de junho de 2020, dispondo sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (“RJET”). Na esfera concorrencial, foi determinado que vender mercadorias ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo, assim como cessar as atividades da empresa sem justa causa, não caracterizarão infração da ordem econômica enquanto perdurar o estado de calamidade pública.

A lei também prevê a suspensão da necessidade de notificação obrigatória de contratos associativos, consórcios e joint ventures enquanto durar o estado de calamidade pública. Essa medida, entretanto, não afasta a possibilidade de análise posterior do ato de concentração ou de apuração de eventual infração à ordem econômica.

Demais medidas tomadas pelo CADE

• Monitoramento do mercado

Desde o início do cenário de pandemia, o CADE vem tomando medidas para avaliar a ocorrência de práticas anticompetitivas no mercado. Especialmente no setor de produtos médicos-farmacêuticos, foi iniciada investigação com o objetivo de verificar eventuais aumentos abruptos de preço e prática de margem de lucro que poderiam caracterizar ilícitos concorrenciais.

• Sessões virtuais

Para que os processos possam ter continuidade mesmo em meio à pandemia, o CADE passou a realizar sessões de julgamento por videoconferências. Para tal fim, foi publicada a Resolução nº 26, de 1º de abril de 2020, alterando o Regimento Interno do CADE e permitindo sessões de julgamento em meio virtual, contanto que observados os requisitos internos de segurança da informação, e assegurada a transparência, a publicidade e a ampla participação dos interessados.

• Prazos processuais

Conforme previsto na Medida Provisória nº 928, de 23 de março de 2020, os prazos processuais em processos administrativos não correrão em desfavor dos representados enquanto perdurar a pandemia. O CADE esclareceu que esta regra se aplica aos seguintes procedimentos: processos administrativos para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica; procedimentos administrativos para apuração de atos de concentração (APAC); processos administrativos para imposição de sanções processuais incidentais; e, oposição de embargos de declaração em face das decisões proferidas pelo Tribunal.

• Notas técnicas

O CADE tem se posicionado por meio de Notas Técnicas a respeito de projetos de lei e medidas que impactam diretamente o mercado e a concorrência. De forma geral, o CADE vem se posicionando de forma contrária à criação de legislação que vise ao congelamento de preços de produtos ou ao estabelecimento de tetos de preços.

• Guia de Dosimetria de Multas de Cartel

Apesar de não estar diretamente relacionado à pandemia, ressaltamos  a publicação da versão preliminar do Guia de Dosimetria de Multas de Cartel pelo CADE em 2 de julho de 2020. O objetivo de sua publicação é conceder maior transparência sobre a metodologia utilizada pelo CADE na definição de multas aplicadas a esse tipo de conduta anticompetitiva. O Guia está sob consulta pública até o dia 1º de agosto de 2020.

A área de Direito da Concorrência de Azevedo Sette Advogados – São Paulo está à disposição para fornecer mais informações sobre o tema pelos endereços eletrônicos lsalles@azevedosette.com.br, lbianchini@azevedosette.com.br e isantos@azevedosette.com.br.